Ao fazermos o estudo do livro O Céu e o Inferno (( https://mundomaior.com.br/produtos/ceu-inferno-allan-kardec-feal/#:~:text=O%20C%C3%A9u%20e%20o%20Inferno%20%C3%A9%20uma%20das%20cinco%20obras,a%20respeito%20de%20seu%20destino. )), nos chamou a atenção a Nota do Editor 149 ((
Com a teoria moral autônoma espírita, deixam de ter qualquer sentido os prejulgamentos, os privilégios, o orgulho, o egoísmo, o fanatismo, a incredulidade, próprios do mundo velho. A competição, que destaca os mais capazes, demonstra-se injusta, devendo ser substituída pela cooperação que integra solidariamente a todos. Os recursos da educação devem ser investidos mais amplamente entre as almas mais simples, para que participem ativamente da sociedade. Por esse caminho, a humanidade encontrará a felicidade: “O homem é solidário do homem. É em vão que procura o complemento do seu ser, quer dizer, a felicidade em si mesmo ou naquilo que o cerca isoladamente: ele não pode encontrá-lo senão no HOMEM ou na Humanidade. Não fazeis, pois, nada para ser pessoalmente felizes, enquanto a infelicidade de um membro da Humanidade, de uma parte de vós mesmos, possa vos afligir”
Allan Kardec. O Céu e o Inferno , NE 149 (p. 368). Edição do Kindle.)) .
Esta nota ele se refere a um artigo que está na Revista Espírita de março de 1867. Ele é uma das Dissertações Espiritas desta edição.
Ele é particularmente interessante por mostrar enfaticamente a importância da solidariedade na nossa humanidade. Além disso, há um boa reflexão quanto aos caminhos que levam a felicidade.
Compartilhamos integralmente com vocês:
A SOLIDARIEDADE
(Paris, 26 de novembro de 1866 – Médium: Sr. Sabb…)
Glória a Deus e paz aos homens de boa vontade! O estudo do Espiritismo não deve ser vão. Para certos homens levianos, é uma diversão; para os homens sérios, deve ser sério.
Antes de tudo refleti numa coisa. Não estais na Terra para aí viver à maneira dos animais, para vegetar à maneira de gramíneas ou de árvores. As gramíneas e árvores têm a vida orgânica, mas não têm a vida inteligente, como os animais não têm a vida moral. Tudo vive, tudo respira em a Natureza, mas só o homem sente e se sente.
Como são lamentáveis e insensatos aqueles que se desprezam a ponto de se compararem a um pé de erva ou a um elefante! Não confundamos os gêneros nem as espécies. Não são grandes filósofos e grandes naturalistas que, por exemplo, vêem no Espiritismo uma nova edição da metempsicose e, sobretudo, de uma metempsicose absurda. A metempsicose não é outra coisa
senão o sonho de um homem de imaginação. Um animal, um vegetal produz o seu congênere, nada mais, nada menos. Que isto seja dito para impedir velhas ideias falsas de serem novamente acreditadas, à sombra do Espiritismo.
Homem, sede homem; sabei de onde vindes e para onde ides. Sois o filho amado dAquele que tudo fez e vos deu um fim, um destino que deveis realizar sem o conhecer absolutamente. Éreis necessário aos seus desígnios, à sua glória, à sua própria felicidade? Questões inúteis, porque insolúveis. Vós sois; sede reconhecidos por isto; mas ser não é tudo; é preciso ser segundo as leis do Criador, que são as vossas próprias leis. Lançado na existência, sois ao mesmo tempo causa e efeito. Ao menos quanto ao presente, não podeis determinar o vosso papel, nem como causa, nem como efeito, mas podeis seguir as vossas leis. Ora, a principal é esta: O homem não é um ser isolado, é um ser coletivo. O homem é solidário do homem. É em vão que procura o complemento de seu ser, isto é, a felicidade em si mesmo ou no que o cerca isoladamente; não pode encontrá-lo senão no homem ou na Humanidade. Então nada fazeis para ser pessoalmente feliz, tanto quanto a infelicidade de um membro da Humanidade, de uma parte de vós mesmo, poderá vos afligir.
Mas, direis, é a moral que ensinais. Ora, a moral é um velho lugar-comum. Olhai em torno de vós: que há de mais ordinário, de mais comum que a sucessão periódica do dia e da noite, que a necessidade de vos alimentardes e de vos vestirdes? É para isto que tendem todos os vossos cuidados, todos os vossos esforços. E é necessário, pois assim o exige a parte material do vosso ser. Mas a vossa natureza não é dupla, e não sois mais espírito do que corpo? Como, pois, vos é mais difícil ouvir lembrar as leis morais do que as leis físicas, que aplicais a todo instante? Se fôsseis menos preocupados e menos distraídos essa repetição não seria tão necessária.
Não nos afastemos de nosso assunto. Bem compreendido, o Espiritismo é, para a vida da alma, o que o trabalho material é para a vida do corpo. Ocupai-vos dele com este objetivo e ficai certos de que quando tiverdes feito, para o vosso melhoramento moral, a metade do que fazeis para melhorar a vossa existência material, tereis feito a Humanidade dar um grande passo.
Um Espírito
Escala Espírita: que Espírito sou eu?
Kardec construiu e apresentou, na Revista Espírita de 1858 e no livro dos Espíritos, a Escala Espírita (clique aqui para Escala Espírita de 1858 ). Ele a elaborou para nós identificarmos melhor os Espíritos que se comunicavam pelos médiuns, facilitando, assim, o entendimento e teor das comunicações.
Porém, ao se deparar com o item 100 do Livro dos Espíritos com a Escala Espírita, todo mundo fica procurando seus defeitos e qualidades nela… E se pergunta: Qual classe eu estou? Serei um Espírito que tenho muito a evoluir ou serei eu um Espírito já apto para ensinar e arriscar novos horizontes?
Alguns pontos importantes podem ser esclarecidos para nós entendermos melhor em qual estágio nos encontramos. Vamos a eles…
Deus é o criador de todas as coisas.
Segundo as comunicações dos Espíritos, há 3 elementos gerais no Universo: Deus, a matéria e os Espíritos.
Deus, a matéria e os Espíritos. Essas três coisas são o princípio de tudo o que existe, a trindade universal.
Kardec, O Livro dos Espíritos, questão 27
Os Espíritos também nos ensinaram, a partir das diversas comunicações, o entendimento da criação contínua da matéria e dos Espíritos por Deus:
Assim se faz a criação universal. É, pois, correto dizer que as operações da natureza, sendo a expressão da vontade divina, Deus sempre criou, cria incessantemente e nunca deixará de criar.
Allan Kardec. A GÊNESE – Os milagres e as Predições Segundo o Espiritismo, capítulo 2 – Deus – item 18
Podemos deduzir, então que na Antiguidade, na época de Cristo, na idade média, Renascimento, enfim, SEMPRE existiram entre nós almas de todas as classes: desde as mais simples ignorantes até os Espíritos mais adiantados, superiores. Isso significa que sempre vamos ter no nosso convívio almas encarnadas que nos ensinam a sermos Espíritos melhores, assim como há outras inferiores a nós que podemos auxiliar para seu progresso. As almas que são do mesmo grau de adiantamento nos acompanham no nosso aprendizado, sempre em cooperacão.
São Vicente de Paula diz exatamente isso em sua comunicação publicada na RE de 1859:
Jamais vos esqueçais de que o Espírito, seja qual for o seu grau de adiantamento e a sua situação, como reencarnado ou na erraticidade, está sempre colocado entre um superior, que o guia e aperfeiçoa, e um inferior, perante o qual tem os mesmos deveres a cumprir.
Kardec, Allan. Revista Espírita 1859 (pp. 476)
E ele ainda acrescenta:
Sede, pois, caridosos, não somente dessa caridade que vos leva a tirar do bolso o óbolo que dais friamente àquele que ousa pedir, mas ide ao encontro das misérias ocultas. Sede indulgentes para com os defeitos de vossos semelhantes. Em lugar de desprezar a ignorância e o vício, instrui-os e moralizai-os. Sede mansos e benevolentes para com tudo que vos seja inferior. Sede-o mesmo perante os seres mais ínfimos da Criação, e tereis obedecido à Lei de Deus.
Kardec, Allan. Revista Espírita 1859 (p. 477)
Entendemos, a partir dos ensinamentos de São Vicente de Paula, que nós não devemos nos preocupar em que ponto da Escala Espírita nosso Espírito estamos, mas em como podemos contribuir para acelerar o nosso progresso e o progresso de todos os que se encontram na nossa jornada!
Perturbação Imediata Após Morte
Todos nascemos! Todos vamos morrer!
Desta verdade da vida, vem a preocupação do momento da morte. São sempre assuntos recorrentes.
Neste artigo, não pretendemos encerrar o assunto, muito pelo contrário! Estamos somente trazendo uma parte bem pequena desse vasto assunto. Afinal, todos vamos experimentar este acontecimento.
Os Espíritos explicaram que, no momento da morte, nem todos os Espíritos passam pelos mesmo processo. Cada ser é uma consciência diferente da outra. Assim, O Livro dos Espíritos traz as seguintes conclusões em seu capítulo III – Retorno da Vida Corpórea à Vida Espiritual:
163. Deixando o corpo, a alma tem imediata consciência de si mesma? – Consciência imediata não é o termo: ela fica perturbada por algum tempo.
164. Todos os Espíritos experimentam, no mesmo grau e pelo mesmo tempo, a perturbação que se segue à separação da alma e do corpo? – Não, pois isso depende da sua elevação. Aquele que já está depurado se reconhece quase imediatamente, porque se desprendeu da matéria durante a vida corpórea, enquanto o homem carnal, cuja consciência não é pura, conserva por muito mais tempo a impressão da matéria.
Comentário: Aqui fica evidente que cada pessoa experimenta um tipo de percepção da morte, segundo aquilo que vivenciou na matéria.
Agora, nesta pergunta 165, Allan Kardec consegue aprofundar mais na natureza da perturbação, assim como descrever melhor o que os Espíritos ensinaram em suas comunicações. Notem que não há nada com um tempo determinado. Esta parte da resposta, no nosso entender, é a mais esclarecedora.
165. O conhecimento do Espiritismo exerce alguma influência sobre a duração maior ou menor da perturbação? – Uma grande influência, pois o Espírito compreende antecipadamente a sua situação: mas a prática do bem e a pureza de consciência são o que exerce maior influência.
Kardec continua explicando, no mesmo item, como o Espirito experimenta esses primeiros momentos:
“No momento da morte, tudo, a princípio, é confuso; a alma necessita de algum tempo para se reconhecer; sente-se como atordoada, no mesmo estado de um homem que saísse de um sono profundo e procurasse compreender a situação. A lucidez das ideias e a memória do passado voltam, à medida que se extingue a influência da matéria e que se dissipa essa espécie de nevoeiro que lhe turva os pensamentos.
A duração da perturbação de após morte é muito variável: pode ser de algumas horas, como de muitos meses e mesmo de muitos anos. Aqueles em que é menos longa são os que se identificaram durante a vida com seu estado futuro, porque estão compreendem imediatamente a sua posição. “
Comentário: Parece que ele dá uma espécie de conselho na parte em que destacamos do texto.
“Essa perturbação apresenta circunstâncias particulares, segundo o caráter dos indivíduos e sobretudo de acordo com o gênero de morte. Nas mortes violentas, por suicídio, suplício, acidente, apoplexia, ferimentos, etc., o Espírito é surpreendido, espanta-se, não acredita que esteja morto e sustenta teimosamente que não morreu. Não obstante, vê o seu corpo, sabe que é dele, mas não compreende que esteja separado. Procura as pessoas de sua afeição, dirige-se a elas e não entende por que não o ouvem. Esta ilusão se mantém até o completo desprendimento do Espírito, e somente então ele reconhece o seu estado e compreende que não faz mais parte do mundo dos vivos.”
Comentário: Há vários relatos de Espíritos que comparecem em seu funeral, que não entendem o motivo de estarem deitados dentro do caixão. Ficam completamente perdidos!
“Esse fenômeno é facilmente explicável. Surpreendido pela morte imprevista, o Espírito fica aturdido com a brusca mudança que nele se opera. Para ele, a morte é ainda sinônimo de destruição, de aniquilamento; ora, como continua a pensar, como ainda vê e escuta, não se considera morto. E o que aumenta a sua ilusão é o fato de se ver num corpo semelhante ao que deixou na Terra, cuja natureza etérea ainda não teve tempo de verificar. Ele o julga sólido e compacto como o primeiro, e quando se chama a sua atenção para esse ponto, admira-se de não poder apalpá-lo. Assemelha-se este fenômeno ao dos sonâmbulos inexperientes, que não creem estar dormindo. Para eles, o sono é sinônimo de suspensão das faculdades; ora, como pensam livremente e podem ver, não acham que estejam dormindo. Alguns Espíritos apresentam esta particularidade, embora a morte não os tenha colhido inopinadamente; mas ela é sempre mais generalizada entre os que, apesar de doentes, não pensavam em morrer. Vê-se então o espetáculo singular de um Espírito que assiste os próprios funerais como os de um estranho, deles falando como de uma coisa que não lhe dissesse respeito, até o momento de compreender a verdade.”
Comentário: O Espírito confunde seu envoltório espiritual( perispírito) com o seu corpo carnal, de modo que não percebe que não tem mais corpo carnal!
A perturbação que se segue à morte nada tem de penosa para o homem de bem: é calma e em tudo semelhante à que acompanha um despertar tranquilo. Para aquele cuja consciência não está pura é cheia de ansiedades e angústias.
Comentário: Mais uma vez, os esclarecimentos dos Espíritos nos dão as dicas de como tornar o momento da morte tão mais brando!
Surpreendentemente, no último parágrafo deste capítulo, Kardec diz de forma clara sobre os desencarnes coletivos ocorridos em acidentes ou catástrofes!
“Nos casos de morte coletiva observou-se que todos os que perecem ao mesmo tempo, nem sempre se reveem imediatamente. Na perturbação que se segue à morte, cada um vai para o seu lado ou somente se preocupa com aqueles que lhe interessam.”
Kardec, O Livro dos Espíritos, item 165
Comentário: Se um ser humano morrer ao mesmo tempo no mesmo acidente não quer dizer muito no momento do desencarne! Cada Espírito persegue os seus interesses segundo sua evolução.
Não pretendemos encerrar o assunto! Afinal, pelo que você leu até aqui, nada é conclusivo, pois cada um tem suas particularidades! Ao longo da codificação de Kardec, há muitas descrições desse momento e mais explicações que os Espíritos trouxeram.
Mas de uma coisa nunca vamos escapar: do momento da morte!
E depois da morte?
A pergunta sempre frequente é: O que será que acontece no futuro do nosso Espírito? O que nos acontece depois da morte? Será que vamos para o Céu Iluminado? Ou será que o Inferno é nosso destino? Quem decide para onde seguimos? Será que encontramos os seres que nos são caros?
O ser humano sempre perseguiu a ideia do que ocorrerá no futuro do seu Espírito. E talvez seja a pergunta mais frequente no meio espírita.
O estudo aprofundado do livro O Céu e O Inferno, ou a Justiça Divina Segundo o Espiritismo, nos faz entender cada vez mais a Doutrina Espírita. Na primeira parte, seu capítulo VIII sob o título As Penas Futuras Segundo o Espiritismo praticamente encontramos a compilação de toda Doutrina tornando-o como se fosse seu coração, ou seja, a parte principal. Ali existe uma série de 25 itens onde cada um foi desenvolvido ao longo de todo a obra, menos, claro dA Genese, que foi publicada após. Os 25 itens elucidam o que acontece ao nosso Espírito após o desencarne. As explicações vieram através de inúmeros Espíritos desencarnados em milhares de comunicações, de vários lugares do mundo, por muitos mediuns distintos. Kardec, através da Revista Espírita, mostrou uma quantidade considerável das comunicações.
A particularidade desse livro é justamente trazer , diante desse material todo, as conclusões de todas as comunicações estudadas. Além disso, na segunda parte do livro, é apresentado muitas dessas mensagens. O conteúdo dessas, publicadas no livro O Céu e o Inferno, é assunto para outro momento.
Voltemos ao capítulo VIII da primeira parte do livro. Ele começa fazendo importantes considerações, que colocamos aqui na integra:
Estando a sorte das almas nas mãos de Deus, ninguém pode neste mundo, por sua própria autoridade, decretar o código penal divino. Qualquer teoria não é mais que uma hipótese que só tem o valor de uma opinião pessoal e, por isso mesmo, pode ser mais ou menos engenhosa, racional, bizarra ou ridícula. Somente a sanção dos fatos pode conferir-lhe autoridade, fazendo-a passar à condição de princípio.
Na ausência de fatos apropriados para definir sua concepção acerca da vida futura, os homens deram curso à sua imaginação e criaram essa diversidade de sistemas de que compartilharam, e compartilham ainda, as crenças. Se alguns homens de elite, em diversas épocas, entreviram um lado da verdade, a massa ignorante permaneceu sob o império dos preconceitos que geralmente lhe eram impostos. A doutrina das penas eternas está nesse número. Essa doutrina teve sua época; hoje ela é repelida pela razão. O que colocar em seu lugar? Um sistema substituído por outro sistema, ainda que mais racional, sempre terá apenas maior probabilidade, mas não a certeza. É por isso que o homem, chegado a este período intelectual que lhe permite refletir e comparar, não encontrando nada que satisfaça completamente sua razão e responda às suas aspirações, vacila indeciso. Uns, apavorados pela responsabilidade do futuro e querendo gozar o presente sem constrangimento, procuram enganar-se e proclamam o nada após a morte, crendo assim manter a consciência tranquila; outros estão na perplexidade da dúvida; o maior número crê em algo, mas não sabe exatamente no que crê. Um dos resultados do desenvolvimento das ideias e dos conhecimentos adquiridos é o método científico96. O homem quer crer, mas quer saber por que crê. Ele não se deixa mais levar por palavras. Sua razão vigorosa quer algo mais substancial que teorias. Em uma palavra, ele necessita dos fatos. Deus, então, julgando que a humanidade saiu da infância, e que o homem está hoje maduro para compreender verdades de uma ordem mais elevada, permite que a vida espiritual lhe seja revelada por fatos que põem um termo às suas incertezas, fazendo cair os andaimes das hipóteses97. É a realidade após a ilusão. A Doutrina Espírita, no que se refere às penas futuras, não é mais fundada sobre uma teoria preconcebida do que suas outras partes. Em tudo ela se apoia sobre observações, sendo isso o que lhe dá autoridade. Ninguém então imaginou que as almas, após a morte, devessem se encontrar nesta ou naquela situação. São os próprios seres que deixaram a Terra que vêm hoje – com a permissão de Deus e porque a humanidade entra numa nova fase – nos iniciar nos mistérios da vida futura, descrever sua posição feliz ou infeliz, suas impressões e sua transformação na morte do corpo. Os espíritos vêm hoje, em suma, completar nesse ponto o ensino do Cristo. Não se trata aqui da relação de apenas um espírito que poderia ver as coisas somente de seu ponto de vista, sob um único aspecto, ou ainda estar dominado pelos preconceitos terrestres, nem de uma revelação feita a um único indivíduo que poderia se deixar enganar pelas aparências, nem de uma visão extática que se presta às ilusões e é com frequência apenas o reflexo de uma imaginação exaltada98, mas de inúmeros intermediários disseminados sobre todos os pontos do globo, de tal sorte que a revelação não é privilégio de ninguém, que cada um pode ao mesmo tempo ver e observar, e que ninguém é obrigado a crer pela fé de outrem. As leis que daí decorrem são deduzidas apenas da concordância dessa imensidade de observações; esse é o caráter essencial e especial da Doutrina Espírita99. Jamais um princípio geral é retirado de um fato isolado ou da afirmação de um único espírito, ou do ensinamento dado a um único indivíduo, ou de uma opinião pessoal. Qual seria o homem que poderia crer- se suficientemente justo para medir a justiça de Deus?
Os numerosos exemplos citados nesta obra para estabelecer a sorte futura da alma poderiam ser multiplicados ao infinito, mas, como cada um pode observar outros análogos, seria suficiente de certa forma dar os tipos das diversas situações. Dessas observações, podem-se deduzir as condições de felicidade ou infelicidade na vida futura; elas provam que a penalidade não falta a nenhuma prevaricação e que, conquanto não seja eterno, o castigo não é menos terrível segundo as circunstâncias.
Allan Kardec, O Céu e o Inferno
Nota: Allan Kardec define os pressupostos da ciência espírita. Toda teoria, seja proposta por um homem ou um espírito, é uma opinião pessoal. As hipóteses vão do engenhoso ao ridículo. Por isso, o Espiritismo se fundamenta na observação dos fatos, em milhares de depoimentos, para extrair deles os princípios gerais, confirmando o ensinamento dos bons espíritos. É a universalidade do ensino dos espíritos. (Nota 94 de O Céu e o Inferno do editor Paulo Henrique de Figueiredo)
Observem como essa introdução explana o pensamento científico baseado totalmente nos fatos. Não há dogma, não há profetas, não há fantasia.
Depois dessa criteriosa introdução, Allan Kardec segue enumerando os princípios gerais que os muitos Espíritos deram. Eles aparecem de forma progressiva. Eles os definiu como a representação da lei da justiça divina.
Segundo estudamos, não há um sistema estático, um padrão geral onde o futuro seja um Céu Iluminado ou as Escuridão das trevas do Inferno. Mas se voce, leitor, fizer o estudo, vai conseguir chegar às suas próprias conclusões.
Nós o convidamos a leitura e reflexão! Vale muito a leitura.
Bicorporeidade
Será possível alguém estar em dois lugares ao mesmo tempo? Claro que sim! Esse fenômeno se chama BICORPORIEDADE. É o que trata este artigo da Revista Espírita de dezembro de 1858.
Trata-se da história de um jovem que se deita, sem sair de casa, vai até Londres onde se reune a seus amigos, toma café, brinca e depois volta para seu lar, sem nada se lembrar.
Resumidamente, assim aconteceu:
Um correspondente do interior da França enviou uma carta dizendo que, depois que, “por ordem dos Espíritos”, magnetizou seu filho, ele se tornou médium muito raro.
Um caso, em especial, chamou-lhe a atenção: o filho, após ler em um livro de Barão Du Potet sobre a aventura de um doutor da América, cujo Espírito foi visitar um amigo a grande distância, disse ao seu guia que gostaria de fazer o mesmo. Seu guia disse-lhe, então: Amanhã é domingo. Não és obrigado a te levantares cedo para trabalhar. Dormirás às oito horas e irás passear em Londres até as oito e meia. Sexta-feira próxima receberás uma carta de teus amigos, censurando-te por teres ficado tão pouco tempo com eles.
Disse o pai: Efetivamente, no dia seguinte, pela manhã, à hora indicada, ele caiu num sono profundo. Despertei-o às oito e meia. Ele não se lembrava de nada. De minha parte nada lhe disse, esperando os acontecimentos.
E como prometido, uma carta chegou pelos correios: “o carteiro veio entregar uma carta de Londres, na qual os amigos de meu filho censuravam-no por ter passado com eles apenas alguns minutos, no domingo anterior, das oito às oito e meia, com uma porção de detalhes que seria longo aqui relatar, entre os quais o fato singular de ter tomado o café da manhã com eles”
Tendo sido contado o fato acima, um dos assistentes disse que a História narra diversos casos semelhantes. Citou Santo Afonso de Liguori, que foi canonizado antes do tempo exigido, por se haver mostrado simultaneamente em dois lugares diferentes, o que foi considerado como um milagre.
Na primeira, de aspecto religioso, Afonso saiu do convento de Ciorani para Pagani e ao mesmo tempo foi visto atendendo confissões na igreja redentorista de Ciorani.
Na segunda ocasião de cunho religioso o Santo pregava missões populares em Amalfi, Italia. Foi em 1756. Durante a missão, foi visto simultaneamente pregar na catedral de Amalfi e atender confissões na casa em que os missionários estavam alojados.
Antonio Benedetto Maria Tannoia (II, c. 44), seu biógrafo, comenta: “Um anjo, querendo dar prosseguimento a seu zelo em acolher os pecadores, quis substituí-lo no púlpito”.
Na terceira ocasião, esta de cunho social, o santo estava em Nápoles e simultaneamente em Pagani, onde todos os sábados costumava ajudar uma ex-prostituta que conseguira converter. Isto aconteceu em 1759. A última ocasião reveste-se de cunho político-religioso. No dia 22 de setembro de 1774, Afonso encontrava-se em Arienzo, um lugarejo de sua diocese de Santa Ágata dei Goti, para onde se dirigia naqueles dias em que fazia muito frio. Ao mesmo tempo foi visto em Roma, ao lado do leito de morte do Papa Clemente XIV, assistindo-o. (Esse caso foi documentado pela Igreja Católica).
Observação: A Igreja diz que a “bi locação” é uma manifestação extraordinária do poder de Deus, consistindo na presença corporal de uma pessoa, ao mesmo tempo, em dois ou mais lugares. Fisicamente, a bi locação é impossível aos seres materiais, pela própria natureza das coisas.
Também existem alguns relatos de bicorporiedade de Santo Antônio de Pádua. O mais famoso dele foi na ocasião da acusação que seu pai sofreu de assassinato: Certa vez, pregando em Pádua, o santo sentiu forte intuição de que sua presença era necessária em Lisboa naquele exato momento. Sentou-se ao lado do púlpito e, como já havia feito uma vez, cobriu a cabeça com o capeio, o capuz dos franciscanos. Apareceu em seguida no Tribunal de Lisboa, onde fez a defesa contundente do pai. Para provar a inocência de seu genitor, rumou acompanhado das autoridades ao cemitério. Para assombro dos presentes, ressuscitou a vítima, que inocentou o acusado de qualquer responsabilidade por sua morte. Permitiu então, que o assassinado, retornasse ao seu descanso. Logo depois, muito além, recobrou a consciência e retomou sua pregação.
A primeira vez que isso aconteceu foi em Limoges, sul da França, no ano de 1226. Na Quinta-feira Santa, o frei pregava na Igreja de São Pedro. No mesmo instante, a alguns quilômetros dali, seus irmãos franciscanos já cantavam as matinas no convento. Por ter o cargo de Custódio cabia a ele a responsabilidade de ler uma lição do ofício para os seus irmãos.
No exato momento em que deveria estar presente no convento, o frei interrompeu seu sermão e se recostou no púlpito, cobrindo o rosto com o capuz. Para surpresa dos frades menores, a voz do frei português soou entre o coro dos franciscanos. Cantou a lição e cumpriu sua tarefa junto a seus irmãos, para em seguida desaparecer e despertar de seu aparente cochilo na Igreja de São Pedro.
Assim, para começar a esclarecer o fenomeno, Kardec fez a evocação do mencionado anteriormente Santo Afonso de Liguori. Foram feitas as seguintes perguntas:
1. ─ O fato pelo qual fostes canonizado é real? ─ Sim.
2. ─ Esse fenômeno é excepcional?─ Não. Ele pode apresentar-se em todos os indivíduos desmaterializados.
3. ─ Era motivo justo para vos canonizarem? ─ Sim, pois que por minha virtude eu me havia elevado para Deus. Sem isso eu não teria podido transportar-me simultaneamente para dois lugares diferentes.
4. ─ Todos os indivíduos com os quais ocorrem esses fenômenos merecem ser canonizados? ─ Não, pois nem todos são igualmente virtuosos.
Comentário: Liguori faleceu em 1787 – bastante recente, em termos de vida espírita. Na época de sua evocação, apresenta pensamentos ainda bastante imbuídos das ideias católicas. Acabamos de ver, e em OLM Kardec dá outros exemplos, que a bi corporeidade parece não depender tanto assim de uma virtuosidade tão elevada. É preciso ter certeza se era mesmo esse fenômeno, ou se foi apenas o caso de outra pessoa, vidente, ver o Espírito semidesligado do corpo adormecido.
5. ─ Poderíeis dar-nos uma explicação desse fenômeno? ─ Sim. Quando o homem, por sua virtude, se acha completamente desmaterializado; quando elevou sua alma para Deus, pode aparecer simultaneamente em dois lugares, do seguinte modo: Sentindo vir o sono, o Espírito encarnado pode pedir a Deus para se transportar a um lugar qualquer. Seu Espírito ou sua alma, como queirais chamar, então abandona o seu corpo, seguido de uma parte de seu perispírito e deixa a matéria imunda num estado vizinho ao da morte. Digo vizinho ao da morte porque fica no corpo um laço que liga o perispírito e a alma à matéria, e esse laço não pode ser definido. O corpo então aparece no lugar desejado. Creio que é tudo o que desejais saber.
Comentário: mais uma vez, uma grande quantidade de conceitos que têm, no fundo, as ideias católicas como influência determinantes.:” Pedir a Deus”,” Matéria imunda”, ” Vizinho à morte”. Ao mesmo tempo, caracteriza a veracidade da comunicação.
Observação: A resposta a questão 5 caracteriza uma certa ambiguidade na comunicação em relação a resposta da questão 2, pois se a bi corporiedade pode se manifestar em todos os indivíduos materializados, nem só os virtuosos o conseguem.
6. ─ Isto não nos dá a explicação da visibilidade e da tangibilidade do perispírito. – Achando-se desprendido da matéria, conforme o seu grau de elevação, o Espírito pode tornar a matéria tangível.
7. ─ Entretanto, certas aparições tangíveis de mãos e de outras partes do corpo devem-se evidentemente a Espíritos inferiores. – São Espíritos superiores que se servem dos inferiores a fim de provar o fato.
Observação: Se for exato que os Espíritos superiores se servem de inferiores a fim de provar o fato, explicaria o porquê de os Espíritos inferiores não poderem se materializar sob formas monstruosas, para assustar o povo. Explicaria o “Deus não permitiria”! Mais explicações clique aqui neste artigo
8. O sono do corpo é indispensável para que o Espírito apareça noutros lugares? – A alma pode dividir-se quando se sente transportada a um lugar diferente daquele onde se acha o seu corpo.
9. Que aconteceria a um homem mergulhado em sono profundo e cujo Espírito aparecesse alhures, se fosse despertado subitamente? – Isto não aconteceria, porque se alguém tivesse o intuito de despertá-lo, o Espírito preveria a intenção e voltaria ao corpo, tendo em vista que o Espírito lê o pensamento.
Divisão é um termo inexato. Melhor dizer que a alma, isto é, o períspirito, pode se estender para outros lugares, quando se tem essa capacidade.
O perispírito, estando estendido, não abandona jamais o corpo, senão por sua morte. É possível entender que, por isso, o Espírito, estando distante, perceba o que acontece ao redor do corpo.
Depois que essa comunicação nos foi dada, vários fatos do mesmo gênero, cuja fonte é autentica, nos foram contados, e entre eles há muito recentes, que ocorreram por assim dizer no nosso meio, e que se apresentaram com as circunstancias mais singulares. As explicações , às quais deram lugar, alargaram singularmente o campo das observações psicológicas.
Na RE de agosto de 1859, lemos o seguinte:
Comunicações – O Sr. Allan Kardec anuncia que viu o Sr. W… filho, de Boulogne-Sur-Mer, que foi questão na revista de dezembro de 1858, a propósito de um artigo sobre o fenômeno de bicorporiedade, e que lhe confirmou o fato de sua presença simultânea em Boulogne e em Londres.
O Espiritismo, a seu turno, vem dar a sua teoria. Ele se apoia na psicologia experimental; ele estuda a alma, não só durante a vida, mas após a morte; ele a observa em estado de isolamento; ele a vê agir em liberdade, ao passo que a filosofia ordinária só a vê em união com o corpo, submetida aos entraves da matéria, razão pela qual muitas vezes confunde causa e efeito.
AK, em RE maio de 1864
Ensinamentos de Sacerdote Egípcio
Nesse artigo, que apresenta a evocação do Espírito de Mehemet Ali (Maomé Ali), Kardec explora um questionamento a respeito da encarnação desse Espírito como um sacerdote egípcio, na época dos faraós.
Na edição de abril de 1858, Kardec evocou esse Espírito. Na ocasião, ele revelou que foi um sacerdote na época do antigo Egito. Mais detalhes clique aqui
Importante lembrar que na primeira comunicação, em abril, esse Espírito demonstrou não ser elevado. Não era maldoso, mas ainda estava na “roda das imperfeições”. Por isso, em sua fala, apresenta alguma impaciência e falta de benevolência.
Vamos, aqui, destacar algumas partes da longa conversa – evocação que entendemos como principais:
1. ─ Em nome de Deus Todo-Poderoso, peço ao Espírito de Mehemet-Ali que venha comunicar-se conosco. ─ Sim; sei a razão.
2. ─ Prometestes vir até nós, a fim de instruir-nos. Teríeis a bondade de ouvir-nos e de nos responder? ─ Não prometo, pois não assumi esse compromisso.
Curioso como as características do Espírito evocado aparecem com clareza conforme a comunicação se desenvolve. Aqui mostra claramente ser um Espirito não superior.(clique aqui para mais características)
Os Espíritos superiores são sempre bons e benevolentes; em seu palavreado jamais encontramos acrimônia, arrogância, aspereza, orgulho, fanfarronice ou a estólida presunção. Falam com simplicidade, aconselham e se retiram quando não são ouvidos.
Kardec, Allan. Revista espírita: outubro: 1858
3. ─ Substituamos o prometestes por fizeste-nos esperar. ─ Quereis dizer: para satisfazer à vossa curiosidade. Não importa! Prestar-me-ei um pouco.
Comentário: Kardec segue realizando as perguntas que julgava necessárias para avaliar o estado de conhecimentos e de intenções daquele Espírito, confrontando a ciência com suas respostas. Muito provavelmente testando o Espirito
4. ─ Considerando-se que vivestes ao tempo dos faraós, poderíeis dizer-nos com que fim foram construídas as pirâmides? ─ São sepulcros; sepulcros e templos. Ali se davam grandes manifestações.
5. ─ Tinham elas também um objetivo científico? ─ Não. O interesse religioso absorvia tudo.
12. ─ Sob o duplo ponto de vista de Deus e da alma, tinham os sacerdotes ideias mais sãs que o povo? ─ Sim. Eles tinham a luz em suas mãos e conquanto a escondessem dos outros, ainda a viam.
Comentário: Aqui fica claro como religiões são usadas para controlar o povo, subjulgando-o, completamente sem autonomia do indivíduo. Percebe-se claramente que os sacerdotes sabiam e ensinavam os iniciados, mas não instruíam a população. Até hoje é assim.
14. ─ Qual a origem do culto prestado aos animais? ─ Eles queriam desviar o homem de Deus e rebaixá-lo sob si próprio, dando-lhe como deuses seres inferiores.
15. ─ Até certo ponto compreende-se o culto dos animais úteis; mas não se compreende o de animais imundos e prejudiciais, como as serpentes, os crocodilos etc. ─ O homem adora aquilo que teme. Era um jugo para o povo. Os sacerdotes não podiam crer em deuses feitos por suas mãos!
Comentário: Os sacerdotes sabiam os ensinamentos e os guardavam para um círculo pequeno de iniciados. Eles não instruíam o povo para poder subjugá-los. Isso mostra como as religiões não são autônomas.
18. ─ Como conciliar o respeito dos egípcios pelos mortos com o seu desprezo e o horror que tinham por aqueles que os enterravam e mumificavam? ─ O cadáver era um instrumento de manifestações. Segundo pensavam, o Espírito voltava ao corpo que havia animado. Como um dos instrumentos do culto, o cadáver era sagrado e o desprezo perseguia aquele que ousava violar a santidade da morte.
Comentário: Interessante: o indivíduo, ensinado assim, morria acreditando nisso. Portanto, conquanto encontrava seu corpo conservado, continuava ali, se manifestando. Poderia ser, dessa forma, um entrave ao seu progresso, o que leva a concluir que seria melhor morrer como parte do povo. Da mesma forma que, ainda hoje, existem aqueles que ficam junto ao caixão não querendo deixá-lo, por acreditarem nesse mesmo dogma modernizado ( não podemos esquecer que o Cristianismo trouxe muitos destes dogmas egípcios aqui citados para suas crenças).
19. ─ A conservação do corpo permitia maior quantidade de manifestações? ─ Mais longas, isto é, o Espírito voltava por mais tempo, desde que o instrumento fosse dócil.
23. ─ O ensino dado nos mistérios tinha por fim único a revelação das coisas extra-humanas ou também eram ensinados os preceitos da moral e do amor ao próximo? ─ Tudo isto estava muito corrompido. O propósito dos sacerdotes era dominar e não instruir.
Comentário:Até hoje embalsamam o corpo! É um apego muito grande à matéria!
Menino de 12 anos assassina outras 5 crianças
Este é um dos causos da Revista Espírita de 1858, onde Kardec estuda o caso de um menino de 12 anos que assassina outras 5 crianças. Resumidamente: um menino de 12 anos colocou cinco crianças dentro de um baú, trancou o baú e os deixou lá até a morte. Tendo sido visto por outra menina, o menino de 12 anos foi delatado e então confessou tudo, com o maior sangue-frio e sem manifestar arrependimento.
Cabe aqui, também, uma reflexão a respeito de um crime como esses. Será que, como muitos dizem, essas cinco crianças foram mortas para cumprirem o “resgate de débitos do passado”? Se assim fosse, qual seria o grau de responsabilidade do outro? Tratamos desse assunto nesse outro artigo, clique aqui
Outra pergunta: seria o Espírito do menino assassino necessariamente mau? Em O Livro dos Espiritos, Kardec esclarece:
“Com efeito, ponderai que nos vossos lares possivelmente nascem crianças cujos Espíritos vêm de mundos onde contraíram hábitos diferentes dos vossos, e dizei-me como poderiam estar no vosso meio esses seres, trazendo paixões diversas das que nutris, inclinações, gostos, inteiramente opostos aos vossos; como poderiam enfileirar-se entre vós, senão como Deus o determinou, isto é, passando pelo tamis da infância?”
OLE, questão 385
Seguindo no artigo, Kardec interroga o Espírito da irmã de um médium, “que desencarnou há doze anos e sempre mostrou superioridade como Espírito”. Vamos apresentar os pontos principais dessas perguntas e suas respostas:
2. ─ Que motivos teriam impelido um menino daquela idade a cometer uma ação tão atroz e com tamanho sangue-frio? ─ A maldade não tem idade. Ela é natural numa criança e raciocinada no homem adulto.
Observação: “a criança não é boa ou má antes de ter o discernimento de um ou do outro. É o que se chama estado de inocência, que de algum modo é o sono da consciência.” Paul Janet, Pequenos Elementos da Moral. Já no adulto, ou homem que faz as distinções de sua consciência moral, que emprega a razão, ele escolhe fazer ou não uma ação, do que resulta uma boa ou má ação. Ainda assim, se age no “mal”, é apenas porque não tem a consciência do bem, ainda não progrediu o suficiente para entender.
3. ─ Sua existência numa criança, sem raciocínio, não denotará a encarnação de um Espírito muito inferior? ─ Ela vem diretamente da perversidade do coração: é seu próprio Espírito que o domina e o impele à perversidade.
5. ─ Em sua anterior existência, pertenceria ele à Terra ou a um mundo ainda inferior? ─ Não sei bem, mas deveria pertencer a um mundo bem mais atrasado que a Terra. Ele ousou (?) vir para a Terra. Será duplamente punido.
Comentário: Quando o Espírito evocado explica sobre a dupla punição, entendemos que ele quis dizer que esse Espírito adquiriu alguma consciência e escolheu vir para a Terra. Aqui, nascendo, preferiu vivenciar suas paixões e imperfeições, ao invés de tentar superá-las. Muito provavelmente ainda não entendeu as leis divinas, como a lei do progresso.
6. ─ Nessa idade teria o menino suficiente consciência do crime que cometeu? Caber-lhe-á responsabilidade como Espírito? ─ Ele tinha a idade da consciência. Isto basta.
7. ─ De vez que esse Espírito ousouvir à Terra, para ele muito elevada, pode ser constrangido a regressar a um mundo em relação com a sua natureza? ─ Sua punição é justamente retrogradar; é o próprio inferno. Eis a punição de Lúcifer, do homem espiritual que se rebaixou ao nível da matéria; é o véu que doravante lhe oculta os dons de Deus e sua divina proteção. Esforçai-vos, pois, na reconquista desses bens perdidos e tereis reconquistado o paraíso que o Cristo veio abrir para vós. É a presunção, o orgulho do homem que queria conquistar aquilo que só Deus podia ter (?).
Neste ponto, com a resposta 7, chegamos em vários entendimentos:
Ousar significa escolher. O principio da autonomia está sempre presente em Kardec.
O Espírito não retrograda. Aqui, é uma retrogradação material, de acordo o estado de desenvolvimento do Espírito. É como o estudante que é obrigado a voltar a repetir o ano, pois, de fato, não aprendeu;
Entendemos que enquanto o Espírito vivencia os hábitos negativos, os vícios, ele está afastado do entendimento do bem;
Pode parecer o quadro da queda pelo pecado, mas podemos entender do ponto de vista do afundamento nos hábitos que levam às imperfeições.
É o quadro do pecado original explicado pelo Espiritismo: o Espírito não é criado pleno, puro e sábio, mas ignorante e simples e, quando vive na matéria, vai adquirindo experiências. Quando ele erra, não comete um pecado, mas apenas erra. O erro pode ser totalmente inconsciente, de onde nasce o aprendizado, ou pode ser, de certa forma, consciente, isto é, por escolha que é quando o Espírito desenvolveu um hábito que originou uma imperfeição. Daí temos o seguinte: se o Espírito não entende que a imperfeição lhe causa atraso e sofrimento, ele apenas continua seguindo nas encarnações, até que adquira conhecimento para compreender o mal que fez, e arrepende-se. Então, passa a expiar o fruto de suas imperfeições, pela escolha livre de suas provas, através das encarnações, com o fim de lidar com esse hábito, com vistas a se livrar dele.
Todos nós passamos por isso, e todo nós alcançaremos a perfeição relativa.
As perguntas seguem ao Espirito evocado:
8. ─ Em que é a Terra superior ao mundo ao qual pertencia o Espírito de quem acabamos de falar? ─ Ali há uma fraca ideia de justiça. É um começo de progresso.
9. ─ Depreende-se disto que em mundos inferiores à Terra não há nenhuma ideia de justiça? ─ Não. Os homens ali vivem apenas para si e não têm por móvel senão a satisfação de suas paixões e de seus instintos.
10. ─ Qual será a posição desse Espírito numa nova existência? ─ Se o arrependimento vier a apagar, senão totalmente, pelo menos em parte, a enormidade de suas faltas, então ficará na Terra; se, ao contrário, persistir no que chamais de impenitência final, irá para um lugar onde o homem se encontra no nível dos animais.
Observação: Kardec desenvolveu esse entendimento bem depois, na obra O Céu e o Inferno: “O arrependimento é inútil quando é apenas consequência do sofrimento. O arrependimento proveitoso é aquele que tem por base o desgosto de haver ofendido a Deus, e o ardente desejo de reparação. Não cheguei a esse ponto ainda, infelizmente. Recomendai-me às preces de todos aqueles que se dedicam aos sofredores, porque delas tenho necessidade”. O Céu e o Inferno, Allan Kardec
“O arrependimento sincero é um ato da livre vontade do Espírito, predispondo-o a libertar-se da condição de infelicidade por seu esforço. Assim, o arrependimento da alma não é o medo de continuar sofrendo, que o constrange, submetendo-o a uma vontade externa (heteronomia). Em verdade, ele representa a conscientização das leis divinas, que o faz compreender a capacidade própria de conquistar a felicidade pelo aprimoramento (autonomia). Essa condição o faz reconhecer a força de sua vontade e desperta sua autoestima, reconduzindo-o ao caminho do bem” Ou seja: se ele se arrepender, poderá reencarnar aqui, que é um planeta de provas e expiações. Se não, terá que reencarnar num planeta que lhe dê condições de aprendizado pelo próprio exercício reencarnatório.
nota de Paulo Henrique de Figueiredo em O Céu e o Inferno
11. ─ Então pode ele encontrar na Terra os meios de expiar sua falta, sem ser obrigado a regressar a um mundo inferior? ─ Aos olhos de Deus, o arrependimento é sagrado, porque é o homem que a si mesmo se julga, o que é raro no vosso planeta.
Reencarnação
Neste artigo do mês de Novembro de 1858, o segundo artigo fala da Pluralidade das Existências ou Reencarnação. Kardec vai fazer uma abordagem bem informativa sobre a reencarnação. É um artigo de muito interesse, pois demonstra o cientista, desmistificando o codificador:
“Não é novo, dizem alguns, o dogma da reencarnação; ressuscitaram-no da doutrina de Pitágoras. Nunca dissemos ser de invenção moderna a Doutrina Espírita. Constituindo uma lei da Natureza, o Espiritismo há de ter existido desde a origem dos tempos e sempre nos esforçamos por demonstrar que dele se descobrem sinais na antiguidade mais remota”
RE, novembro de 1858
Observação: Ele diz que não era novo pois estava na Bíblia e foi removido pelo Segundo Concílio de Constantinopla.
O Espiritismo está em tudo e toca em todas as áreas da ciência. Ele, em si, em sua profundidade, é a ciência sobre tudo. Esse esforço de Kardec era muito importante, e deve ser o mesmo de nossa parte, pois desmistifica o Espiritismo.
Os antigos, inclusive Pitágoras (séc. VI ac), acreditavam na metempsicose, ao passo que o Espiritismo demonstra a impossibilidade dessa teoria.
Metempsicose: É uma crença fundamentalmente oriental, principalmente hinduísta, ligada ao dogma da queda pelo pecado, que não encontra base na razão desenvolvida pelo Espiritismo.
15. Da semelhança de formas exteriores que existe entre o corpo do homem e o de um macaco, alguns fisiologistas concluíram que o primeiro é apenas uma transformação do segundo. Nisso não há nada de impossível e, se for assim, não há razão para que o homem sinta sua dignidade afetada. Os corpos dos símios podem, muito bem, ter servido de vestimenta aos primitivos Espíritos humanos, necessariamente pouco avançados, que vieram encarnar na Terra, porque eram as mais apropriadas às suas necessidades e as mais adequadas ao exercício de suas faculdades que os corpos de qualquer outro animal. Em vez de uma veste especial que tenha sido feita para o Espírito, ele teria encontrado uma pronta. Vestiu-se então com a pele do macaco, sem deixar de ser um Espírito humano, como o homem se reveste por vezes da pele de certos animais sem deixar de ser homem. Fique bem entendido que aqui só se trata de uma hipótese que de nenhuma maneira se enuncia como princípio, mas que é apenas apresentada para mostrar que a origem do corpo não prejudica o Espírito, que é o ser principal, e que a semelhança do corpo do homem com o do macaco não implica na paridade entre seu Espírito e o dele.
16. Admitindo essa hipótese, pode-se dizer que, sob a influência e pelo efeito da atividade intelectual de seu novo habitante, o invólucro se modificou, embelezando-se nos detalhes, conservando no todo a forma geral do conjunto. Os corpos melhorados, ao procriarem, reproduziram-se nas mesmas condições, como acontece com as árvores enxertadas, e deram nascimento a uma nova espécie que, aos poucos, se distanciou do tipo primitivo, à medida que o Espírito progrediu. O Espírito simiesco, que não foi aniquilado, continuou procriando para seu uso corpos de macacos, do mesmo modo que o fruto da árvore silvestre reproduz árvores dessa espécie e o Espírito humano procriou corpos de homens variantes do primeiro molde em que se estabeleceu. O tronco se bifurcou; produziu um ramo, e este se tornou um tronco. Como não existem transições bruscas na natureza, é provável que os primeiros homens que apareceram na Terra se diferenciavam pouco do macaco, na forma exterior e, sem dúvida, pouco também na inteligência. Há ainda, em nossos dias, selvagens que, pelo comprimento dos braços e dos pés, e a conformação da cabeça, tem tanta semelhança com os macacos que lhe faltam somente serem peludos para que a semelhança seja completa.
Allan Kardec. A GÊNESE – Os milagres e as Predições Segundo o Espiritismo
Isso é bem diferente, porém, de supor que um Espírito humano, em razão de um castigo, possa ser condenado a encarnar num macaco, o que, para ele, seria uma retrogradação.
Alguns contraditores dizem: “vocês já partilhavam dessa ideia, por isso os Espíritos apenas comunicaram conceitos que já aceitavam”. Ledo engano, como veremos a seguir:
“Quando a doutrina da reencarnação nos foi ensinada pelos Espíritos, estava tão distante do nosso pensamento que, sobre os antecedentes da alma, havíamos construído um sistema completamente diferente, partilhado, aliás, por muitas pessoas. Sob esse aspecto, portanto, a Doutrina dos Espíritos nos surpreendeu profundamente; diremos mais: contrariou-nos, porquanto derrubou as nossas próprias ideias. Como se pode ver, estava longe de refleti-las. Mas isso não é tudo: nós não cedemos ao primeiro choque; combatemos, defendemos nossa opinião, levantamos objeções e só nos rendemos à evidência quando percebemos a insuficiência de nosso sistema para resolver todas as dificuldades levantadas por essa questão.”
“Aos olhos de algumas pessoas o vocábulo evidência parecerá, sem dúvida, singular em semelhante matéria; não será, entretanto, impróprio aos que estão habituados a perscrutar os fenômenos espíritas. Para o observador atento há fatos que, embora não sejam de natureza absolutamente material, nem por isso deixam de constituir verdadeira evidência, pelo menos do ponto de vista moral.”
Hoje, temos não apenas a evidência moral, mas as evidências factuais da reencarnação, que, contudo, ainda não pôde ser (e nunca será) comprovada em laboratório.
“Temos, ainda, uma outra refutação a opor: é que não somente a nós ela foi ensinada; foi, também, ensinada em muitos outros lugares, na França e no estrangeiro: na Alemanha, na Holanda, na Rússia, etc., e isso antes mesmo da publicação de O Livro dos Espíritos.
Acrescentamos, ainda, que, desde que nos entregamos ao estudo do Espiritismo, obtivemos comunicações através de mais de cinquenta médiuns escreventes, falantes, videntes, etc., mais ou menos esclarecidos, de inteligência normal mais ou menos limitada, alguns até mesmo completamente analfabetos e, em consequência, absolutamente estranhos às matérias filosóficas; não obstante, em nenhum caso os Espíritos se desmentiram sobre essa questão.”
Observação: A maioria das comunicações, pelo que sabemos, era de médiuns psicógrafos mecânicos, muitas vezes colocados em sono sonambúlico (chamado de crise, na época). Mas Kardec nunca deixou de buscar o valor nas outras formas de comunicação e nas manifestações em geral, sempre buscando destacar aquelas que pudessem despertar interesse e demonstrar a realidade da intervenção espiritual. Para seus olhos de pesquisador, até mesmo uma pintura mediúnica, como veremos logo mais, poderia representar fenômeno de interesse.
Não apenas essa doutrina é suportada pelas evidências, mas principalmente pela razão. Sem ela não existeautonomia, pois não seria dado, ao Espírito, a oportunidade de avançar, através do aprendizado nos acertos e nos erros. É o que acontece com a Doutrina ensinada pela Igreja Católica e por outras religiões, a ponto de nos espantarmos, hoje, que ainda existam as pessoas que pensem assim.
A Doutrina da Reencarnação, conforme explicada pelo Espiritismo, é a única doutrina que encaixa todas as peças do quebra-cabeças, explicando as diferenças entre os seres e a bondade divina.
“Temos raciocinado, abstraindo-nos, como dissemos, de qualquer ensinamento espírita que, para certas criaturas, carece de autoridade. Não é somente porque veio dos Espíritos que nós e tantos outros nos fizemos adeptos da pluralidade das existências. É porque essa parte da doutrina nos pareceu a mais lógica e porque só ela resolve questões até então insolúveis.”
Vejamos:
“Se não há reencarnação, só há, evidentemente, uma existência corporal. Se a nossa atual existência corpórea é a única, a alma de cada homem foi criada por ocasião do seu nascimento, a menos que se admita a anterioridade da alma, caso em que caberia perguntar o que era ela antes do nascimento e se o estado em que se achava não constituía uma existência sob forma qualquer. Não há meio termo: ou a alma existia, ou não existia antes do corpo. Se existia, qual a sua situação? Tinha, ou não, consciência de si mesma? Se não tinha, é quase como se não existisse. Caso tivesse individualidade, era progressiva, ou estacionária? Num e noutro caso, a que grau chegara ao tomar o corpo? Admitindo, de acordo com a crença vulgar, que a alma nasce com o corpo, ou, o que vem a ser o mesmo, que, antes de encarnar, só dispõe de faculdades negativas, perguntamos:”
Kardec, RE novembro 1858
1. Por que mostra a alma aptidões tão diversas e independentes das idéias que a educação lhe fez adquirir?
2. Donde vem a aptidão extranormal que muitas crianças revelam em tenra idade, para esta ou aquela arte, para esta ou aquela ciência, enquanto outras se conservam inferiores ou medíocres durante a vida toda?
3. Donde, em uns, as ideias inatas ou intuitivas, que noutros não existem?
4. Donde, em certas crianças, o instinto precoce que revelam para os vícios ou para as virtudes, os sentimentos inatos de dignidade ou de baixeza, contrastando com o meio em que nasceram?
5. Por que, abstraindo-se da educação, uns homens são mais adiantados do que outros?
6. Por que há selvagens e homens civilizados? Se tomardes de um menino hotentote recém-nascido e o educardes nos nossos melhores liceus, fareis dele algum dia um Laplace ou um Newton?
Comentário: Essa questão do selvagem africano vai em encontro com as diversas críticas, bastante severas, a um “racismo”, em Kardec. Como, mais abaixo, Kardec repete que “Relativamente à sexta questão, dir-se-á, sem dúvida, que o hotentote é de uma raça inferior”, acreditamos que devemos tirar um tempinho para fazer a alusão ao contexto científico de Kardec, que era, por definição, racista, isto é, classificava o ser humano por raças. Veja nosso artigo clique aqui
“Qual a filosofia ou a teosofia capaz de resolver estes problemas? É fora de dúvida que, ou as almas são iguais ao nascerem, ou são desiguais. Se iguais, por que, entre elas, tão grande diversidade de aptidão? Dir-se-á que isso depende do organismo. Mas, então, achamo-nos em presença da mais monstruosa e imoral das doutrinas. O homem seria simples máquina, joguete da matéria; deixaria de ter a responsabilidade de seus atos, pois que poderia atribuir tudo às suas imperfeições físicas. Se as almas são desiguais, é que Deus as criou assim. Nesse caso, porém, por que a inata superioridade concedida a algumas? Corresponderá essa parcialidade à justiça de Deus e ao amor que ele consagra igualmente a todas as suas criaturas?”
Kardec, RE 1858
Até aqui nós analisamos a alma pelo seu passado e seu presente. E qual seria o seu futuro segundo Kardec?
1. ─ Se é unicamente a nossa existência presente que deve decidir o nosso porvir, qual será, na vida futura, a posição respectiva do selvagem e do homem civilizado? Estarão no mesmo nível ou distanciados na soma de felicidades eternas?
2. ─ O homem que durante toda sua vida trabalhou para se melhorar estará no mesmo nível daquele que permaneceu inferior, não por falta sua, mas porque não teve nem tempo nem possibilidades de melhorar-se?
3. ─ O homem que pratica o mal porque não teve possibilidade de esclarecer-se está sujeito a circunstâncias que não dependeram dele?
Observação item 2: Percebemos aqui o conhecimento contextual e filosófico dos Espiritualistas Racionais estava presente nesses questionamentos.
4. ─ Trabalha-se para esclarecer os homens, moralizá-los, civilizá-los; mas para cada um que se esclarece, há milhões que morrem diariamente, antes que a luz chegue até eles. Qual é o destino desses? São eles tratados como réprobos? Se não o são, o que fizeram para serem mantidos na mesma classe dos outros?
5. ─ Qual a sorte das crianças que morrem em tenra idade, antes de poderem fazer o bem ou o mal? Se se acham entre os eleitos, por que este favor, quando nada fizeram por merecê-lo? Por que privilégio foram liberadas das tribulações da vida?
Kardec conclui o artigo:
“Existe uma doutrina que pode resolver estas questões? Admiti as existências sucessivas e tudo estará explicado conforme à justiça de Deus. Aquilo que não se pode fazer numa existência, far-se-á em outra. Assim, ninguém escapará à lei do progresso e todos serão recompensados segundo o mérito real e ninguém será excluído da felicidade suprema a que pode aspirar, sejam quais forem os obstáculos encontrados em sua rota.”
“Essas questões facilmente se multiplicariam ao infinito, porque inúmeros são os problemas psicológicos e morais que só na pluralidade das existências encontram solução. Limitamo-nos a formular as de ordem mais geral.”
Idem
Comentários: Há urgência em se realizar um progresso qualquer? Muitos palestrantes tem utilizado um tom alarmista, dizendo que temos que nos modificar “pra ontem”, fazer a reforma íntima, porque “o planeta” vai entrar em uma nova fase, a de regeneração. Se sofremos por uma imperfeição, a urgência está em nosso próprio tempo; se estamos apenas no processo do aprendizado, esse somente se dará no tempo de cada um, segundo sua vontade.
Nossas sugestões de documentário e livro sobre Reencarnação – Pluralidade das Existências:
O Espírito de um soldado morto em guerra: o Tamborista de Beresina
Talvez esta seja uma das comunicações relatadas mais interessantes do ano de 1858, por se tratar do Espírito de um soldado morto em guerra, um Espírito com aparência de tranquilidade e até de bondade.
Aconteceu assim: “Tendo-se reunido em nossa casa algumas pessoas com propósito de constatar certas manifestações, em diversas sessões produziram-se os fatos que se seguem: manifestou um Espírito por golpes, não batidas pelo pé de mesa, mas na própria contextura da mesa.” Depois Kardec segue dizendo que além das respostas de várias perguntas pelo sim e pelo não, os golpes tocavam marchas, imitavam fuzilaria, algo completamente inusitado.
Enquanto ouviam, observaram que o Espirito tinha certa predileção pelo rufo do tambor.
Estavam presentes, além de um médium especial de influência física, um psicógrafo. Por causa disso, conseguiram a conversa bem explícita, como nome, local de nascimento, data da morte, etc. A comunicação espontanea começou assim:
1 – Escreve qualquer coisa, o que quiseres. – Ran plan plan, ran, plan, plan.
2 – Por que escreveste isso? – Eu era tocador de tambor.
Ele disse que morreu em uma batalha, e continua assumindo essa característica de batedor de tambor, por isso que fazia esses efeitos de marchinha.
16- Estás reencarnado? – Não, pois que venho conversar convosco.
17- Por que te manifestas por pancadas, sem que tenhas sido chamado? – É preciso fazer barulho para aqueles cujo coração nada crê. Se não tendes o bastante, dar-vos-ei ainda mais.
Observação: Ele demonstra uma certa superioridade moral.
18 – É de tua própria vontade que vieste bater, ou um outro Espírito obrigou-te a fazê-lo? – Venho por minha vontade; há um outro, a quem chamais Verdade, que pode forçar-me a isto também. Mas há muito tempo que eu queria vir.
19 – Com que objetivo querias vir? – Para conversar convosco; era o que queria; havia, porém, alguma coisa que mo impedia. Fui forçado por um Espírito familiar da casa, que me exortou a tornar-me útil às pessoas que me fizessem perguntas.
19.1 – Esse Espírito, então, tem muito poder, visto comandar outros Espíritos? – Mais do que imaginais, e não o emprega senão para o bem.
Observação: Os Espíritos sempre são assistidos.
22- Qual a existência que preferes: a atual ou a terrestre? – Prefiro a existência do Espírito à do corpo.Porque estamos bem melhor do que na Terra. A Terra é um purgatório; durante todo o tempo em que nela vivi, sempre desejei a morte.
25 – Ficarias satisfeito se tivesses uma nova existência corporal? – Sim, porque sei que devo elevar-me.
26 – Quem te disse isso? – Eu o sei bem.
27 – Reencarnarás logo? – Não sei.
Da pergunta 28 em diante, pela primeira vez na RE, os presentes perguntam para o Espírito manifestante sobre outros Espíritos na Erraticidade:
28. ─ Vês outros Espíritos ao teu redor? ─ Sim, muitos.
29. ─ Como sabes que são Espíritos? ─ Entre nós, vemo-nos tais quais somos.
30. ─ Com que aparência os vês? ─ Como se podem ver Espíritos, mas não pelos olhos.
31. ─ E tu, sob que forma aqui estás? ─ Sob a que tinha quando vivo, isto é, como tambor.
32. ─ E vês os outros Espíritos com as formas que tinham em vida? ─ Não. Nós não tomamos uma aparência senão quando somos evocados. Fora disso vemo-nos sem forma.
RE julho 1858
Veja que interessante: Ele vê os outros Espíritos ao seu redor sem forma alguma! Ele não é um Espirito avançado, mas, fora do momento em que são evocados, na erraticidade, os Espíritos NÃO têm uma forma.
Os Espíritos não tem olhos, não tem ouvidos, nem tato… porque eles não tem necessidade no plano espiritual desse tipo de manifestação. “Nossa forma é apenas aparente”, diz o tambor.
A comunicação segue com perguntas sobre a manifestação das batidas na mesa, no que ele diz que está ao lado dela, que não se mete dentro dela.
37-Como produzes os ruídos que fazes ouvir? – Creio que é por intermédio de uma espécie de concentração de nossa força.
38 – Poderias explicar-nos a maneira pela qual são produzidos os diferentes ruídos que imitas, as arranhaduras, por exemplo? – Eu não saberia precisar muito a natureza dos ruídos; é difícil de explicar. Sei que arranho, mas não posso explicar como produzo esse ruído que chamais de arranhadura.
Depois foi perguntado que dependia para levantar uma mesa, no que ele respondeu: – Depende de mim, pois me sirvo do médium como de um instrumento.E além disso tem que ser com médiuns específicos, que eu me atraio.
48 – De que te ocupas em tua existência de Espírito, considerando que não deves passar o tempo todo somente a bater? – Muitas vezes tenho missões a cumprir; devemos obedecer a ordens superiores e, sobretudo, fazer o bem aos seres humanos que estão sob nossa influência.
49 – Por certo tua vida terrestre não foi isenta de faltas; reconhece-as, agora? – Sim; e por isso as expio, permanecendo estacionário entre os Espíritos inferiores; só poderei purificar-me bastante quando tomar um outro corpo.
OBSERVAÇÃO: Aqui fica evidente o reconhecimento de suas faltas e o arrependimento.
55 – Estás sempre na Terra, em tua existência espiritual? – Mais freqüentemente no espaço.
56 – Vais algumas vezes a outros mundos, isto é, a outros globos? – Não aos mais perfeitos, mas aos mundos inferiores.
57 – Por vezes te divertes em ver e ouvir o que fazem os homens? – Não; entretanto, algumas vezes tenho piedade deles.
65 – Tiveste consciência imediata de tua nova existência? – Não, mas já não sentia mais frio.
RE julho 1858
OBSERVAÇÃO: Ele não tinha mais consciência de seu corpo.
COMENTÁRIO DE KARDEC SOBRE A COMUNICAÇÃO: – Pouco avançado na hierarquia espírita, como se vê, o próprio Espírito do Tambor reconhecia a sua inferioridade. Seus conhecimentos são limitados; mas tem bom senso, sentimentos louváveis e benevolência. Como Espírito, sua missão carecia de significado, visto que desempenhava o papel de Espírito batedor para chamar os incrédulos à fé; contudo, mesmo no teatro, a humilde indumentária de comparsa não pode envolver um coração honesto? Suas respostas têm a simplicidade da ignorância; entretanto, pelo fato de não possuírem a elevação da linguagem filosófica dos Espíritos superiores, nem por isso deixam de ser menos instrutivas, sobretudo para o estudo dos costumes espíritas, se assim nos podemos exprimir. É somente estudando todas as classes desse mundo que nos aguarda que podemos chegar a conhecê-lo e nele marcar, de algum modo, por antecipação, o lugar que a cada um de nós será dado ocupar. Vendo a situação que, por seus vícios e virtudes, criaram os homens, nossos iguais aqui na Terra, sentimo-nos encorajados para nos elevar o mais rapidamente possível desde esta vida: é o exemplo ao lado da teoria. Para conhecermos bem alguma coisa, e dela fazermos uma ideia isenta de ilusões, é preciso dissecá-la em todos os seus aspectos, assim como o botânico não pode conhecer o reino vegetal a não ser observando desde o mais humilde criptógamo, que o musgo oculta, até o carvalho altaneiro, que se eleva nos ares.
Lição de Caligrafia
Nesse artigo, Kardec apresenta o seguinte caso: tendo o médium Sr. D. apresentado um fenômeno muito interessante – o de escrever com uma caligrafia muito melhor quando inspirado pelos Espíritos – um dos membros da Sociedade, Dr. V. , teve a ideia de evocar o Espírito de um calígrafo, Bertrand, para fins de observação.
Segundo O livro dos Médiuns,
270. Quando se deseja comunicar com determinado Espírito, é de toda necessidade evocá-lo. (item 203.) Se ele pode vir, a resposta é geralmente: Sim, ou Estou aqui, ou, ainda: Que quereis de mim? Às vezes, entra diretamente em matéria, respondendo de antemão às perguntas que se lhe queria dirigir.
271. Surpreende, não raro, a prontidão com que um Espírito evocado se apresenta, mesmo da primeira vez. Dir-se-ia que estava prevenido. É, com efeito, o que se dá, quando com a sua evocação se preocupa de antemão aquele que o evoca. Essa preocupação é uma espécie de evocação antecipada e, como temos sempre conosco os nossos Espíritos familiares, que se identificam com o nosso pensamento, eles preparam o caminho de tal sorte que, se nenhum obstáculo surge, o Espírito que desejamos chamar já se acha presente ao ser evocado.
Mas será que há perigo em Evocar Espiritos?
278. Uma questão importante se apresenta aqui, a de saber se há ou não inconveniente em evocar maus Espíritos.
Kardec, OLM
“Isso depende do fim que se tenha em vista e do ascendente que se possa exercer sobre eles. O inconveniente é nulo, quando são chamados com um fim sério, qual o de os instruir e melhorar; é, ao contrário, muito grande, quando chamados por mera curiosidade ou por divertimento, ou, ainda, quando quem os chama se põe na dependência deles, pedindo-lhes um serviço qualquer. Os bons Espíritos, nesse caso, podem muito bem dar-lhes o poder de fazerem o que se lhes pede, o que não exclui seja severamente punido mais tarde o temerário que ousou solicitar-lhe o auxílio e supô-los mais poderosos do que Deus. Será em vão que prometa a si mesmo, quem assim proceda, fazer dali em diante bom uso do auxílio pedido e despedir o servidor, uma vez prestado o serviço. Esse mesmo serviço que se solicitou, por mínimo que seja, constitui um verdadeiro pacto firmado com o mau Espírito e este não larga facilmente a sua presa.” (Veja-se o item 212.).
279. Ninguém exerce ascendentes sobre os Espíritos inferiores, senão pela superioridade moral. Os Espíritos perversos sentem que os homens de bem os dominam. Contra quem só lhes oponha a energia da vontade, espécie de força bruta, eles lutam e muitas vezes são os mais fortes. A alguém que procurava domar um Espírito rebelde, unicamente pela ação da sua vontade, respondeu àquele: Deixa-me em paz, com teus ares de matamouros, que não vales mais do que eu; dir-se-ia um ladrão a pregar moral a outro ladrão.
282. 11.ª. Haverá inconveniente em se evocarem Espíritos inferiores? E será de temer que, chamando-os, o evocador lhes fique sob o domínio? “Eles não dominam senão os que se deixam dominar. Aquele que é assistido por bons Espíritos nada tem que temer. Impõe-se aos Espíritos inferiores e não estes a ele. Isolados, os médiuns, sobretudo os que começam, devem abster-se de tais evocações. (item 278.)
Continuando com o artigo, onde o medium traz a comunicação:
3. ─ Sabe o principal objetivo que nos levou a pedir sua vinda? ─ Não, mas desejo sabê-lo.
OBSERVAÇÃO: O Espírito do Sr. Bertrand ainda se acha sob a influência da matéria, como seria de supor-se, dada a sua vida terrena. Sabe-se que tais Espíritos são menos aptos a ler o pensamento do que os já mais desmaterializados.
Daí em diante, o Espírito continua dando mais alguns detalhes sobre sua vida. Em linhas gerais, ele demonstrava um arrependimento por ter usado mal, ou ao menos não tão bem quanto podia, o seu tempo encarnado:
9. ─ Qual foi o seu gênero de vida? ─ Procurava satisfazer às necessidades do corpo.
10. ─ Cuidava um pouco das coisas de Além-Túmulo? ─ Quase nada.
11. ─ Lamenta não pertencer mais a este mundo? ─ Lamento não haver bem empregado a minha existência.
12. ─ É mais feliz do que na Terra? ─ Não. Eu sofro pelo bem que deixei de fazer.
13. ─ Que pensa do futuro que lhe está reservado? ─ Penso que me é necessária toda a misericórdia de Deus.
14. ─ Quais as suas relações no mundo em que se encontra? ─ Relações lamentáveis e infelizes.
15. ─ Quando vem à Terra, há lugares que frequenta, de preferência a outros? ─ Procuro as almas que se condoem de minhas penas ou que oram por mim.
17. ─ Diz-se que em vida foi muito pouco tolerante. É verdade? ─ Eu era muito violento.
18. ─ Que pensa do objetivo de nossas reuniões? ─ Gostaria muito de tê-las conhecido em vida. Elas me teriam tornado melhor.
19. ─ Vê aí outros Espíritos? ─ Sim, mas me sinto muito confuso em sua presença.
20 ─ Rogamos a Deus que o tenha em sua santa misericórdia. Os sentimentos que acaba de externar devem permitir que ache graça diante dele. Não duvidamos que o ajudem em seu progresso.
OBSERVAÇÃO: Os ensinamentos fornecidos pelo Espírito do Sr. Bertrand são absolutamente exatos e concordes com o gênero de vida e o caráter que lhe conheciam. Apenas ao confessar sua inferioridade e seus erros, a linguagem é mais séria e mais elevada do que se poderia esperar. Mais uma vez temos a prova da penosa situação dos que na Terra são muito apegados à matéria. É assim que os próprios Espíritos inferiores por vezes nos dão, pelo exemplo, valiosas lições de moral.