Confissões de Luis XI

Durante o ano de 1858, Ermance Dufaux recebeu algumas autobiografias mediúnicas. Entre elas, os autores foram os reis franceses Luís XI e Carlos VIII. Allan Kardec elogiou o trabalho da Srta. Dufaux e transcreveu trechos das “Confissões de Luís XI” na Revista Espírita. Nesse mesmo ano, Kardec divulgou três mensagens psicografadas pela jovem sensitiva.

Esta comunicação especificamente não parece ter muita relevância para nós, neste momento. São fatos históricos, utilizados para evidenciar a autenticidade do Espírito comunicante. Destacamos que Luís XI não é São Luís, o Espírito que sempre se comunicava como um dos “mentores” dos estudos de Kardec.

Além deles, ela recebeu autobiografia mediúnica de Joana D’arc, ja mencionada na edição da RE de janeiro de 1858

Para quem quer saber mais sobre a Srta. Ermance Dufaux, clique aqui

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Finalidade de Certas Evocações

Nesse artigo, Kardec demonstra a utilidade da evocação dos Espíritos de todos os gêneros, desde os Espíritos com intuito sério e construtivo até os que cometeram crimes hediondos, pois, “para conhecer os costumes de um povo, é preciso estudá-lo em todos os graus da escala”.

Sendo assim, há sempre o impasse, pois Espíritos superiores tem muito a ensinar, mas nossa distância com relação a eles é bastante grande. Os Espíritos mais “burgueses”, ou seja, Espíritos como nós, mais comuns, presos ainda às preocupações cotidianas, apresentam muitos ensinamentos importantes, por nos tornar capazes de nos vermos em suas próprias ações e seus efeitos. Todos nos mostram a aplicação prática das grandes e sublimes verdades, cuja teoria nos ensinam os Espíritos superiores.

Outra vantagem de algumas evocações é constatar a identidade dos Espíritos de modo mais preciso. Quando um Espírito se apresenta sob um grande nome do passado, só é possível crer sob palavra e julgar seu conteúdo sobre o que se conhece. Se o conteúdo atende aos critérios necessários, julgamo-lo Espírito superior, e isso basta. O nome não importa realmente.

Contudo, quando um Espírito de menor evolução se apresenta e dá detalhes que comprovem sua identidade, teremos, aí, grandes exemplos muito “palatáveis”: “é o romance dos costumes da vida espírita sem a ficção”.

Discutimos, também, sobre as nossas vivencias pessoais a respeito de evocações de familiares e amigos.

Particularmente, temos sempre que tomar muito cuidado quanto ao conteúdo do Espírito comunicante, pois ele pode não ser quem diz quem é. Algumas comunicações trazem algum consolo a nós.

A seguir, 3 evocações de 3 Espíritos diferentes: o primeiro é o Assassino Lemaire ( cerca de um mês após desencarne); A Rainha de Oude ( cerca de um mês após desencarne) e Dr. Xavier ( evocação depois de muitos meses após desencarne).




Dr. Xavier

O Dr. Xavier foi um médico de grande talento e que havia se ocupado muito do magnetismo, sobre o qual havia deixado um manuscrito que supunha que viesse revolucionar a Ciência. Antes de morrer havia lido O Livro dos Espíritos e desejado um contato com Allan Kardec, o que não pôde realizar. Meses após sua morte, ocorreu sua evocação, à pedido da família, sendo esta realizada na presença de Kardec. Ele tomou o cuidado de excluir, nesta publicação, as perguntas e respostas de caráter particular.

Observação: a comunicação contém acertos e erros, por parte do Espírito. Kardec apresenta ambos, pois quer nos levar a constatar e a refletir sobre o fato de que o Espírito não se torna sábio ao desencarnar.

nosso comentário

Depois de evocado, Dr. Xavier respondeu às indagações sobre a Doutrina Espirita, sobre o começo da vida, sobre a união do Espirito ao novo corpo, assim como a desunião do Espirito no fim da vida do corpórea.

Dr. Xavier disse que a Doutrina Espirita é uma grande obra, sendo que o seu pior inimigo são as religiões, crenças dos homens. (N. da Autora: Tão atual… Podemos observar que não mudou muita coisa desde então… )

Quando Dr. Xaier foi perguntado sobre o corpo conservar por alguns instantes a vida orgânica após a separação da alma, ele disse que o corpo sente o que lhe provocou a morte somente por alguns instantes.

Na hora da separacão, ele disse:

Perg. 21 – Como se opera a separação entre a alma e o corpo na hora da morte do corpo?

Resp. Dr. – Como um fluido que escapa de um vaso qualquer. 

Perg. 22 – Há uma linha de demarcação realmente nítida entre a vida e a morte?

Resp. Dr. – Esses dois estados se tocam e se confundem; assim, o Espírito se desprende pouco a pouco de seus laços; ele os desenlaça, não os arrebenta.

Perg. 23 – Esse desprendimento da alma opera-se mais prontamente em uns do que em outros?

Resp. Dr. – Sim: nos que em vida já se elevaram acima da matéria, porque, então, sua alma pertence mais ao mundo dos Espíritos do que ao mundo terrestre.

Perg. 23 – Em que momento se opera a união entre a alma e o corpo na criança?

Resp. Dr. – Quando a criança respira; como se recebesse a alma com o ar exterior.

RE março 1858, Dr. Xavier

Observação (Allan Kardec) – Essa opinião é consequência do dogma católico. Com efeito, ensina a Igreja que a alma não pode ser salva senão pelo batismo; ora, como a morte natural intrauterina é muito frequente, em que se tornaria essa alma, privada, segundo ela, desse único meio de salvação, se existisse no corpo antes do nascimento? Para ser coerente, seria preciso que o batismo fosse realizado, se não de fato, pelo menos de intenção, desde o momento da concepção.

Nossa observação – A teoria dada por esse Espírito sobre o instante da união entre a alma e o corpo não é absolutamente exata. A união começa desde a concepção, isto é, a partir do momento em que o Espírito, sem estar encarnado, liga-se ao corpo por um laço fluídico, que cada vez mais se vai apertando até o instante em que a criança vê a luz. A encarnação só se completa quando a criança respira.

Segue a conversa com o Espírito de Dr. Xavier sobre a vida intrauterina, sobre o aborto espontâneo e o provocado, sobre como o acontece ao Espirito nessas situações, enfim, sobre a união da alma e do corpo. Este entendimento completo e muito bem explicado está no Livro dos Espiritos, de Allan Kardec, cap VII – Da volta do Espírito a Vida Corporal, União da alma e do Corpo, da questão 344 a 360.

Além das passagens citadas do Livro dos Espíritos, sugerimos consultar o O Céu e o Inferno, Allan Kardec, Segunda Parte: Exemplos, capítulo I. O passamento, Editora Feal onde há uma extensa explicação sobre o que discutimos na LIVE.




A Rainha de Oude

A Rainha de Oude foi evocada. Ela foi uma Rainha Indiana( seu nome era Malika Kishwar) que havia visitado a Inglaterra. Na sua viagem de volta a India, acabou por adoecer e morrer em Paris, no ano de 1858. Mais detalhes aqui Rainha de Oude Daqui para frente vamos chamá-la de rainha.

A rainha se apresentou muito perturbada, sentindo dificuldade de entender o que se passava com ela. Pela sua conversa, pudemos perceber a sua soberba e orgulho. Foram feitas várias perguntas quanto a sua opinião da sua vida terrena, das condições da mulher, da vida dos indianos, sobre Maomé, Deus, Jesus, mas ela disse que era muito poderosa para se ocupar com Deus.

Ela disse que sentia saudade da vida, que esperava que seus súditos viessem lhe sevir. Ela falou mais de uma vez que era sempre rainha, mesmo em outras existencias. Ela era extremamente arrogante.

A rainha, além de perturbada, parecia bem incomodada com as perguntas, o que foi questionada. Ela disse que foi forçada a vir:

Perg. 22 ─ Por que acudistes tão prontamente ao nosso apelo?

Resp. Rainha: – Nao queria fazê-lo, mas forçaram-me. Acaso julgarás que me dignaria responder-te? Quem és tu ao meu lado?

Perg. 23 – E quem vos forçou a vir?

Resp. Rainha: – Eu mesma não sei… posto que nao deve existir ninguém maior do que eu.

A Rainha de Oude, RE março/1858

A conversa cessou assim que teve a intervenção do Espírito de Sao Luis:

Perg. 32 ─ Pedimos apenas a bondade de responder ainda a duas ou três perguntas.

Resp. São Luis – ─ Deixai-a, pobre transviada! Tende piedade de sua cegueira. Que ela vos sirva de exemplo! Não sabeis quanto sofre o seu orgulho.

Pensávamos encontrar nesse Espírito, se não a filosofia, pelo menos um mais verdadeiro sentimento da realidade e ideias mais sadias sobre as vaidades e grandezas terrenas. Longe disto, nela as ideias terrenas conservavam toda a sua força: é o orgulho, que nada perde de suas ilusões.

Esta descrição de evocação se encontra também no livro O Céu e o Inferno de Allan Kardec, Segunda parte, cap. VII – Espíritos Endurecidos.




O Assassino Lemaire

Neste artigo, Kardec relata o caso de um assassino chamado Lemaire. Ele foi invocado depois de sua execução ocorrida em 31 de dezembro de 1857 em Paris.

Lemaire era um jovem de 23 – 24 anos. Foi diversas vezes preso por roubo seguido de assassinatos mais de uma vez. Fugiu da prisão, foi retido novamente. Ele era temido pela sociedade. Aqui tem artigo em francês sobre sua vida.

Quando invocado por Kardec, através da Srta. Raquel, imediatamente se manifestou para os questionamentos. Em suas palavras, observou-se o nítido arrependimento de seus atos. Além disso, estava envergonhado.

Lemaire contou que encontrava suas vítimas que assassinou e sentia remorso. Sua dor moral era insuportável,

– Elas têm ódio e desejo de vingança?

Não. Suas preces atraem para mim a expiação. Não podeis avaliar que horrível suplício é tudo dever àquele a quem se odeia.

Na RE, Assassino Lemaire, pergunta 20.

Ainda acrescentou, através de respostas de seus invocadores, o seguinte:

 ─ Como pensas resgatar os crimes?

─ Por novas provas, mas me parece que a Eternidade está entre mim e elas.

pergunta 32

Ele estava muito perturbado, o que deve ter provocado neles vontade de poder dar algum tipo de conforto ao Espírito de Lemaire.

Esta evocação também está descrita no livro O Céu e o Inferno de Allan Kardec, Segunda Parte, cap. VI – Criminosos arrependidos.




Lei de ação e reação, lei do retorno, carma: por que sofremos, segundo o Espiritismo?

Talvez você que esteja lendo, como eu, já tenha feito aquela pergunta: “Deus, por que comigo?”

Esse questionamento, bastante natural quando ainda não temos plena compreensão dos ensinamentos dos Espíritos superiores através do Espiritismo, ainda encontra muitas explicações inexatas ou mesmo erradas, justamente por essa falta de compreensão, que nasce pela falta de estudo.

Vamos apresentar algumas dessas opiniões incongruentes com o Espiritismo:

  • Porque Deus quer
  • Porque estou pagando por um mal passado
  • Porque estou sendo castigado por um erro de outras vidas
  • Porque é o acaso
  • É karma (ou carma)
  • É a Lei de Ação e Reação (o que reflete um mal passado)
  • É “resgate” de outras vidas

Todas as explicações, exceto a que diz ser obra do acaso, refletem, no fundo, uma mesma opinião: se estou sofrendo é porque Deus está me submetendo a um castigo, já que eu errei. Uma opinião ainda vai além: Deus não gosta de mim.

Nós precisamos nos descolar um pouco mais dessas velhas concepções, de uma época em que a mentalidade humana não estava pronta para avançar alguns passos à frente e entender um Deus que é todo bondade e amor. No passado, acreditávamos que Deus era um ser cruel, vingativo, cheio de ira e de cólera, porque Lhe atribuíamos nossas imperfeições, por não conseguirmos entender um ser que não as tivesse. Hoje, contudo, não é mais dessa forma.

Allan Kardec, em O Livro dos Espíritos, apresenta uma face de Deus, obtida dos ensinamentos dos Espíritos superiores, nunca antes conhecida na face da Terra – pelo menos não como doutrina:

1. Que é Deus?

“Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas” *

2. Que se deve entender por infinito?

“O que não tem começo nem fim; o desconhecido; tudo que é desconhecido é infinito.”

3. Poder-se-ia dizer que Deus é o infinito?

“Definição incompleta. Pobreza da linguagem dos homens, insuficiente para definir o que está acima de sua inteligência.”

[…]

13. Quando dizemos que Deus é eterno, infinito, imutável, imaterial, único, onipotente, soberanamente justo e bom, temos ideia completa de seus atributos?

“Do vosso ponto de vista, sim, porque credes abranger tudo. Sabei, porém, que há coisas que estão acima da inteligência do homem mais inteligente, as quais a vossa linguagem, restrita às vossas ideias e sensações, não tem meios de exprimir. A razão, com efeito, vos diz que Deus deve possuir em grau supremo essas perfeições, porquanto, se uma lhe faltasse, ou não fosse infinita, já ele não seria superior a tudo, não seria, por conseguinte, Deus. Para estar acima de todas as coisas, Deus tem que se achar isento de qualquer vicissitude e de qualquer das imperfeições que a imaginação possa conceber.”

Sendo que nossa concepção de Deus evoluiu muito, como então podemos atribuir a ele a execução de castigos ou de cobranças, posto que Ele sabe que as imperfeições que temos são apenas momentâneas e que desaparecerão com a nossa evolução?

Mas, podemos objetar, fatos são fatos: se não há acaso, mas sofro, deve então haver uma razão para tais sofrimentos. Se não fui eu quem causou o sofrimento, então alguém está me submetendo a eles, portanto, só pode ser Deus.

Precisamos, porém, analisar essa cadeia de pensamentos de forma racional, que é o convite sempre feito por Kardec frente a quaisquer questões:

Em primeiro lugar, precisamos compreender que somos Espíritos encarnados e enquanto estivermos ligados ao corpo, sobretudo em estado tão denso, estaremos sujeitos às vicissitudes da matéria, incluindo as dores e os sofrimentos naturalmente causados por algo como, por exemplo, frio e calor.

Em segundo lugar, precisamos aprender a analisar e distinguir os gêneros de sofrimentos causados por nós mesmos, na presente encarnação, pelas nossas formas de agir e de pensar. Nesse sentido, Kardec nos chama à reflexão:

Remontando-se à origem dos males terrestres, reconhecer-se-á que muitos são consequência natural do caráter e do proceder dos que os suportam.

Quantos homens caem por sua própria culpa! Quantos são vítimas de sua imprevidência, de seu orgulho e de sua ambição!

Quantos se arruínam por falta de ordem, de perseverança, pelo mau proceder, ou por não terem sabido limitar seus desejos!

Quantas uniões desgraçadas, porque resultaram de um cálculo de interesse ou de vaidade e nas quais o coração não tomou parte alguma!

Quantas dissensões e funestas disputas se teriam evitado com um pouco de moderação e menos suscetibilidade!

Quantas doenças e enfermidades decorrem da intemperança e dos excessos de todo gênero!

Quantos pais são infelizes com seus filhos, porque não lhes combateram desde o princípio as más tendências! Por fraqueza, ou indiferença, deixaram que neles se desenvolvessem os gérmens do orgulho, do egoísmo e da tola vaidade, que produzem a secura do coração; depois, mais tarde, quando colhem o que semearam, admiram-se e se afligem da falta de deferência com que são tratados e da ingratidão deles.

Interroguem friamente suas consciências todos os que são feridos no coração pelas vicissitudes e decepções da vida; remontem passo a passo à origem dos males que os torturam e verifiquem se, as mais das vezes, não poderão dizer: Se eu houvesse feito, ou deixado de fazer tal coisa, não estaria em semelhante condição.

Allan Kardec – O Evangelho Segundo o Espiritismo – cap. V

Fica muito evidente que muitos sofrimentos há que nascem por conta de nossas ações, mesmo que em pensamento, e sobre os quais não podemos acusar senão a nós mesmos.

Mas, e a respeito dos sofrimentos que não causamos nesta vida? De onde vem eles então? Se não vem de hoje, muitos dirão, são reflexos de outras vidas. Estou apenas pagando por erros passados. Mas, refletiremos, se Deus não cobra nem nos castiga, quem é que está me cobrando por supostos débitos? Minhas vítimas do passado, alguns dirão. Supomos mesmo que, muitas vezes, vítimas nossas nos perseguem por mais de uma encarnação, buscando vingança. Mas seria isso uma regra? Não há os inúmeros casos dos Espíritos que perdoam seus algozes e seguem suas vidas? Quem, então, quem estaria nos cobrando e punindo? Onde estaria o tribunal?

Há, neste ponto, um ensinamento muitíssimo importante dado pelos Espíritos superiores, citado em O Livro dos Espíritos:

621. Onde está escrita a lei de Deus?

“Na consciência.”

Essa resposta é tão sucinta, mas tão completa, que nos espanta. Ora, já entendemos que o Espírito só passa a ter livre-arbítrio quando entra no reino da consciência. Antes disso, suas ações são maquinais, respondendo apenas aos instintos. Quando, consciente, porém, passa a ter a livre escolha sobre os seus atos e, por assim dizer, entre bem e mau.

Estou tomando uma linha de exposição bastante construtiva a fim de bem elaborar o pensamento: entendemos, então, que, a partir do momento em que desenvolvemos a consciência, a Lei de Deus passa a vigorar em nossa própria mente. Assim, enfim, chegamos à resposta crucial: quem nos persegue somos nós mesmos.

Quando fazemos de uma imperfeição, um hábito, passamos a cometer erros que, então, passam a nos fazer infelizes a partir do momento em que nos conscientizamos sobre eles. Quando no estado de erraticidade, então, avaliamos nossos atos e suas consequências, sobre nós e sobre os outros, e passamos a planejar novas encarnações com provas que visamos nos ajudem a aprender e a vencer essas imperfeições. Muitas vezes, contudo, perseguidos por uma grande culpa e ainda pouco desenvolvidos no entendimento, chegamos ao ponto de planejar grandes e dolorosas expiações, como a criança que, não sabendo lidar com a culpa por algum mal cometido, pede ao pai que a castigue.

Vemos, portanto, que as dificuldades e dores de nossas vidas, quando não oriundas de nossas ações presentes, são ricas oportunidades de aprendizado e reajuste. Outras vezes, tragédias e dores terríveis são planejadas pelo próprio Espírito para buscar aliviar sua consciência sobre algo passado. Contudo, fica uma lição muito importante: conforme entendemos mais profundamente a mecânica da evolução espiritual, faremos melhores planejamentos para nossas encarnações.

Ainda somos Espíritos muito ligados a essas concepções de pecado e castigo, chegando ao ponto de elaborar planejamentos reencarnatórios ligados à “Lei de Talião” — olho por olho, dente por dente. Mas, conforme compreendemos que o que realmente importa é identificar nossas imperfeições transformadas em maus hábitos e corrigi-las, entendendo que o castigo ensina pouco ou quase nada, buscaremos formas melhores de planejar novas oportunidades, nos desligando progressivamente da necessidade das expiações muito brutas para, então, buscar oportunidades mais ligadas a uma educação espiritual basilar, desde os primeiros passos da infância material, com vistas a fortalecer virtudes e a abafar imperfeições.

Afinal, queremos dizer: as dificuldades desta vida, por pior que pareçam, se não são efeito negativo de nossas ações presentes ou da própria Natureza, são oportunidades planejadas por nós mesmos para nossa elevação. Nos esforcemos, portanto, para encarar de forma diferente essas provações, buscando aprender com elas, nos apoiando sempre na prece e nos estudos do Espiritismo, que muito podem fazer por ajudar a mudar nossas concepções ainda nesta vida.

Para complementar esta leitura, sugerimos a leitura do artigo sobre Punição e Recompensa, publicado recentemente.


Sugestões de leitura:

  1. O caso de Antonio B, em O Céu e o Inferno
  2. Nossas reflexões sobre o artigo A Fatalidade e os Pressentimentos, apresentado na edição de Março da Revista Espírita de 1858
  3. O Assassino Lemaire, na Revista Espírita de Março de 1858



Júpiter e alguns outros mundos

Nesse artigo, muito conectado ao anterior, Kardec, se reportando à Escala Espírita, faz algumas outras conjecturas a respeito de como poderia ser um planeta todo habitado por Espíritos da nona (décima) classe, as dificuldades imensas, o estado geral de crime, de horror, de padecimentos físicos e morais.

Em seguida, conjectura um planeta habitado por Espíritos todos da terceira ordem – Espíritos impuros, levianos, pseudo-sábios e neutros. Dominaria, aí, ainda o mal, embora cada vez menos presente conforme se afastassem da nona (décima) classe tais Espíritos. O orgulho, o egoísmo, as paixões, a escravização e diversas outras imperfeições morais ainda aí dominariam.

NUMA TAL SOCIEDADE, SE DOMINAR, O ELEMENTO IMPURO ESMAGARÁ O OUTRO; CASO CONTRÁRIO, OS MENOS MAUS PROCURARÃO DESTRUIR OS SEUS ADVERSÁRIOS; EM TODO CASO HAVERÁ LUTA, LUTA SANGRENTA, DE EXTERMÍNIO, PORQUE SÃO DOIS ELEMENTOS QUE TÊM INTERESSES OPOSTOS. PARA PROTEGER OS BENS E AS PESSOAS, HAVERÁ NECESSIDADE DE LEIS, MAS ESSAS SERÃO DITADAS PELO INTERESSE PESSOAL E NÃO PELA JUSTIÇA; SERÃO FEITAS PELO FORTE, EM DETRIMENTO DO FRACO

Em seguida, Kardec nos convida a imaginar, no meio desses Espíritos, alguns da segunda ordem: veríamos, então, em meio às perversidades, algumas virtudes.

SE OS BONS FOREM MINORIA, SERÃO VÍTIMAS DOS MAUS; À MEDIDA, PORÉM, QUE SE ACENTUA SEU PREDOMÍNIO, A LEGISLAÇÃO TORNA-SE MAIS HUMANA, MAIS EQUITATIVA E A CARIDADE CRISTÃ DEIXA DE SER PARA TODOS LETRA MORTA. DESSE MESMO BEM NASCERÁ OUTRO VÍCIO. A DESPEITO DA GUERRA QUE OS MAUS DECLARAM INCESSANTEMENTE AOS BONS, ELES NÃO PODEM EVITAR ESTIMÁ-LOS EM SEU FORO ÍNTIMO. VENDO O ASCENDENTE DA VIRTUDE SOBRE O VÍCIO E NÃO TENDO FORÇA NEM VONTADE DE PRATICÁ-LA, PROCURAM PARODIÁ-LA E TOMAM A SUA MÁSCARA. DAÍ OS HIPÓCRITAS, TÃO NUMEROSOS EM TODA SOCIEDADE ONDE A CIVILIZAÇÃO É AINDA IMPERFEITA.

Afinal, Kardec chega, pela imaginação, a um mundo todo habitado por Espíritos da segunda ordem, para onde, pela simples leitura, gostaríamos de nos transportar neste exato momento. Não reina ali a igualdade absoluta, posto que a segunda ordem ainda abrange Espíritos de vários graus de desenvolvimento. Contudo, essa desigualdade não gera inveja do menos avançado nem orgulho do mais avançado: todos estariam unidos no propósito de aprendizado e elevação.

AS CONSEQUÊNCIAS QUE TIRAMOS DESTE QUADRO, EMBORA APRESENTADAS DE MANEIRA HIPOTÉTICA, NÃO SÃO MENOS RACIONAIS, E CADA UM PODE DEDUZIR O ESTADO SOCIAL DE UM MUNDO QUALQUER, CONFORME A PROPORÇÃO DOS ELEMENTOS MORAIS DE QUE O SUPOMOS CONSTITUÍDO.

VIMOS QUE, ABSTRAÇÃO FEITA DA REVELAÇÃO DOS ESPÍRITOS, TODAS AS PROBABILIDADES SÃO PARA A PLURALIDADE DOS MUNDOS. ORA, NÃO É MENOS RACIONAL PENSAR QUE NEM TODOS ESTEJAM NO MESMO GRAU DE PERFEIÇÃO E QUE, POR ISSO MESMO, NOSSAS SUPOSIÇÕES PODEM PERFEITAMENTE SER EXPRESSÃO DA REALIDADE.

Vemos, através desse exercício, em que momento espiritual a Terra se encontra e em quais já se encontrou. Baseados nesse pensamento e na Escala Espírita, vemos quais males ainda precisamos extirpar de nossas individualidades a fim de avançar para melhores posições.

Sobre alguns planetas vizinhos, Kardec informa que, segundo os Espíritos, Marte seria um planeta ainda mais atrasado que a Terra, onde se encarnariam Espíritos quase exclusivamente da nona (décima) classe. Mas, pelo fato de que não encontramos nada em Marte além de poeira devemos imaginar que os Espíritos enganaram Kardec? Ora, não! Apenas que essa encarnação deve se dar em estado fluídico, fora de nossos sentidos.

Segue Allan Kardec comentando alguns ensinamentos a respeito de outros planetas, sendo o mais interessante aqueles que falam a respeito de Júpiter, que seria um planeta de muito maior elevação espiritual que o nosso. Ali encarnariam, segundo relatos dos Espíritos, apenas Espíritos da segunda ordem. Retratam, esses Espíritos, cidades maravilhosas.

Será que um dia pousaremos lá uma sonda e constataremos uma civilização perceptível aos nossos sentidos e aparelhos? Talvez sim, talvez não. Pode ser que um dia pousemos lá e encontremos um planeta gélido e deserto, como pode ser que encontremos alguma forma de vida. Não sabemos e, caso se dê o primeiro caso, também poderemos supor que tais cidades e civilização se constituem, também, em matéria etérea, como já sabemos que mesmo nas circunvizinhanças de nossos planeta tal fato se dá.

De qualquer forma, são conjecturas de um tempo passado que, embora válidas em muitos sentidos, talvez possam ser um dia – quando os estudos metodológicos das comunicações dos Espíritos possam ser retomados – revisitadas e complementadas ou corrigidas.




A pluralidade dos mundos

A ciência da época de Kardec é algo bastante diferente do que é hoje. Muitos avanços científicos foram obtidos e, enquanto Kardec podia apenas imaginar como seriam os planetas vizinhos e mesmo lua, hoje já visitamos o último corpo celeste diversas vezes, já pousamos pelo menos 3 veículos autônomos em Marte e, há pouco, fizemos chegar à órbita de Mercúrio a primeira sonda humana. Enorme revolução, se comparada a uma época onde apenas se podia fazer cogitações, através de uma luneta.

Iniciamos assim de forma a nos colocar no tempo de Kardec, o que é imprescindível para entender suas conjecturas a respeito dos corpos astrais próximos. É muito importante, também, notar que há duas partes distintas na Doutrina Espírita a esse respeito: os conhecimentos e conjecturas humanos e os conhecimentos ensinados pelos Espíritos, da forma que o homem podia entender àquela época.

Da parte humana, Kardec, nesse artigo, faz diversas conjecturas a respeito de como seriam os outros mundos, baseado naquilo que a ciência humana de então já havia podido observar. Cria hipóteses, bastante plausíveis para o conhecimento de então, sobre as formações atmosféricas desses orbes distantes, conjecturando, então, a respeito das possíveis formas de vida que aí poderiam haver, inclusive aquelas não detectáveis pelos nossos cinco sentidos, ou seja, aquelas que poderiam estar em estados muito mais sutis da matéria.

Mas a intenção desse artigo de Kardec não é apenas fazer conjecturas filosóficas a respeito da vida, vista de forma científica, fora da Terra: é também fazer o leitor refletir a respeito da grandeza divina, que nada faz por acaso e que, também nesse sentido, não teria feito planetas apenas para a nossa apreciação. Aliás, Kardec faz essa abordagem baseado nos ensinamentos dos Espíritos, como podemos verificar em O Livro dos Espíritos:

55. SÃO HABITADOS TODOS OS GLOBOS QUE SE MOVEM NO ESPAÇO?

“SIM E O HOMEM TERRENO ESTÁ LONGE DE SER, COMO SUPÕE, O PRIMEIRO EM INTELIGÊNCIA, EM BONDADE E EM PERFEIÇÃO. ENTRETANTO, HÁ HOMENS QUE SE TÊM POR ESPÍRITOS MUITO FORTES E QUE IMAGINAM PERTENCER A ESTE PEQUENINO GLOBO O PRIVILÉGIO DE CONTER SERES RACIONAIS. ORGULHO E VAIDADE! JULGAM QUE SÓ PARA ELES CRIOU DEUS O UNIVERSO.”

[…]

57. NÃO SENDO UMA SÓ PARA TODOS A CONSTITUIÇÃO FÍSICA DOS MUNDOS, SEGUIR-SE-Á TENHAM ORGANIZAÇÕES DIFERENTES OS SERES QUE OS HABITAM?

“SEM DÚVIDA, DO MESMO MODO QUE NO VOSSO OS PEIXES SÃO FEITOS PARA VIVER NA ÁGUA E OS PÁSSAROS NO AR.”

Cientificamente, naquela época, já era possível constatar que a Lua não tinha atmosfera, que Mercúrio seria muito quente e que Saturno seria muito frio. Como, então, poderia haver vida nesses orbes? Sobre isso, temos duas hipóteses, adotadas por Allan Kardec:

  1. Os seres que ali vivem, se forem de constituição física de mesma densidade da nossa, poderiam ser adaptados a esses lugares, como na Terra existem seres vivos que sobrevivem ao frio e ao calor extremos ou mesmo a compostos químicos que nos matariam em pouco tempo, bem como existem animais adaptados a viverem a vida toda dentro da água e outros apenas na terra.
  2. Os seres que ali vivem são constituídos de matéria etérea, mais sutil que a nossa matéria e, por isso, vivem em condições totalmente adversas das nossas. Sobre isso, também em O Livro dos Espíritos, há um indício:

58. OS MUNDOS MAIS AFASTADOS DO SOL ESTARÃO PRIVADOS DE LUZ E CALOR, POR MOTIVO DE ESSE ASTRO SE LHES MOSTRAR APENAS COM A APARÊNCIA DE UMA ESTRELA?

“PENSAIS ENTÃO QUE NÃO HÁ OUTRAS FONTES DE LUZ E CALOR ALÉM DO SOL E EM NENHUMA CONTA TENDES A ELETRICIDADE, QUE, EM CERTOS MUNDOS, DESEMPENHA UM PAPEL QUE DESCONHECEIS E BEM MAIS IMPORTANTE DO QUE O QUE LHE CABE DESEMPENHAR NA TERRA? ADEMAIS, NÃO DISSEMOS QUE TODOS OS SERES SÃO FEITOS DE IGUAL MATÉRIA QUE VÓS OUTROS E COM ÓRGÃOS DE CONFORMAÇÃO IDÊNTICA À DOS VOSSOS.”

O que Kardec faz nesse artigo é, de posse de informações obtidos pela ciência humana e pela ciência espírita, raciocinar, junto ao leitor, sobre a possibilidade muito natural de haver vida, de alguma forma, em todos os orbes existentes no espaço e, inclusive, no espaço, isto é, no espaço “vazio”. Não há, nesse pensamento, nada de errado.

Contudo, podemos pensar: “já chegamos à Lua e a Marte e não encontramos nada daquilo que ele imaginava. Kardec, portanto, errou”. Ora, pela segunda hipótese, não, ele não errou. Podem ali existir seres em estado etéreo, como entre nós os Espíritos vivem, passeiam e interagem, através de seus perispíritos, sem que sequer os notemos (senão quando temos faculdades mediúnicas para tal). Outrossim, precisamos lembrar que Kardec nunca se disse dono da última verdade: apenas raciocinava com base no que a ciência lhe fornecia.

Pode ser que um dia pousemos num planeta próximo e lá encontremos novas formas de vida, sensíveis aos nossos sentidos, ou pode ser que estejam todos os planetas próximos vazios de vida biológica, talvez mesmo por sabedoria divina que, quem sabe, entenda que o homem apenas encontraria motivos para guerras se encontrasse outros seres vivos em planetas próximos. Agora, vocês vêem, sou apenas eu conjecturando.




Espiritismo e Política

Bate o horário da palestra no Centro Espírita. Sobe à tribuna o palestrante, aparentemente bem preparado e de linguagem eloquente e, em meio a temas relativos ao meio espírita atual, começa a emitir opiniões diversas a respeito de um suposto propósito do Espiritismo como alicerce de movimentos políticos.

Muito provavelmente você também, caro leitor, já presenciou tais feitos, ou já ouviu relatos próximos. E, é claro, tais opiniões – pessoais, lembramos – despertam simpatias e antipatias, porque, no campo político, há muito embate e discordância de ideologias.

Não vamos nomear lados, partidos, ideologias ou o que quer que seja. O que vamos defender, aqui, é que o Espiritismo não é e nem nunca será um movimento político. E quem envolve a Doutrina em tais assuntos, não a entendeu em sua profundidade e se baseia num entendimento distorcido para fundamentar suas próprias inclinações ideológicas políticas, afastando do Espiritismo as pessoas que não concordam com sua forma de pensar – quase sempre bastante fechada em um círculo específico de ideias.

O Espiritismo, lembramos, é uma ciência moral de aspecto filosófico, cuja teoria nasceu da observação dos fatos espíritas – isto é, da manifestação dos Espíritos. Sua essência, em sua clareza original, é voltada à reforma de ideias, no sentido de como o Espírito humano encara sua evolução, suas provas, suas dificuldades e suas oportunidades. Não é acaso, aliás, que Allan Kardec foi formado no Castelo de Yverdon, pelo método de Pestalozzi: é através da pedagogia da fraternidade e do amor, e não pela punição, que o Espírito realmente adquire um entendimento real a respeito de suas potencialidades e de suas imperfeições, se aperfeiçoando e deixando para trás seus maus hábitos.

Por que dizemos tudo isso? Porque as ideologias políticas, de todos os lados, contam com adeptos – à exclusão daqueles muitos apenas utilizam da política para benefício próprio – que visam a melhoria social. Quando esses adeptos são espíritas, muitas vezes são levados a acreditar, por um entendimento muito raso, que as ideias espíritas se aliam às suas ideologias políticas, e passam a divulgar a quatro ventos tais crenças, sem se importar com as antipatias que despertarão. A propósito, precisamos também lembrar: a maioria das ideologias políticas atropela as liberdades de pensamento individuais, sendo que o Espiritismo faz justamente o contrário.

E isso tudo, repito, por um entendimento muito raso, por não se aprofundar nos estudos da Doutrina a ponto de entender que o propósito do Espiritismo é reeducar o Espírito humano e, aliando-se à educação desde a infância, melhorar a forma como o Espírito encara a vida material, promovendo nele uma mudança de ideias sobre as dificuldades da vida e sobre a necessidade de abafar seus ímpetos de orgulho e egoísmo e de agir de forma caridosa, como obrigação moral, respeitando o livre-arbítrio que cada um tem.

Isso sim muda a sociedade, pois modifica a forma como o indivíduo encara a vida e o próximo. O Espiritismo nos oferece terreno comum, sendo uma ciência disponível para pessoas de todas as crenças e ideologias, desde entendam que a sua real proposta é a modificação individual, pela livre-consciência, e não por força de lei.

Da mesma forma que se afugenta um indivíduo que bate à porta do centro buscando consolação mas ouve as mais diversas abobrinhas, também se afugentam irmãos ao envolver temas políticos no meio espírita. Infelizmente, vejo muitos espíritas apoiando ideias e indivíduos que, direta ou indiretamente, ferem ou declaradamente desejam ferir o primeiro princípio básico da lei divina, sustentada pelo Espiritismo, que é o livre-arbítrio.

Não quero dizer que seja eu alguém tão digno de se fazer importante por sua presença ou ausência, mas penso que não sou o único a se afastar por conta desse tipo de viés que não deveria, segundo minha modesta opinião, fazer parte de estudos da Doutrina – pensando que, embora queiramos imprimir aos grupos nossas próprias personalidades e ideias, temos muita responsabilidade sobre os demais, da mesma forma que tem responsabilidade aquele que “acolhe” a mãe de um indivíduo portador de deficiências dizendo que ele é assim porque cometeu suicídio na vida passada e que, por isso, a afasta.

Portanto, não, o Espiritismo não pode jamais ser misturado a movimentos políticos quaisquer.

Para terminar, lembremos

Allan Kardec que, na Revista Espírita de Fevereiro de 1862, faz um alerta:

“Devo ainda chamar a atenção para outra tática de nossos adversários: a de procurar comprometer os espiritas, induzindo-os a se afastarem do verdadeiro objetivo da Doutrina, que é o da moral (grifo nosso), para abordarem questões que não são de sua competência e que poderiam, com toda razão, despertar suscetibilidade e desconfianças.

Também não vos deixeis cair nessa armadilha; afastai cuidadosamente de vossas reuniões tudo quanto disser respeito à política e às questões irritantes, nesse caso, as discussões não levarão a nada e apenas suscitarão embaraços, enquanto ninguém questionará a moral, quando eia for boa.

Procurai no Espiritismo aquilo que vos pode melhorar; eis o essencial. Quando os homens forem melhores, as reformas sociais verdadeiramente uteis serão uma consequência natural”.




Espiritismo e Saúde Mental

Hoje, 10 de outubro, é Dia Internacional da Saúde Mental. E, como assunto de tal importância, não poderíamos deixá-lo passar em branco.

Iniciamos afirmando que, por ser de extrema importância,  os menores sinais de inquietação e desequilíbrio, sejam eles de estresse descontrolado, melancolia/depressividade e outros transtornos, deveriam sempre motivar a busca por um acompanhamento psicológico profissional. Muitas de nossas inquietações partem não só de aspectos profundamente enraizados dentro de nós, mas também, muitas vezes, de desequilíbrios orgânicos. Somos Espíritos encarnados em um corpo, sendo que estes estão sujeitos às vicissitudes da matéria.

Isto colocado, avancemos para o aspecto espiritual de nossa saúde mental. Para nós, espíritas e, de forma global, para todo espiritualista, o cérebro não é apenas um reflexo químico e orgânico, mas é, antes, o órgão de expressão do Espírito, embora abafado em sua face real. Assim sendo, o Espírito – ou a alma – é quem preside à vontade, às escolhas e, numa palavra, ao livre-arbítrio.

Reconhecendo-nos, portanto, numa espécie de dualidade entre Espírito e matéria, compreendemos que todo tratamento que aborde a mente deveria abordar o indivíduo de forma holística, ou seja, integral, integrando corpo e Espírito. É claro que um bom acompanhamento psicológico profissional muito fará nesse sentido, mas não podemos negar que, ao abarcar a esfera espiritual existente, o tratamento sempre trará muito mais proveito nesse sentido.

O que estamos aqui tentando fazer é demonstrar que, em se tratando de saúde mental, não podemos ver tudo apenas pelo aspecto espiritual – sobretudo a respeito das prováveis obsessões espirituais – mas também pelo aspecto orgânico e fisiológico da questão. Por exemplo: podemos pensar que uma pessoa que vive estressada e que tenha eventos de descontrole emocional esteja sendo vítima de uma obsessão espiritual, quando, porém, ela apenas tem sintomas de pré-diabetes, o que lhe causa hipoglicemia, que leva a tais descontroles.

Não podemos, portanto, como espíritas, no acolhimento de quem e onde quer que seja tratar tudo como se fosse “problema espiritual”, o que seria muita irresponsabilidade. É sempre importante investigar o que se passa com o indivíduo, buscando saber se está fazendo acompanhamento psicológico, se está se tratando e, se não estiver, buscar encaminhar o irmão para tal tratamento.

Por outro lado, é importante destacar, sim, que o Espiritismo apresenta uma faceta importantíssima nesse aspecto, à medida que esclarece o indivíduo sobre as razões das dificuldades da vida e sobre a nossa relação constante com o mundo espiritual à nossa volta. Ora, quantos casos de loucura não se iniciam, também, por uma mente aberta e invigilante aos pensamentos de Espíritos da terceira ordem? Quantas vezes não somos alimentados, por conta de nossas imperfeições, nos mais sutis processos de alienação mental que, lentamente, vão nos provocando manias, medos e distúrbios variados?

Posto que somos Espíritos encarnados em um corpo e que quem comanda a nossa vontade é nosso Espírito, é claro que a raiz de todos os nossos problemas estará sempre no Espírito – mesmo no caso do pré-diabético, já que é por um mau hábito na alimentação, provocado por “seu Espírito”, que tal mal se instalou. Portanto, nesse sentido também, quanto mais o Espírito entende dos dispositivos e dos propósitos da vida, da necessidade da correção de suas imperfeições, do benefício da oração sobre a mente e do fato da associação mental, com encarnados e com desencarnados, segundo nossas inclinações mentais, mais lhe será fácil se manter mais equilibrado mentalmente.

Mas, e no caso de um processo de desequilíbrio já instalado? Aqui, como já dissemos, em primeira instância não podemos dispensar o tratamento psicológico profissional. Isso é imprescindível. Em segundo lugar, através do Espiritismo e do Magnetismo, podemos oferecer também um tratamento muito proveitoso:

  • Através da oração, buscar auxiliar o encarnado e os possíveis desencarnados na melhoria de seu campo mental;
  • Através do passe magnético, que pode ser feito inclusive pelos familiares, podemos buscar auxiliar diminuir os distúrbios e reflexos de tais desequilíbrios;
  • Afinal, porém, não podemos nos esquecer que o indivíduo que está passando por um grave distúrbio mental, como é o caso da esquizofrenia, pode ter uma necessidade em vivenciá-lo, fazendo mesmo parte de um planejamento reencarnatório, por razões como, por exemplo, fazê-lo se desligar um pouco de processos mentais antigos, que muito o afligem. Portanto, orar e buscar ajudar sempre, com fé, mas não esmorecendo ante à não cessação completa da doença.

Finalizando o assunto, gostaríamos de destacar que diferenciar os distúrbios patológicos dos casos de obsessão mediúnica é sempre muito importante, visto, como Kardec já identificou àquela época, que no último caso a medicação pode ser até prejudicial:

Não confundamos a loucura patológica com a obsessão; esta não provém de lesão alguma cerebral, mas da subjugação que Espíritos malévolos exercem sobre certos indivíduos, e que, muitas vezes, tem as aparências da loucura propriamente dita. Esta afecção, muito frequente, é independente de qualquer crença no Espiritismo e existiu em todos os tempos. Neste caso, a medicação comum é impotente e mesmo prejudicial.

Allan Kardec – O que é o Espiritismo? 

Também não poderíamos de deixar de citar, aqui, na íntegra, o texto “O suicídio e a loucura”, de Allan Kardec, no cap. V do Evangelho Segundo o Espiritismo:

14. A calma e a resignação hauridas da maneira de considerar a vida terrestre e da confiança no futuro dão ao espírito uma serenidade que é o melhor preservativo contra a loucura e o suicídio. Com efeito, é certo que a maioria dos casos de loucura se deve à comoção produzida pelas vicissitudes que o homem não tem a coragem de suportar. Ora, se encarando as coisas deste mundo da maneira por que o Espiritismo faz que ele as considere, o homem recebe com indiferença, mesmo com alegria, os reveses e as decepções que o houveram desesperado noutras circunstâncias, evidente se torna que essa força, que o coloca acima dos acontecimentos, lhe preserva de abalos a razão, os quais, se não fora isso, a conturbariam.

15. O mesmo ocorre com o suicídio. Postos de lado os que se dão em estado de embriaguez e de loucura, aos quais se pode chamar de inconscientes, é incontestável que tem ele sempre por causa um descontentamento, quaisquer que sejam os motivos particulares que se lhe apontem. Ora, aquele que está certo de que só é desventurado por um dia e que melhores serão os dias que hão de vir, enche-se facilmente de paciência. Só se desespera quando nenhum termo divisa para os seus sofrimentos. E que é a vida humana, com relação à eternidade, senão bem menos que um dia? Mas, para o que não crê na eternidade e julga que com a vida tudo se acaba, se os infortúnios e as aflições o acabrunham, unicamente na morte vê uma solução para as suas amarguras. Nada esperando, acha muito natural, muito lógico mesmo, abreviar pelo suicídio as suas misérias.

16. A incredulidade, a simples dúvida sobre o futuro, as ideias materialistas, numa palavra, são os maiores incitantes ao suicídio; ocasionam a covardia moral. Quando homens de ciência, apoiados na autoridade do seu saber, se esforçam por provar aos que os ouvem ou leem que estes nada têm a esperar depois da morte, não estão de fato levando-os a deduzir que, se são desgraçados, coisa melhor não lhes resta senão se matarem? Que lhes poderiam dizer para desviá-los dessa consequência? Que compensação lhes podem oferecer? Que esperança lhes podem dar? Nenhuma, a não ser o nada. Daí se deve concluir que, se o nada é o único remédio heroico, a única perspectiva, mais vale buscá-lo imediatamente e não mais tarde, para sofrer por menos tempo.
A propagação das doutrinas materialistas é, pois, o veneno que inocula a ideia do suicídio na maioria dos que se suicidam, e os que se constituem apóstolos de semelhantes doutrinas assumem tremenda responsabilidade. Com o Espiritismo, tornada impossível a dúvida, muda o aspecto da vida. O crente sabe que a existência se prolonga indefinidamente para lá do túmulo, mas em condições muito diversas; donde a paciência e a resignação que o afastam muito naturalmente de pensar no suicídio; donde, em suma, a coragem moral.

17. O Espiritismo ainda produz, sob esse aspecto, outro resultado igualmente positivo e talvez mais decisivo. Apresenta-nos os próprios suicidas a informar-nos da situação desgraçada em que se encontram e a provar que ninguém viola impunemente a lei de Deus, que proíbe ao homem encurtar a sua vida. Entre os suicidas, alguns há cujos sofrimentos, nem por serem temporários e não eternos, não são menos terríveis e de natureza a fazer refletir os que porventura pensam em daqui sair, antes que Deus o haja ordenado. O espírita tem, assim, vários motivos a contra por à ideia do suicídio: a certeza de uma vida futura, em que, sabe-o ele, será tanto mais ditoso, quanto mais inditoso e resignado haja sido na Terra: a certeza de que, abreviando seus dias, chega, precisamente, a resultado oposto ao que esperava; que se liberta de um mal, para incorrer num mal pior, mais longo e mais terrível; que se engana, imaginando que, com o matar-se, vai mais depressa para o céu; que o suicídio é um obstáculo a que no outro mundo ele se reúna aos que foram objeto de suas afeições e aos quais esperava encontrar; donde a consequência de que o suicídio, só lhe trazendo decepções, é contrário aos seus próprios interesses. Por isso mesmo, considerável já é o número dos que têm sido, pelo Espiritismo, obstados de suicidar-se, podendo daí concluir-se que, quando todos os homens forem espíritas, deixará de haver suicídios conscientes. Comparando-se, então, os resultados que as doutrinas materialistas produzem com os que decorrem da Doutrina Espírita, somente do ponto de vista do suicídio, forçoso será reconhecer que, enquanto a lógica das primeiras a ele conduz, a da outra o evita, fato que a experiência confirma.