Lugares assombrados – O Livro dos Médiuns

Este artigo traz, na íntegra, o capítulo de O Livro dos Médiuns que trata sobre os lugares assombrados. Ele é excelente e claro por si só, de forma que não verificamos ser necessário tecer maiores comentários.

O artigo em questão foi suscitado pelo tema das Spirit Box, tratado no artigo homônimo e em vídeo recente.

O Livro dos Médiuns — Segunda parte — Das manifestações espíritas > Capítulo IX — Dos lugares assombrados

  1. As manifestações espontâneas, que em todos os tempos se hão produzido, e a persistência de alguns Espíritos em darem mostras ostensivas de sua presença em certas localidades, constituem a fonte de origem da crença na existência de lugares mal-assombrados. As respostas que se seguem foram dadas a perguntas feitas sobre este assunto:

1.ª. Os Espíritos se apegam unicamente às pessoas, ou também às coisas?

“Depende da elevação deles. Alguns Espíritos podem apegar-se aos objetos terrenos. Os avarentos, por exemplo, que esconderam seus tesouros e que ainda não estão bastante desmaterializados, muitas vezes se obstinam em vigiá-los e montar-lhes guarda.”

2.ª. Têm os Espíritos errantes ((Espírito errante é o Espírito entre uma vida e outra)) lugares de sua predileção?

“O princípio ainda é aqui o mesmo. Os Espíritos que já se não acham apegados à Terra vão para onde se lhes oferece ensejo de praticar o amor. São atraídos mais pelas pessoas do que pelos objetos materiais. Contudo, pode dar-se que dentre eles alguns tenham, durante certo tempo, preferência por determinados lugares. Esses, porém, são sempre Espíritos inferiores.”

3.ª. O apego dos Espíritos a uma localidade, sendo sinal de inferioridade, constituirá igualmente prova de serem eles maus?

“Certamente que não. Pode um Espírito ser pouco adiantado, sem que por isso seja mau. Não se observa o mesmo entre os homens?”

4.ª. Tem qualquer fundamento a crença de que os Espíritos frequentam de preferência as ruínas?

“Nenhum. Os Espíritos vão a tais lugares, como a todos os outros. A imaginação dos homens é que, despertada pelo aspecto lúgubre de certos sítios, atribui à presença dos Espíritos o que não passa, quase sempre, de efeito muito natural. Quantas vezes o medo não tem feito que se tome por fantasma a sombra de uma árvore e por espectros o grito de um animal, ou o sopro do vento? Os Espíritos gostam da presença dos homens; daí o preferirem os lugares habitados, aos lugares desertos.”

a) Contudo, pelo que sabemos da diversidade dos caracteres entre os Espíritos, podemos inferir a existência de Espíritos misantropos, que prefiram a solidão.

“Por isso mesmo não respondi de modo absoluto à questão. Disse que eles podem vir aos lugares desertos, como a toda parte. É evidente que, se alguns se conservam insulados, é porque assim lhes apraz. Isso, porém, não constitui motivo para que forçosamente tenham predileção pelas ruínas. Em muito maior número os há nas cidades e nos palácios, do que no interior dos bosques.”

5.ª. Em geral, as crenças populares guardam um fundo de verdade. Qual terá sido a origem da crença em lugares mal-assombrados?

“O fundo de verdade está na manifestação dos Espíritos, na qual o homem instintivamente acreditou desde todos os tempos. Mas, conforme disse acima, o aspecto lúgubre de certos lugares lhe fere a imaginação e esta o leva naturalmente a colocar nesses lugares os seres que ele considera sobrenaturais. Demais, a entreter essa crença supersticiosa, aí estão as narrativas poéticas e os contos fantásticos com que o acalentam na infância.”

6.ª. Há, para os Espíritos que costumam reunir-se, dias e horas em que prefiram fazê-lo?

“Não. Os dias e as horas são medidas de tempo para uso dos homens e para a vida corpórea, das quais os Espíritos nenhuma necessidade sentem e nenhum caso fazem.”

7ª Donde nasceu a ideia de que os Espíritos vêm preferencialmente durante a noite?

“Da impressão que o silêncio e a obscuridade produzem na imaginação. Todas essas crenças são superstições que o conhecimento racional do Espiritismo destruirá. O mesmo se dá com os dias e as horas que muitos julgam lhes serem mais favoráveis. Fica certo de que a influência da meia-noite nunca existiu, senão nos contos.”

a) Sendo assim, por que é então que alguns Espíritos anunciam sua vinda e suas manifestações para certos e determinados dias, como a sexta-feira, por exemplo?

“Isso fazem Espíritos que aproveitam a credulidade dos homens para se divertirem. Pela mesma razão, há os que se dizem o diabo, ou dão a si mesmos nomes infernais. Mostrai-lhes que não vos deixais enganar e não mais voltarão.”

8.ª. Preferem os Espíritos frequentar os túmulos onde repousam seus corpos?

“O corpo era uma simples vestimenta. Do mesmo modo que o prisioneiro nenhuma atração sente pelas correntes que o prendem, os Espíritos nenhuma experimentam pelo envoltório que os fez sofrer. A lembrança das pessoas que lhes são caras é a única coisa que para eles tem valor.”

a) São-lhes mais agradáveis, do que quaisquer outras, as preces que por eles se façam junto dos túmulos de seus corpos?

“A prece, bem o sabes, é uma evocação que atrai os Espíritos. Tanto maior ação terá, quanto mais fervorosa e sincera for. Ora, junto de um túmulo venerado, sempre se está em maior recolhimento, do que algures, e a conservação de estimadas relíquias é em testemunho de afeição dado ao Espírito e que nunca deixa de o sensibilizar. O que atua sobre o Espírito é sempre o pensamento e não os objetos materiais. Mais influência, do que sobre o Espírito, exercem esses objetos sobre aquele que ora, porque lhe fixam a atenção.”

9.ª. A vista disso, parece que não se deve considerar absolutamente falsa a crença em lugares mal-assombrados?

“Dissemos que certos Espíritos podem sentir-se atraídos por coisas materiais. Podem sê-lo por determinados lugares, onde parecem estabelecer domicílio, até que desapareçam as circunstâncias que os faziam buscar esses lugares.”

a) Que circunstâncias podem induzi-los a buscar tais lugares?

“A simpatia por algumas das pessoas que os frequentam, ou o desejo de com elas se comunicarem. Entretanto, nem sempre os animam intenções louváveis. Quando são Espíritos maus, podem pretender tirar vingança de pessoas de quem guardam queixas. A permanência em determinado lugar também pode ser, para alguns, uma punição que lhes é infligida, sobretudo se ali cometeram um crime, a fim de que o tenham constantemente diante dos olhos*.”

10.ª. Os lugares assombrados sempre o são por antigos habitantes deles?

“Sempre, não; — às vezes, porquanto, se o antigo habitante de um desses lugares é Espírito elevado, tão pouco se preocupará com a sua habitação terrena, quanto com o seu corpo. Os Espíritos que assombram certos lugares muitas vezes não têm, para assim procederem, outro motivo que não simples capricho, a menos que para lá sejam atraídos pela simpatia que lhes inspirem determinadas pessoas.”

a) Podem estabelecer-se num lugar desses com o fito de protegerem uma pessoa, ou a própria família?

“Certamente, se forem Espíritos bons; porém, neste caso, nunca manifestam sua presença por meios desagradáveis.”

11.ª. Haverá alguma coisa de real na história da Dama Branca?

“Mero conto, extraído de mil fatos verdadeiros.”

12.ª. Será racional temerem-se os lugares assombrados pelos Espíritos?

“Não. Os Espíritos que frequentam certos lugares, produzindo neles desordens, antes querem divertir-se à custa da credulidade e da poltronaria dos homens, do que lhes fazer mal. Aliás, deveis lembrar-vos de que em toda parte há Espíritos e de que, assim, onde quer que estejais, os tereis ao vosso lado, ainda mesmo nas mais tranquilas habitações. Quase sempre, eles só assombram certas casas, porque encontram ensejo de manifestarem sua presença nelas.”

13.ª. Haverá meios de os expulsar?

“Há; o que as mais das vezes fazem para isso, porém, os atrai, em vez de os afastar. O melhor meio de expulsar os maus Espíritos consiste em atrair os bons. Atraí, pois, os bons Espíritos, praticando todo o bem que puderdes, e os maus desaparecerão, visto que o bem e o mal são incompatíveis. Sede sempre bons e somente bons Espíritos tereis junto de vós.”

a) Há, no entanto, pessoas muito bondosas que vivem às voltas com as tropelias dos maus Espíritos. Por quê?

“Se essas pessoas são realmente boas, isso acontece talvez como prova, para lhes exercitar a paciência e concitá-las a se tornarem ainda melhores. Fica certo, porém, de que não são os que continuamente falam das virtudes os que mais as possuem. Aquele que é possuidor de qualidades reais quase sempre o ignora, ou delas nunca fala.”

14.ª. Que se deve pensar com relação à eficácia dos exorcismos, para expelir dos lugares mal-assombrados os maus Espíritos?

“Já tiveste ocasião de verificar a eficácia desse processo? Não tens visto, ao contrário, as tropelias redobrarem de intensidade, depois das cerimônias do exorcismo? É que os Espíritos que as causam se divertem com o serem tomados pelo diabo.

“Também, os que se não apresentam com intenções malévolas podem manifestar sua presença por meio de ruídos e até tornando-se visíveis, mas nunca praticam desordens, nem incômodos. São, frequentemente, Espíritos sofredores, cujos sofrimentos podeis aliviar orando por eles. Outras vezes, são mesmo Espíritos benfazejos, que vos querem provar estarem junto de vós, ou, então, Espíritos levianos que brincam. Como quase sempre os que perturbam o repouso são Espíritos que se divertem, o que de melhor têm a fazer, os que se veem perseguidos, é rir do que lhes sucede. Os perturbadores se cansam, verificando que não conseguem meter medo, nem impacientar.” (Veja-se atrás o capítulo V: Das manifestações espontâneas.)

Resulta das explicações acima haver Espíritos que se prendem a certos lugares, preferindo permanecer neles, sem que, entretanto, tenham necessidade de manifestar sua presença por meio de efeitos sensíveis. Qualquer lugar pode constituir morada obrigatória, ou predileta de um Espírito, embora mau, sem que jamais qualquer manifestação se produza. Os que se prendem a certas localidades, ou a certas coisas materiais, nunca são Espíritos superiores. Contudo, mesmo que não pertençam a esta categoria, pode dar-se que não sejam maus e nenhuma intenção má alimentem. Não raro, são até comensais mais úteis do que prejudiciais, porquanto, desde que se interessam pelas pessoas, podem protegê-las.

  • Veja-se Revue spirite, de fevereiro de 1860: “História de um danado”.



Médiuns: Espíritos endividados?

Mais uma ideia que reina no meio Espírita: médiuns seriam Espíritos endividados que nascem para resgatar dívidas de vidas passadas.

Eu gostaria que as pessoas que repetem essas ideias apresentassem onde essa ela consta na obra de Allan Kardec. Será uma tarefa árdua, pois não encontrarão. A mediunidade é uma escolha, muitas vezes visando levar o indivíduo ao estudo do Espiritismo, mas muitos acabam tropeçando pelos caminhos da vaidade e do orgulho e desperdiçam essa oportunidade.

Essa ideia é oriunda das falsas ideias ligadas ao carma, como sempre. Já tratamos disso diversas vezes.

Não temos muito a falar sobre isso, porque a ideia é facilmente superada. Apenas queremos dizer que, para ser bom médium, é importante saber lidar bem com essa verdadeira ciência que nos permite comunicarmo-nos com os Espíritos. Os estudos de Allan Kardec, organizados pelo Espírito de Verdade, deram a base dessa ciência e foram os únicos a abordarem, com metodologia científica, os fenômenos mediúnicos. Não deixem esse estudo de lado se quiserem ser realmente úteis.




Ramatis e o degredo planetário

É preciso tomar muito cuidado. Não é que fora de Kardec não exista verdade: é que, sem método científico na comunicação com os Espíritos, admitem-se mentiras, ilusões e verdades, cega e indiscriminadamente.

É muito patente observar que Ramatis (ou todo Espírito que se identifica com esse nome) transmite absurdos racionais e científicos, tendo muitos deles já sido desmentidos pela ciência elementar.

Esses Espíritos partem da ideia errada da queda pelo pecado, e, assim, ensinam, por acreditarem ou por vontade de mistificar, falsas ideias ligadas a um Deus punidor, que castiga o erro. É exatamente o princípio dos erros das religiões e, nesse sentido, aí não há nada de Espiritismo – basta estudar O Céu e o Inferno, A Gênese e a Revista Espírita, de 1858 a 1869, para certificar-se disso.

Por meio de um médium, pode falar qualquer Espírito. Se, do nosso lado, acreditamos cegamente, seremos facilmente fascinados por Espíritos mistificadores.

Leia o artigo “O papel do pesquisador e do médium nas comunicações com os Espíritos“.




O Canal Espírita e o Espiritismo

O “Canal Espírita”, do Luiz Fernando Amaral, no Youtube, é um canal que já abarca quase oitocentos mil seguidores, com milhares de visualizações. Por seu tamanho e pela expressividade que ele tem nesse meio, é preocupante ver, por ali, a circulação e a divulgação de certas ideias até mesmo contrárias à Doutrina Espírita.

De forma alguma duvido das boas intenções do Luiz Fernando. Só não entendo o porquê da resistência em estudar e divulgar o Espiritismo como ele realmente seja, já que esse conhecimento nos ajuda a errarmos menos e sermos mais úteis.

Ao deixar Kardec, deixamos de lado os esforços do próprio Espírito de Verdade

Muitos não pensam que, ao deixarem Kardec de lado para ficarem com “novidades” não provenientes do método científico, deixam de lado os esforços de Espíritos superiores e do próprio Espírito de Verdade, quem coordenou a iniciativa do nascimento da Doutrina Espírita. Não se trata da opinião de um homem, mas do Consolador prometido por Jesus. Kardec não terminou em sua posição por acaso: foi planejado por um esforço superior. O método por ele desenvolvido — a concordância universal submetida ao critério da razão — é necessário e não pode ser abandonado!

Ora, queremos tratar o Espiritismo como algo menor? Como um “esforçosinho” de menor importância, superado pelas meras ideias de qualquer um que venha dar a sua opinião? Ora, espíritas, botemos a mão na consciência!

Não sou da opinião, porque não é um fato, de que o Espiritismo tenha sido encerrado com Kardec; contudo, por se tratar de uma ciência, para ser continuado, carece necessariamente do método científico, de forma que não podemos simplesmente aceitar ideias e comunicações quaisquer como se fossem verdeiras, não importa por qual médium sejam dadas ou qual nome o Espírito apresente.

Da mesma forma, não podemos simplesmente descartar comunicações dos Espíritos fora da codificação. Uma vez mais: precisamos de método científico e racional, e não apenas de aceitação ou negação cegas.

Falsas ideias, oriundas de opiniões isoladas

O Luiz Fernando, no Canal Espírita, dentre alguns vídeos em que retorna a Kardec, frequentemente faz vídeos divulgando e reforçando falsas ideias que se infiltraram no meio Espírita. Contamos, dentre elas, aquelas ligadas ao karma ou mesmo ao “exílio” de Espíritos, além das ideias ligadas ao Umbral, psicografias genéricas não verificadas, colônias espirituais de animais, etc. Ideias que o estudo do Espiritismo rapidamente demonstra como incertas ou enganosas. E qual é o problema disso?

O problema é que, lenta e persistentemente, as ideias aceitas cegamente vão minando o Espiritismo e atrapalhando cada vez mais seu progresso e seu real potencial de alavancar a humanidade. Por falta de conhecimento e de compromisso com a ciência nascida dos esforços de Espíritos elevados, mas também por apego às ideias nascidas nos romances, permite-se que Espíritos pouco inferiores, ou mesmo imperfeitos, espalhem suas ideias danosas no meio Espírita.

Allan Kardec foi enfático em demonstrar, como resultado de seus longos anos de estudos, que os Espíritos, após deixarem o corpo, continuam sendo quem eram. Muitos, a grande maioria, continuam carregando falsas ideias e apegos. Não ganham a plena ciência sobre o mundo dos Espíritos simplesmente por deixarem o corpo. Outros são inimigos declarados do Espiritismo, porque encontram nele a demolição das ideias às quais se apegam, por ignorância. Esse é o motivo de muitos deles apresentarem ideias contrárias àquilo que ficou demonstrado pelo estudo de milhares de evocações e comunicações de milhares de Espíritos, por milhares de médiuns, por toda parte.

Relutância em estudar

Mas o Luiz Fernando, no Canal Espírita, infelizmente parece escolher apenas relutar, e digo isso pela forma com que já me respondeu ao destacar incongruências entre o Espiritismo e certas ideias por ele divulgadas, nascidas de opiniões isoladas. Recentemente, gravou um vídeo criticando quem recomende voltar a Kardec, porque parece lhe ser mais agradável divulgar ideias nascidas de romances e supostas psicografias não verificadas. Ao invés de decidir abrir a Revista Espírita e estudar, escolhe rebater afetadamente as críticas aos seus vídeos com ideias contrárias ao Espiritismo e se arvora sob a ideia de que, sendo médium, estaria sendo guiado por bons Espíritos apenas. Além disso, tenta formar a ideia de que criticá-lo é dar azo a “baixas vibrações”.

Sim, nós precisamos retomar o desenvolvimento da ciência espírita. Mas, para isso, precisamos primeiramente retomá-la como ciência, compreendendo seus princípios e seus métodos, desenvolvidos às custas da saúde e dos recursos de Kardec, por anos a fio. Hoje, pela renitência em estudar, erra-se nas coisas mais pífias, mais absurdas, enquanto tão simples seriam de serem evitadas com um estudo mais cuidadoso do Espiritismo.

Uma vez mais, recomendamos a todos que voltem a estudar a Revista Espírita e as demais obras de Kardec, principalmente quando se fala para muitos. Mesmo estudando, às vezes erramos, mas ao menos não teremos nossa consciência nos acusando de não termos procurado conhecer o conhecimento que insistentemente nos batia à porta e que, hoje, está a três cliques de distância.

Desejo que o colega seja tocado em sua consciência o quanto antes. Tem um potencial gigantesco em seu canal. Só falta utilizar desse potencial para espalhar o Espiritismo de verdade, afastado das falsas ideias. Além disso, espero que ele deixe de levar essas questões para o lado pessoal, principalmente quando se trata de uma ciência. Eu mesmo recebo muitas críticas e mesmo agradeço por elas, pois são frequentes oportunidades de novamente consultar a consciência sobre o que eu faço, nunca me arvorando sob a ideia de que eu estaria isento de erros por acreditar que somente bons Espíritos estariam ao meu redor.

“Você quer fazer o bem, não duvido. Quer falar do Espiritismo, porque entende ser um conteúdo bom. Mas o Espiritismo que conhece é o dos romances, e não o original. Reproduz, assim, ideias nascidas das opiniões isoladas de certos Espíritos, muitas vezes incompletas, enganosas e até contrárias ao Espiritismo e à razão. O efeito é contrário: longe de ajudar as pessoas a subir degraus, muitas vezes as afasta da escada.

O Espiritismo existe nas obras de Kardec, bem descrito na Revista Espírita, e foi desenvolvido sobre método científico. Não foi concluído, mas, para ser desenvolvido, precisa do mesmo método.”

Paulo Degering R. Junior

Se os espíritas soubessem o que é o Centro Espírita, quais são realmente a sua função e a sua significação, o Espiritismo seria hoje o mais importante movimento cultural e espiritual da Terra. Temos no Brasil – e isso é um consenso universal – o maior, mais ativo e produtivo movimento espírita do planeta. A expansão do Espiritismo em nossa terra é incessante e prossegue em ritmo acelerado. Mas o que fazemos, em todo este vasto continente espírita, é um imenso esforço de igrejificar o Espiritismo, de emparelhá-­lo com as religiões decadentes e ultrapassadas, formando por toda parte núcleos místicos e, portanto, fanáticos, desligados da realidade imediata.

José Herculano Pires — O Centro Espírita

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O Céu e o Inferno e a esdrúxula campanha do CSI do Espiritismo e do Portal Luz Espírita

O portal Luz Espírita, sustentado por pesquisas enviesadas de Carlos Seth e outros, continua fazendo uma “campanha esdrúxula” ((Tomo a liberdade de utilizar o mesmo termo usado por eles contra quem eles discordam)) contra aqueles que concluem diferentemente deles, baseados em pilhas de evidências que eles escolhem desconsiderar. Notório dizer que, “do lado de cá”, longe de descartarmos as evidências por eles encontradas, apenas verificamos que elas não provam a impossibilidade de que as adulterações tenham ocorrido. Tudo o que eles têm são evidências de que Kardec havia iniciado a produção de novas edições de O Céu e o Inferno e A Gênese, mas não que ele as tenha concluído nem que as obras impressas após sua morte não tenham sofrido alterações. Além disso, não fazem o principal: explicar as diferenças absurdas, não anunciadas e mesmo contraditórias entre uma edição e outra.

A questão é que não desejamos obter o monopólio do bom-senso e da verdade, coisa que eles insistem em fazer, sem que tentem fazer o que mais importa: explicar o motivo das diferenças grotescas entre as edições em questão. Colocamos, por exemplo, algumas diferenças entre a quarta edição de O Céu e o Inferno, registrada após a morte de Kardec, e a terceira edição (igual à primeira). Respectivamente:

Quarta edição de O Céu e o Inferno

Registrada após a morte de Kardec.

  • Capítulo VIII tornou-se capítulo VII;
  • Removeu-se a maior parte da retórica filosófica com a qual Kardec abria o capítulo
  • O título “As penas futuras segundo o Espiritismo” tornou-se “Código penal da vida futura“.

7.º — O Espírito sofre pelo próprio mal que fez, de maneira que sua atenção estando incessantemente concentrada nas consequências desse mal, ele compreenda melhor seus inconvenientes e seja motivado a corrigir-se.

8.º — Sendo a justiça de Deus infinita, é mantida uma conta rigorosa do bem e do mal; se não há uma única má ação, um único mau pensamento que não tenha suas consequências fatais, não há uma única boa ação, um único bom movimento da alma, o mais leve mérito, numa palavra, que seja perdido, mesmo nos mais perversos, porque é um começo de progresso.

9.º — Toda falta cometida, todo mal realizado, é uma dívida contraída que deve ser paga; se não o for numa existência, sê-lo-á na seguinte ou nas seguintes, porque todas as existências são solidárias umas das outras. Aquele que a quita na existência presente não terá de pagar uma segunda vez.

10.º — O Espírito sofre a pena de suas imperfeições, seja no mundo espiritual, seja no mundo corporal. Todas as misérias, todas as vicissitudes que suportamos na vida corporal são decorrentes de nossas imperfeições, expiações de faltas cometidas, seja na existência presente, seja nas precedentes.

O Céu e o Inferno, 4.ª edição.

O item 10 é, talvez, a maior prova da adulteração (clique para ler o artigo).

Terceira edição de O Céu e o Inferno

Publicada e registrada por Allan Kardec.

Capítulo VIII — As penas futuras segundo o Espiritismo

7. Sendo a justiça de Deus infinita, é mantida uma conta rigorosa do bem e do mal; se não há uma única má ação, um único mau pensamento que não tenha suas consequências fatais, não há uma única boa ação, nem um único bom movimento da alma — em suma, o mais singelo mérito — que seja perdido, mesmo nos mais perversos, porque é um começo de progresso.

8. A duração do castigo está subordinada ao aperfeiçoamento do espírito culpado. Nenhuma condenação por um tempo determinado é pronunciada contra ele. O que Deus exige para pôr fim aos sofrimentos é o arrependimento, a expiação e a reparação — em resumo: um aperfeiçoamento sério, efetivo, assim como um retorno sincero ao bem.

O espírito é, assim, sempre o árbitro de seu próprio destino; ele pode prolongar seus sofrimentos por seu endurecimento no mal, aliviá-los ou abreviá-los por seus esforços para fazer o bem. Uma condenação por um tempo determinado qualquer teria o duplo inconveniente de ou continuar a atingir o espírito que se houvesse aperfeiçoado, ou cessar quando ele ainda estivesse no mal. Deus, que é justo, pune o mal enquanto este existe; e encerra a punição quando o mal não existe mais. Assim se acha confirmada esta expressão: Eu não quero a morte do pecador, mas que ele viva, e eu o acusarei ATÉ QUE ELE SE ARREPENDA.

9. Estando a duração do castigo subordinada ao arrependimento, resulta daí que o espírito culpado que não se arrependesse e jamais se aperfeiçoasse sofreria sempre, e que, para ele, a pena seria eterna. A eternidade das penas deve então ser entendida no sentido relativo, e não no sentido absoluto.

O Céu e o Inferno, 1.ª a 3.ª edições.

Podemos notar uma diferença gritante entre as edições. Da mesma forma, a quinta edição de A Gênese contém alterações inexplicáveis entre a edição publicada por Allan Kardec e a edição registrada quase três anos após sua morte.

Não poupamos esforços

Já abordamos o tema várias vezes. Aqueles mencionados anteriormente não poupam palavras e termos depreciativos para tentar lançar descrédito por aqueles que concluem diferentemente deles. Nós, portanto, fazemos a nossa parte, baseados em fartas evidências, e com a certeza de que a outra parte nunca se dedicou a ler e refletir com calma sobre todas elas. Não dizemos: “esta é a verdade final”, mas dizemos: “não se deixem guiar por quem tente tomar o monopólio da verdade”.

É interessante notar como os textos da outra parte são sempre apaixonados, isto é, carregam uma grande nota de emoção e de raiva ou inveja aparentes. Isso já denota uma urgência por provocar a crença por outros meios, que não os da razão. Aliás, nesse afã de dominar a verdade, Carlos Seth já cometeu gafes tão banais como querer dizer que falar em Espiritualismo Racional seria trazer uma divisão para o meio espírita.

É ainda mais interessante notar que eles nunca mencionam o nome de Paulo Henrique de Figueiredo, nem trazem suas evidências e seus argumentos para a discussão. Apenas se limitam a dizer que eles já refutaram tudo — ao que discordamos profundamente. Fazem o mesmo com a Simoni Privato, embora ainda citem seu nome.

Bem, sem buscar prolongar esse assunto de maneira cansativa, agradecemos sempre a livre propaganda que eles mesmos fazem contra as ideias que não podem aceitar.




A “Casa plataforma de oração” e o Espiritismo

Não é de meu costume abordar nomeadamente grupos ou indivíduos. Neste caso, em relação ao grupo “Casa Plataforma de Oração”, penso que isso se faz indispensável, já que se utiliza do nome do Espiritismo.

Quero começar relembrando que a mediunidade não é exclusividade de nenhuma religião, nem do Espiritismo. Todo mundo pode praticá-la, bem ou mal. O problema é quando se coloca de lado uma ciência e seus conhecimentos, obtidos com árduo trabalho de investigação, enquanto, levianamente, utiliza-se do nome e dos termos dessa ciência para se dar credibilidade. Pasmem: o principal personagem dessa seita diz ser o próprio Kardec e constantemente se compara a Jesus, rebaixando o Mestre ao nível de um relés homem mundano.

Mais grave ainda é quando, colocando de lado essa ciência, mas utilizando-se de seu nome, se permite enganar e ser enganado justamente pelos erros que seriam evitados pelo conhecimento real que ela traz.

O Espiritismo, bem sabemos pelos nossos estudos, não lança anátema. Antes diz: a cada um segundo suas obras. Aliás, de forma alguma venho julgar as intenções desse grupo, que podem ser louváveis… Mas penso que nos compete pontuar e defender o Espiritismo quando outros lançam falsas ideias em seu nome.

O que infelizmente vemos, no canal do grupo citado, é um grande perigo que eles mesmos correm: médiuns que se entregaram à crença cega no que dizem os Espíritos, se é que o dizem. Entregam-se à fascinação e à obsessão e levianamente, sem conhecimento, citam o Espiritismo, apenas para renegá-lo.

Não creio necessário retomarmos os inúmeros pontos onde a ciência espírita demonstrou os graves problemas nos quais as práticas ali adotadas os lançam. Temos alguns artigos que falam sobre isso, como O papel do pesquisador e do médium nas comunicações com os Espíritos, Obsedados e Subjugados — Os perigos do Espiritismo e A luta contra um Espírito obsessor.

Ali, no canal do grupo Casa Plataforma de Oração, vemos não apenas uma ação persistente de Espíritos que usam nomes veneráveis para lançar os mais completos absurdos, o que não deveria acontecer entre pessoas que estudam o Espiritismo. Vemos, também, a frequente referência ao Espiritismo, mas não como fontes de estudos.

Referem-se apenas em nome e termos, mas divulgam apenas ideias contrárias à Doutrina Espírita e atacam os defensores da ciência espírita, tachando-os de “espíritas engessados”, por demonstrarem que o Espiritismo desmente o que dizem.

A posição por eles adotadas é lamentável, muito mais para eles, que terão muito a expiar no futuro, mas também àqueles que os ouvem. Muitos neófitos podem cair em um de seus vídeos, crendo que falam em Espiritismo, e aceitando, assim, as coisas mais absurdas e mesmo danosas.

É apenas isso o que desejo destacar, adicionando: é uma pena que, ao invés de buscarem a mediunidade sadia, colocando-se a cooperar, escolhem eles mesmos caírem nos mais terríveis erros, tantas vezes encontrados por Kardec no estudo do Espiritismo. Chegam ao cúmulo de admitir as absurdas ideias que nasceram do livro “Cartas de Cristo”, onde chega-se a afirmar que Jesus, antes de “despertar” para a sua missão, teria sido um fanfarrão, beberrão e mulherengo. Mas não para aí: o principal “médium” ali chega se comparar a Jesus Cristo!

Que isto sirva de alerta àqueles que tenham dúvidas: ali, o que se pratica é mediunidade, praticada sem nenhum cuidado, e não o Espiritismo. Se o Espiritismo fosse presente, pelo estudo das obras de Kardec, nascidas da metodologia científica séria, não veríamos erros lastimáveis, ideias completamente absurdas e ataques à razão em suas reuniões, gravadas em vídeo.

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Reforma íntima e Espiritismo

Reina, no Movimento Espírita moderno, consideravelmente afastado do Espiritismo, a insistente ideia, quase impositiva, da realização de uma reforma íntima. Prega-se a necessidade de seguir o Evangelho, utilizando-se, para isso, das conhecidas reuniões de leitura familiar do Evangelho Segundo o Espiritismo, que quase sempre recomendam abrir aleatoriamente um livro que deveria ser estudado como as demais obras de Allan Kardec.

Eu não seria louco o suficiente para dizer que a reforma moral e os ensinamentos morais de Jesus não sejam importantes. Muito pelo contrário: são muito, e também não são poucas as vezes em que Kardec ou os Espíritos falam da importante reforma moral suscitada pelo Espiritismo, Doutrina essa capaz de, pelo raciocínio, instigar o ser humano a melhores resoluções. Não, esse não é o problema.

O que venho destacar é que existe uma falsa ideia reinando no Movimento, dentre tantas outras: a de que a Terra, sendo um planeta de provas e expiações, apenas receba Espíritos em expiações, ou seja, Espíritos com pendores passados. Isso não é verdadeiro, como demonstrarei a seguir.

Provas

Provas são todas as dificuldades que enfrentamos na vida, e que nem sempre são resultados de nossas escolhas. Podemos, por exemplo, viver em uma cidade em que, em determinado momento, uma represa próxima estoure, causando uma inundação e levando nossa casa ou nossa vida. Isso é uma prova que não desejávamos, mas que passaremos, porque faz parte das leis da matéria. Podemos, também, passar anos sendo medicados por um remédio que nos cause efeitos adversos e destrua nossa saúde. Isso também é uma prova, como seria a erupção de um vulcão adormecido, próximo de onde vivemos. Faz parte.

Às vezes, porém, atravessamos provas que resultam das nossas escolhas. Ainda aqui, às vezes o resultado é indireto ou involuntário: podemos escolher praticar um ato que dê resultados indesejados, nos causando uma prova.

Mas existem as provas que são diretamente frutos de nossas escolhas passadas, como Espíritos. Arrependidos de um desvio moral, escolhemos um certo gênero de provas e de oportunidades que nos darão a chance de enfrentar e corrigir esse desvio. Aqui sim caberia o termo “Reforma íntima”, segundo o entendimento do Espiritismo. E aqui está a chave do problema: nem todos desenvolveram imperfeições no passado, e nem todos, no momento em que vivemos, estão passando por expiações.

121. Por que é que alguns Espíritos seguiram o caminho do bem e outros o do mal?

“Não têm eles o livre-arbítrio? Deus não criou Espíritos maus; criou-os simples e ignorantes, isto é, tendo tanta aptidão para o bem quanta para o mal. Os que são maus, assim se tornaram por vontade própria.”

O Livro dos Espíritos

Imperfeições

Imperfeição, segundo o que podemos depreender do estudo do Espiritismo, é tudo aquilo que nasce do livre exercício da vontade na repetição de um erro, criando uma imperfeição, o que demandará a expiação.

Somos criados todos simples e ignorantes, tendo todos as mesmas oportunidades de seguir o caminho adiante. Todos, nesse caminho, cometerão erros, porque é impossível não errar quando somos ignorantes. Quantas vezes erramos, tentando acertar? Contudo, nem todos se apegam aos erros, desenvolvendo imperfeições. Alguns aprendem como erro e rapidamente os superam.

133. Têm necessidade de encarnação os Espíritos que desde o princípio seguiram o caminho do bem?

“Todos são criados simples e ignorantes e se instruem nas lutas e tribulações da vida corporal. Deus, que é justo, não podia fazer felizes a uns, sem fadigas e trabalhos, conseguintemente sem mérito.”

a) — Mas, então, de que serve aos Espíritos terem seguido o caminho do bem, se isso não os isenta dos sofrimentos da vida corporal?

Chegam mais depressa ao fim. Ademais, as aflições da vida são muitas vezes a consequência da imperfeição do Espírito. Quanto menos imperfeições, tanto menos tormentos. Aquele que não é invejoso, nem ciumento, nem avaro, nem ambicioso, não sofrerá as torturas que se originam desses defeitos.”

O Livro dos Espíritos. Grifos nossos.

Note que Kardec entendeu, colocou em questão e não foi desmentido: existem aqueles que desde sempre seguiram o caminho do bem, o que não quer dizer que não erraram, mas apenas que não se apegaram ao erro.

Duvida do que eu digo? Que bom, quer dizer que está raciocinando. Mas, para raciocinar bem, é necessário ter base em algo. Sugiro, portanto, a leitura das questões 114 a 127 de O Livro dos Espíritos, além dessa exposta. Também não estou tirando tudo isso da minha cabeça, como destaco aqui.

Escala Espírita

Ademais, note que a Escala Espírita (100 a 113), que foi apenas um esboço classificatório proposto por Kardec, diz o seguinte dos Espíritos imperfeitos:

“101. Características gerais. – Predominância da matéria sobre o espírito. Propensão para o mal. Ignorância, orgulho, egoísmo e todas as paixões que lhes são consequentes.”

Ignorância, com certeza, posto que não é possível conhecer a lei divina, em realidade, e ainda assim praticar o mal. Isso seria retrogradar, o que o Espírito não faz. Mas note que, junto a isso, estão o orgulho, o egoísmo e todas as paixões que lhes são consequentes – imperfeições desenvolvidas pelo apego àquilo que satisfaz aos desejos materialistas.

Algo mais a destacar: note que Kardec classifica a primeira classe como “Primeira ordem – Espíritos puros”, e não como “Espíritos perfeitos”. Kardec não aborda uma “dualidade” entre Espíritos perfeitos e imperfeitos. E vimos, acima, que um Espírito pode, ao que tudo indica, ocupar a segunda classe desde o início – e, se você discordar, por favor, vamos dialogar.

Expiação

Expiação é algo que está bem definido em O Céu e o Inferno, em sua edição não adulterada, encontrada na Editora FEAL. Kardec definiu, como resultado do estudo de longos anos, que ela é o esforço livre e consciente do Espírito que busca, honestamente, reparar um desvio que tenha tomado:

8º) A duração do castigo está subordinada ao aperfeiçoamento do espírito culpado. Nenhuma condenação por um tempo determinado é pronunciada contra ele. O que Deus exige para pôr fim aos sofrimentos é o arrependimento, a expiação e a reparação – em resumo: um aperfeiçoamento sério, efetivo, assim como um retorno sincero ao bem ((Didaticamente, podemos interpretar expiação como o aperfeiçoamento sério e efetivo, e reparação como um retorno sincero ao bem. No item 23, Kardec define arrependimento como ‘fato da livre vontade do homem’. Ou seja, o espírito imperfeito primeiro conscientiza-se e escolhe superar sua condição, faz então a escolha das provas como expiação, objetivando seu aperfeiçoamento, retornando assim ao bem, conquistando a felicidade ao desenvolver as faculdades de sua alma. (N. do E.) )).

O espírito é, assim, sempre o árbitro de seu próprio destino; ele pode prolongar seus sofrimentos por seu endurecimento no mal, aliviá-los ou abreviá-los por seus esforços para fazer o bem.

Uma condenação por um tempo determinado qualquer teria o duplo inconveniente de ou continuar a atingir o espírito que se houvesse aperfeiçoado, ou cessar quando ele ainda estivesse no mal. Deus, que é justo, pune o mal enquanto este existe; e encerra a punição quando o mal não existe mais.

Assim se acha confirmada esta expressão: Eu não quero a morte do pecador, mas que ele viva, e eu o acusarei ATÉ QUE ELE SE ARREPENDA ((Se o ímpio faz penitência de todos os pecados que cometeu, se ele guarda todos meus preceitos e age segundo a equidade e a justiça, ele certamente viverá e não morrerá – Eu não me lembrarei mais das iniquidades que ele tenha cometido; ele viverá nas obras de justiça que terá feito – Quero eu a morte do ímpio, diz o Senhor Deus? E não quero antes que ele se converta, retire-se do mau caminho e viva? (Ez, 18:21-23; 23:11.) (N. do A.) )).

O Céu e o Inferno, editora FEAL

Mundo de Provas e Expiações

Podemos facilmente verificar, enfim, que a Terra, por se tratar de um mundo de provas e de expiações, não é nem um mundo apenas de provas, nem um mundo apenas de expiações. É de um e de outro. Portanto, existem Espíritos encarnados que escolheram expiações e outros que não. Estão apenas passando por provas, que são todas as dificuldades que nos oferecem chance de aprendizado e de avanço.

Quem são aqueles, portanto, que passam por expiações? Será que podemos apontar o dedo e classificá-los? “Este aqui é bonzinho, é apenas uma prova”; “ah, aquele ali é maldoso, egoísta, é uma expiação”. Eu não arrisco. Mas, na verdade, há algo lógico a se tirar daqui: um Espírito encarnado pode estar, neste momento, desenvolvendo uma imperfeição, um apego, algo que antes não tinha. Talvez, antes, estivesse sem apegos. Não está, portanto, expiando, mas expiará.

Essa é a função de um planeta como o nosso: dar, em contato com a matéria bruta, as condições para o burilamento de cada um.

Um Espírito pode estar na faixa de evolução em que a Terra lhe dá condições de aprendizado, sem que para isso ele tenha arrependimentos morais que precise enfrentar.

Reforma Íntima ou Reforma Moral

O Espiritismo oferece um forte subsídio, uma forte alavanca para a reforma moral do nosso mundo, que, encontra-se em situação lastimável, com certeza. Já no âmbito individual, precisamos nos perguntar: carecemos todos de uma reforma? Ou precisamos apenas de aprendizado? Essa é uma pergunta que apenas cada um, com sua própria consciência, pode responder.

O fato é que é necessário cuidado ao adotar cegamente certas ideias. Crer que todos que aqui nascem estão expiando algo, que tudo o que atravessamos é uma expiação e, pior ainda, que a expiação seja pagar dívidas passadas por uma espécie de castigo, nos leva a resultados negativos na forma de proceder ante a vida e aos demais.

Resultados negativos da crença no karma

  1. Culpa e Autocensura: Indivíduos que acreditam nisso podem carregar um fardo de culpa constante, acreditando que estão pagando por erros passados. Isso pode levar à autocensura e a uma vida cheia de restrições, com medo de cometer novos erros.
  2. Desencorajamento: A crença de que a vida atual é uma punição por ações passadas pode desencorajar as pessoas a buscarem seus objetivos e sonhos, pois podem acreditar que não merecem sucesso ou felicidade.
  3. Falta de Empatia: A ideia de que o sofrimento dos outros é resultado de dívidas kármicas pode levar à falta de empatia e compaixão pelos que estão em situações difíceis. Isso pode prejudicar a solidariedade e o apoio social. Infelizmente, vemos essa falta de empatia constantemente.
  4. Resignação negativa: As pessoas podem se tornar resignadas diante das dificuldades, aceitando passivamente o sofrimento como um destino inevitável, em vez de buscar soluções e melhorias em suas vidas ((A resignação pode ser positiva, quando representa a aceitação realista de limitações após esgotar esforços para lidar com uma situação)).
  5. Injustiça: A crença no karma dessa forma pode justificar ou perpetuar desigualdades sociais e econômicas, pois as pessoas podem acreditar que aqueles que estão em posições privilegiadas merecem isso devido a ações passadas ((A compreensão original de karma liga-se à ideia de que as ações tem suas consequências. Isso enfatiza a responsabilidade pessoal pelas ações e as implicações que elas têm.)).

Em resumo, essa crença pode ter efeitos negativos na saúde mental, no bem-estar e nas relações interpessoais, além de contribuir para a perpetuação de desigualdades e injustiças. É importante lembrar que as crenças sobre karma variam muito entre diferentes sistemas de crenças e culturas, e nem todos interpretam o karma da mesma maneira.

Conclusão

Talvez muitos de nós estejamos, precisemos de reformas, no sentido de termos nos desviado do bem por conta deste ou daquele apego e agora precisarmos nos conduzirmos novamente ao bem. Mas, como mudar o que não se sabe?

Não adianta buscar uma transformação vazia, sem base, tentando apenas seguir cegamente outros exemplos. É necessário compreender o que se faz e porque se faz. Por isso a importância do Espiritismo.

780. O progresso moral acompanha sempre o progresso intelectual?

Decorre deste, mas nem sempre o segue imediatamente.” (192–365.)

a) — Como pode o progresso intelectual engendrar o progresso moral?

Fazendo compreensíveis o bem e o mal. O homem, desde então, pode escolher. O desenvolvimento do livre-arbítrio acompanha o da inteligência e aumenta a responsabilidade dos atos.”

O Livro dos Espíritos. Grifos nossos.

Além disso, a ideia de que estejamos todos expiando desvios passados nos leva a uma pressão externa de nos corrigirmos de coisas que nem sequer entendemos. Isso seria uma correção artificial, que não se sustenta e nos envereda por um caminho complicado: se a mudança não se edifica sobre o real entendimento, de maneira progressiva, nos impomos um passo maior que nossas pernas. Ao tentar dar o salto e, por isso, cairmos, cremos que não somos fortes o suficiente, abandonando por completo as tentativas.

Infelizmente, muitos ainda acrescentam aí a falsa ideia de que essa vida seria a mais importante de todas e que, se não nos corrigirmos, estaríamos fadados a sermos o joio, “exilados” do Planeta Terra – outra falsa ideia, nascida inicialmente do livro “Exilados de Capela”, que não é Doutrinário.

Sim: cada um deve se observar e buscar se corrigir naquilo que entender que faz errado. Mas isso não se faz por pressão, nem seguindo cegamente a algo. É preciso compreender, e a mudança tem que ser feita passo a passo. Não se constrói um edifício de cima para baixo.

O caminho do bem

O indivíduo que busca o caminho do bem, olha para si e se analisa. Julga a si mesmo, observando erros e acertos. Avalia onde pode melhorar e onde pode corrigir, se julgar que tem algo a corrigir. Mais que isso: para trilhar o bem, deve-se fazer o bem, e o conhecimento do Espiritismo permite que esse processo seja mais acertado, porque o bem verdadeiro é útil e, para ser útil, é necessário saber o que se diz e o que se faz.

Muitos, por falta de conhecimento doutrinário (obras de Kardec), são pouco úteis. Enquanto dão pratos de sopa, que saciam momentaneamente a fome do estômago (algo importante e venerável, é claro), não saciam a fome de compreensão e de conhecimento, que definitivamente eleva o Espírito a novos degraus e pode inclusive dar a ele novas perspectivas para enfrentar aquela situação e dela sair.

Alguns, enquanto entregam o pão, creem e dizem que a pessoa que sofre de males materiais está passando por isso porque merece. Sim, já ouvi espíritas afirmarem isso. Esse, frequentemente, é o resultado da reforma íntima artificial, que tende a olhar apenas para si, sem buscar conhecimento, esquecendo que se deve ser verdadeiramente útil aos demais.




Roustaing, Ismael e “Brasil, Coração do Mundo”

“Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho”, é uma obra de Chico Xavier, atribuída ao Espírito de Humberto de Campos Veras. Obra assaz estranha, introduz uma série de ideias contrárias ao Espiritismo, girando principalmente sobre o papel do suposto Espírito de Ismael, que muitos acreditam ser o “protetor espiritual do Brasil”, mas que, na verdade, não passa de mais um inimigo do Espiritismo — talvez o maior deles. Ao longo de muito tempo, esse Espírito vem disseminando falsas ideias entre aqueles que as aceitam cegamente e, assim, vem causando enorme desserviço e atraso na propagação do Espiritismo em sua realidade. Em Roustaing, encontrou o trabalhador do mau caminho.

O trecho seguinte foi extraído do livro “Ponto Final: o reencontro do Espiritismo com Allan Kardec”, e destaca evidências de que essa obra foi provavelmente adulterada pela Federação Espírita Brasileira:

[…] Julio Abreu Filho, primeiro tradutor dos 12 volumes da Revue Spirite, denunciou que exatamente um ano antes do aparecimento de “Brasil, coração do mundo, pátria do Evangelho”, o livro Crônicas de Além-Túmulo, também psicografado por Chico Xavier e assinado pelo próprio Humberto de Campos, havia sido lançado, e em cujas páginas se encontra uma mensagem semelhante na qual apenas Kardec, Denis, Delanne e Flammarion são citados, e por lugar nenhum Roustaing é mencionado. Diante da denúncia de uma possível interpolação, que poderia ser resolvida com muita facilidade ao mostrar os originais do livro questionado, a FEB informou que havia ordenado sua incineração. O fato se assemelha à queixa de Berthe Fropo no século XIX, de que Leymarie havia queimado numerosos documentos do arquivo de Kardec.

Ah!, como precisa de defensores essa Doutrina que, mesmo partindo dos Espíritos e sendo imortal, depende do trabalho humano para ser retomada e desenvolvida da maneira necessária, porque, infelizmente, os maus Espíritos têm encontrado muitos defensores, prontos a ouví-los cegamente.

Espíritas: avante!




O Espiritismo nas Prisões

“O Espiritismo nas Prisões” é um artigo originalmente publicado por Allan Kardec na Revista Espírita de fevereiro de 1864, e conta a história de um criminoso que, tendo conhecido o Espiritismo em sua realidade, transformou-se e passou até mesmo a praticar a mediunidade na prisão – algo inconcebível para o movimento espírita moderno, que apregoa que ela só deve ser praticada dentro dos centros espíritas, o que é falso.

Deixo o artigo na íntegra para a vossa leitura:

O Espiritismo nas prisões

Na Revista de novembro de 1863, publicamos uma carta de um condenado detido numa penitenciária, como prova da influência moralizadora do Espiritismo. A carta abaixo transcrita, de um condenado em outra prisão, é um exemplo dessa poderosa influência. É de 27 de dezembro de 1863. Transcrevemo-la textualmente, quanto ao estilo. Corrigimos apenas os erros ortográficos.

“Senhor,

“Há poucos dias, quando me falaram pela primeira vez de Espiritismo e de revelação de além-túmulo, eu ri e disse que isto não era possível. Eu falava como um ignorante, que sou. Alguns dias depois tiveram a bondade de me confiar, em minha horrível posição em que me acho agora, vosso bom e excelente Livro dos Espíritos. A princípio li algumas páginas com incredulidade, não querendo, ou melhor, não crendo nessa ciência. Enfim, pouco a pouco e sem me aperceber, por ele tomei gosto; depois levei a coisa a sério; depois li pela segunda vez o vosso livro, mas então com um outro espírito, isto é, com calma e com toda a pouca inteligência que Deus me deu.

“Senti então despertar essa velha fé que minha mãe me tinha posto no coração e que dormitava há longo tempo. Senti o desejo de me esclarecer sobre o Espiritismo.

A partir desse momento tive um pensamento muito decidido, o de tomar conhecimento, aprender, ver e depois julgar. Pus-me à obra com toda a crença que se pode ter e que é preciso ter em Deus e em seu poder. Eu desejava ver a verdade.

Orei com fervor e comecei as experiências.

“As primeiras foram nulas, sem resultado algum, mas não me desencorajei. Perseverei em minhas experiências e, palavra, redobrei minhas preces, que talvez não fossem bastante fervorosas e mergulhei no trabalho com toda a convicção de uma alma crente e que espera.

“Ao cabo de algumas noites, pois só posso fazer as experiências à noite, senti, por cerca de dez minutos, frêmitos nas pontas dos dedos e uma leve sensação no braço, como se tivesse sentido correr um riachinho de água morna, que parava no punho. Eu estava então bem recolhido, todo atenção e cheio de fé. Meu lápis traçou algumas linhas perfeitamente legíveis, mas não bastante corretas para não crer que estivesse sob o peso de uma alucinação. Esperei então com paciência a noite seguinte para recomeçar as experiências, e dessa vez agradeci a Deus, de todo o coração, pois tinha obtido mais do que ousava esperar.

“Desde então, de duas em duas noites, entretenho-me com os Espíritos que são bastante bons para responder ao meu apelo e, em menos de dez minutos, respondem sempre com caridade. Escrevo meia página ou páginas inteiras que minha inteligência não poderia fazer sozinha, porque, às vezes, são tratados filosófico religiosos em que jamais pensei nem pus em prática; porque dizia-me, aos primeiros resultados: Não serás joguete de uma alucinação ou da tua vontade? E a reflexão e o exame me provavam que eu estava bem longe dessa inteligência que havia traçado aquelas linhas. Eu baixava a cabeça, cria e não podia ir contra a evidência, a menos que estivesse inteiramente louco.

“Remeti duas ou três dessas comunicações à pessoa que tinha feito a caridade de me confiar o vosso bom livro, para que ela sancione se estou certo. Venho pedirvos, senhor, vós que sois a alma do Espiritismo, que tenhais a bondade de me permitir vos envie o que obtiver de sério em minhas conversas de além-túmulo, se, todavia, achardes bom. Se isto for de vosso agrado, vos enviarei as conversas mantidas com Verger, aquele que feriu o arcebispo de Paris. Para bem me assegurar de que o manifestante era ele mesmo, evoquei São Luís, que me respondeu afirmativamente, bem como outro Espírito no qual tenho muita confiança, etc……………”

As consequências morais deste fato se deduzem por si mesmas. Eis um homem que tinha abjurado toda crença e que, ferido pela lei, se acha confundido com o rebotalho da Sociedade. Esse homem, no meio do pântano moral, voltou à fé. Ele vê o abismo em que caiu; ele se arrepende; ele ora e, digamo-lo, ah! Ele ora com mais fervor que muita gente que exibe devoção. Para isto bastou a leitura de um livro onde encontrou elementos de fé que a sua razão pôde admitir, que reanimaram as suas esperanças e lhe fizeram compreender o futuro. Além disso, o que é digno de nota, é que a princípio leu com prevenção e sua incredulidade só foi vencida pelo ascendente da lógica. Se tais resultados são produzidos por uma simples leitura, feita, por assim dizer, às ocultas, o que seria se a ela se pudesse juntar a influência das exortações verbais!

É bem certo que, na disposição de espírito em que hoje se encontram, esses dois homens (ver o fato relatado no número de novembro último), não apenas não terão, durante sua detenção, qualquer conduta reprovável, mas entrarão no mundo com a resolução de aí viverem honestamente.

Considerando-se que estes dois culpados puderam ser reconduzidos ao bem pela fé que acharam no Espiritismo, é evidente que se eles tivessem tido essa fé previamente, não teriam cometido o mal. A Sociedade é, pois, interessada na propagação de uma doutrina de tão grande poder moralizador. É o que se começa a compreender.

Uma outra consequência a tirar do fato relatado é que os Espíritos não são detidos pelos ferrolhos, e que vão até o fundo das prisões levar suas consolações.

Assim, não está no poder de ninguém impedir que eles se manifestem de uma ou de outra maneira. Se não for pela escrita, será pela audição. Eles enfrentam todas as proibições, riem-se de todas as interdições, transpõem todos os cordões sanitários. Que barreira podem, então, lhes opor os inimigos do Espiritismo?




O rapaz e o oásis: uma fábula de esperança

Em um determinado local, havia um grande deserto. Para onde se olhasse, não se via mais do que paisagens desoladas pelas areias que fustigavam qualquer coisa viva que tentasse sobreviver. Aqui e ali, porém, denotavam-se pequenos agrupamentos de elementos: eram pequenos vilarejos, formados nos pontos mais baixos das montanhas de areia e de pedras, onde, de alguma forma, era possível subsistir.

Esses pequenos vilarejos se mantinham às custas dos locais onde alguma água subterrânea aflorava, ou onde a água das chuvas esparsas se acumulavam por algum tempo. Era pouca água, um pouco lamacenta, e onde se dessedentavam homens e animais. Ao redor dessa água, cresciam alguma vegetação e plantava-se alguma coisa que mal dava para alimentar a todos – homens e animais.

Era assim a situação geral de todos esses vilarejos. Com o pouco que sabiam, transmitido entre gerações, buscavam se manter e manter o lamacento corpo de água. A vida era dura e saúde não era boa. Eram todos ensinados que somente ali seria possível sobreviver, pois, ao redor, somente havia areia e pedras, além de outros agrupamentos de similar situação.

Leia também: é possível praticar a mediunidade no lar?

De vez em quando, um ou outro, cansado dessa situação, decidiam sair dos vilarejos para buscar algo além. Não se conformavam com aquela vida, mas saiam sem rumo, sem conhecimento algum sobre o derredor. Nunca mais voltavam. Muitos morriam no deserto, sem possibilidade de sobreviver. Outros, terminavam em outros vilarejos.

Em um desses vilarejos, vivia um rapaz, muito cedo orfanado e, por isso, criado em comum por outras pessoas. Desde pequeno, ensinado sobre as tradições ligadas à sobrevivência, esforçava-se para ajudar na conservação do ambiente que lhe permitia a subsistência, embora não se conformasse com aquele estilo de vida, tão limitado. Era perquiridor: buscava meios de obter mais água, de cultivar mais alimentos… Mas era tudo muito limitado e seus esforços não iam muito longe com o conhecimento que tinha.

Certo dia, caminhando pelas extremidades do vilarejo, uma forte rajada de vento, cheia de areia, trouxe com ela algo diferente: pétalas de flores e algumas folhas verdes. Ele as tomou do chão e as analisou. Eram diferentes de tudo o que tinham naquele vilarejo e, além de tudo, eram muito viçosas e bem desenvolvidas. Aquilo lhe despertou a curiosidade. Rapidamente, voltou ao seu pequeno casebre, tomou um cantil de água e algum alimento e saiu, sem dizer nada a ninguém. Tomou a direção de onde vinha o vento, sem saber o que encontraria.

O rapaz caminhou sob sol forte, sempre buscando sinais das folhas e flores, que encontrava aqui e ali. Por vezes, quase perdia a esperança, quando não encontrava em parte alguma sinais desses elementos. Sem desistir, ampliava um pouco mais a largura de suas buscas, sempre tentando se manter na direção correta. Logo, encontrava um pequena folha ou alguma pétala que, embora desidratadas, ele reconhecia como sendo do mesmo tipo encontrado anteriormente.

Veio a noite, e o rapaz se acomodou ao lado de um rochedo, onde encontrou algum calor para passar a noite. Alimentou-se sobriamente e notou que seu cantil já se encontrava quase pela metade… A preocupação lhe atormentou por algum tempo, mas logo dormiu e, no dia seguinte retomou a caminhada. Assim seguiu, por mais dois dias…

Por algum tempo, no meio do terceiro dia, andou o rapaz na direção sabida, mas não mais encontrava sinais das folhas ou das flores. Andou mais longe, alargou a busca, mas, nada. O desespero começou a alcançá-lo, pois seu cantil já continha apenas água lamacenta e ele já estava muito distante de sua origem. Sabia que voltar seria muito difícil, senão impossível, pois a desidratação já lhe atormentava o corpo.

Foi então que, caindo de joelhos em meio à areia, com lágrimas nos olhos ressecados, angustiado e sem esperança, uma borboleta pousou em seu ombro. Espantado, levantou-se. Ele não conhecia aquele inseto de tão belo voo. Algo lhe tomou novamente o ser e, com ânimo renovado, decidiu segui-la. Andou algumas centenas de metros, e logo percebeu outras borboletas ao redor. Notou que o chão começava a mudar. Aqui e ali, em meio à areia, que começava a ficar menos fofa, uma espécie de grama, algo ressecada, brotava e resistia. Seguiu nessa direção, e a paisagem ia mudando sucessivamente, até que alguns arbustos mais encorpados começavam a surgir e, mais ao longe, ele parecia divisar uma vegetação alta e densa… Mas o sol fustigava-lhe, a desidratação lhe causava tonturas e, de repente, um torpor lhe tomou e ele caiu ao chão, crendo que ali seria o seu fim.

Algum tempo depois, o rapaz acordou com seus lábios molhados de água fresca. Confuso, notou que estava encostado em uma grande árvore, que fornecia sombra fresca. Seus olhos estavam embaçados. Parecia ver, ao redor, algumas outras pessoas, mas não passavam de sombras turvas. Esfregou os olhos, buscando enxergar melhor, mas sem sucesso. Sentiu alguém aproximar e lhe jogar água sobre o rosto. Levou as mãos novamente aos olhos umedecidos, limpou-os e, aos poucos, notou a visão retornando. Foi quando conseguiu observar três pessoas ao seu redor, portando ferramentas e algumas bolsas de pano. Sorriam para ele. Uma delas entregou-lhe um cantil, do qual o rapaz bebeu com avidez. A água era fresca, límpida, como ele nunca havia ingerido antes, senão quando conseguia colher alguma água da chuva.

Refestelou-se daquele líquido e, em alguns momentos, sentiu a energia lhe retornando ao corpo. Teve forças e se levantou vagarosamente. Aquelas pessoas se aproximaram e quiseram lhe falar. Espantado, notou que falavam o seu idioma, embora com sotaque diferente! Convidaram-no a segui-las, ao que ele prontamente se entregou. Caminharam algum tempo em meio a uma linda floresta. Ele percebia o perfume, a umidade que lhe acalentava a pele, os sons de diferentes animais e do vento balançando as folhas. Notou, no chão, flores e folhas que ele reconhecia. Próximo, notou um riacho de água limpa e cristalina a correr em meio à vegetação. Que alegria ele sentia naquele momento!

Chegaram, então, ao centro de um vilarejo. Muitas pessoas viviam ali, todas de aparência saudável e rostos alegres. Haviam também animais e, nas proximidades, enxergava plantações verdejantes e robustas, algo totalmente diferente da realidade de seu local de origem.

Levaram-no, então, a uma casinha simples, onde se reuniam algumas pessoas em alegre conversação. Pareciam trabalhar em colaboração sobre o alimento oriundo das plantações. Rapidamente aquela gente o acolheu. Deram-no do que comer e beber, acomodaram-no como se fosse um dos seus, ouviram sua história e lhe contaram muitas coisas em retorno. Ali, o rapaz foi ensinado que a água que brota na superfície vem de muito fundo, e que encontra ali um local de saída. Que, para obter mais dessa água, seria necessário cavar um tanto mais, limpando o barro. Que poderiam fazer poços, para obtê-la fresca e cristalina e que, se as margens fossem cuidadas, com o plantio de certas plantas e árvores, aos poucos o corpo de água ganharia volume e qualidade. Ensinaram que as plantações de alimentos devem vir depois dessas áreas, para não facilitarem a evaporação. Ele rapidamente percebeu que era justamente o contrário do que faziam.

Também contaram ao rapaz que esses vilarejos espalhados pelo deserto foram originalmente formados por pessoas oriundas daquele lugar, muito, muito tempo antes. Eram pessoas que, apesar de viverem e se beneficiarem do conhecimento e da produção daquele lugar, pouco ou nada faziam para aprender e para colaborar. Convidadas constantemente ao trabalho necessário, decidiram afastar-se em um grupo e, depois, decidiram sair, com a intenção de formar elas mesmas suas próprias aldeias, onde acreditavam que poderiam fazer as coisas melhores, e de outra maneira. Isso aconteceu muitos, muitos anos antes e, desde então, eles não mais as viram por ali, embora, de vez em quando, algum bravo indivíduo saísse em missão de buscá-las para ajudá-las: encontrando-as, era rapidamente afastado pelas ideias que trazia e tinha que retornar àquele lugar.

O rapaz estava muito interessado. Questionava, queria saber mais. Compreendeu rapidamente que o conhecimento renegado foi a causa da miséria em que viviam esses vilarejos ou aldeias. Passou ali alguns dias, mas logo percebeu que tinha que retornar, pois precisava compartilhar com os seus tudo aquilo que viu e aprendeu. Tomada a decisão, saiu em viagem de retorno, dessa vez muito mais preparado, com alimento e água fartos. Conduziu-se sem maiores dificuldades ao seu vilarejo de origem, onde ingressou em alguns dias de jornada.

Muito alegre e com energia renovada, tomou o rapaz as ruas arenosas da pequena vila. Seu rosto expressava decisão, embora aqui e ali expressasse alguma tristeza por ver os seus companheiros, tristes e insalubres, encarando-o curiosamente. Buscou, contudo, não se afetar demais e, dirigindo-se aos chefes da vila, cheio de entusiasmo, contou do acontecido, pedindo que fosse realizada uma reunião naquela noite, onde pudesse expor aos demais tudo o que viu e aprendeu. Os chefes da vila receberam suas palavras com olhares de espanto e de incredulidade. Ao final, negaram-lhe a reunião solicitada, dizendo que tudo aquilo não passava de absurdos e que eles estavam certos dos ensinamentos de seus antepassados, aos quais se agarravam com paixão. Além disso, repreenderam-no duramente por ter se retirado sem aviso, pois causou enorme preocupação em todos do vilarejo.

O rapaz não conseguia acreditar. Incrédulo com aquela recepção amargosa, tomou outro caminho: decidiu que ele mesmo buscaria reunir algumas pessoas e que, depois disso, se fosse expulso pelo desrespeito, teria para onde ir. Assim, saiu pelas ruas do vilarejo. Encontrou muitos companheiros de vida e, um a um, foi contando resumidamente sua história e convocando-os para uma reunião, em seu casebre. Muitos expressavam um brilho no olhar, mas diziam não se sentir fortes para abandonar seus hábitos; outros, lhe acusavam de blasfemar contra os ensinamentos de sua tradição; outros, ainda, temiam serem expulsos dali pelos chefes do vilarejo, por pensarem diferentes.

Chegada a hora da reunião, esperava ansioso a chegada de muitos… Esperou, esperou mas, além dele, compareceram apenas outros dois, amigos de infância, tímidos e incertos, mas que perceberam a importância daquilo que ouviram, já que eles mesmos pensavam que aquela situação e aqueles ensinamentos não eram suficientes ou corretos. O rapaz entristeceu-se por alguns instantes, percebendo que nada seria fácil. Ele viu a felicidade de outras pessoas, que colaboravam em um ambiente cuidado por seus próprios esforços. Viu a água cristalina, enquanto, sobre a mesa de seu casebre, restava um jarro de água lamacenta. Ele não podia não tentar.

Passados alguns momentos, tomou resolução diferente. Percebeu que aquele ambiente não aceitaria essas verdades, senão depois de muito tempo, e com a colaboração de pessoas que fossem compreendendo as verdadeiras e originais ideias. Decidiu convidar os presentes a acompanhá-lo em jornada para aquela aldeia distante. Os dois amigos prontamente aceitaram o convite. Queriam aprender mais, queriam viver melhor, e entenderam que, para ajudar àquelas pessoas, teriam que aprender muito mais e se fortalecerem.

Assim, partiram no dia seguinte. Já certo de seu caminho, o rapaz fez que viajassem mais preparados e com mais rapidez. Chegaram às margens da floresta em dois dias, sem muitas dificuldades. Ali, logo encontrou pessoas que os receberam e os conduziram à vila, onde foram todos recebidos com felicidade e integrados à sociedade dali. Em pouco tempo, aprenderam muito. Sentiam-se felizes e contentes, pois não viviam para subsistir e nem para cuidarem apenas de si. Havia colaboração genuína no uso e no desenvolvimento do conhecimento que permitia manter aquele grande oásis, verdadeiro paraíso em meio ao deserto. Mas esse senso de colaboração lhes dizia, no interior, que não podiam ter tudo aquilo somente para eles, pois, fora dali, seus semelhantes viviam em plenas miséria e infelicidade.

Assim, depois de algum tempo, esses três formaram uma iniciativa, à qual se juntaram outros jovens daquele lugar: deveriam planejar, de quando em quando, missões com destino a esses vilarejos, buscando conquistar corações pela razão. Aos poucos, mapearam diversos deles, para onde partiam todo ano, buscando encontrar ouvidos dispostos a escutá-los. Em alguns deles, não encontravam senão hostilidade, sendo mesmo banidos de um e de outro. Nos outros, eram aceitos com precauções, nunca encontrando mais que frieza em seus chefes, que permitiam, contudo, que falassem. Desses, com certa raridade, retornavam com um algum novo companheiro, que frequentemente se juntava à mesma iniciativa.

E assim passaram seus anos de vida, buscando fazer o que acreditaram ser o correto, sabendo que a distância entre os conhecimentos adulterados seriam vencidos um dia e que, nesse dia, as florestas verdejariam por todo lugar, progressivamente extinguindo o deserto para dar lugar a um novo e saudável ambiente. Um dia…


O grande oásis é o Espiritismo, cujo ensinamento os Espíritos vem nos transmitir, em esforço de colaboração. A água pura é o conhecimento resultante desse esforço, construído de maneira metodológica e científica. O rapaz é cada um que percebe essa distância entre o movimento espírita e o Espiritismo. Os vilarejos são os agrupamentos de adeptos espíritas onde não se fala em Kardec e onde o questionamento é visto como subversivo e prontamente coibido. O deserto é a situação atual do nosso mundo.