O canal Mesa Girante e as adulterações em O Céu e o Inferno

Recentemente o canal Mesa Girante, no Youtube, produziu um vídeo onde aborda outro vídeo, de Paulo Henrique de Figueiredo, falando sobre a obra “Nem Céu, Nem Inferno”, de cerca de 3 anos atrás. A obra trata do fato jurídico ((São fato jurídico as adulterações de A Gênese e O Céu e o Inferno, pela mera questão de terem sido lançadas edições, com alterações, após a morte do autor e sem o depósito legal. Esse fato legal está acima de qualquer cogitação e, por conta disso, federações espíritas de outros países, em respeito à lei, voltaram à terceira edição da obra.)) da adulteração de O Céu e o Inferno e do contexto da trama de traição ao redor de Kardec.

Nesse vídeo, o autor do canal Mesa Girante trata de, debochadamente, tentar invalidar a importância da obra por supostas precipitações de Paulo Henrique ao tratar do tema, no vídeo. Pergunto-me por que é que ele, o dono do canal Mesa Girante, não se dedicou primeiramente a ler essa obra, o que teria enriquecido demais o debate? Por que é que ele se concentrou apenas naquilo que lhe pareceu incongruente, pelas falas de Paulo Henrique, sem dar atenção aos demais pontos de relevância da obra? Digo isso porque eu mesmo o procurei, através dos comentários, para demonstrar que a adulteração de O Céu e o Inferno é o produto inquestionável dos dogmas roustainguistas, além do fato jurídico.

No dia seguinte, eu produzi um vídeo, sob efeito de uma irritação pela maneira como o tema foi abordado, com tom de deboche e sem nenhuma intenção de cooperação, e sim de competição, já que não foi procurar Paulo Henrique para conversar sobre as divergências de entendimentos. Esse vídeo, que eu produzi, eu resolvi apagar, pois acabei tratando com afetação um tema onde não deve haver absolutamente nada disso. Em lugar desse vídeo, gravei um novo, onde falo sobre o foco central da adulteração, como você pode ver ao final deste artigo.

Acontece, porém, que, assim que gravei, chegou ao meu conhecimento uma live com Lucas Sampaio, co-autor do livro Nem Céu, Nem Inferno, onde ele explica em detalhes todas as questões envolvidas nesse tema da adulteração. O conteúdo é muito explicativo por si só, de maneira que reproduzo abaixo o mesmo vídeo e aproveito para tecer comentários sobre seu conteúdo.

Comentários sobre a live do Lucas Sampaio

  • É fato jurídico as adulterações de A Gênese e O Céu e o Inferno, pela mera questão de terem sido lançadas edições, com alterações, após a morte do autor e sem o depósito legal. Esse fato legal está acima de qualquer cogitação e, por conta disso, federações espíritas de outros países, em respeito à lei, voltaram à terceira edição da obra.
  • Kardec estava, sim, fazendo revisões nessas obras, preparando novas edições. Isso está registrado em cartas. Contudo, menos de um mês depois da carta onde cita o trabalho de tradução para o alemão, existe uma carta de Kardec para um amigo seu, dizendo que, por problemas de saúde, ele precisou suspender todas as atividades que não fossem estritamente necessárias.
  • Os Espíritos, evocados por Kardec, dizem que ele não deveria suprimir nada nas novas edições. Foi feito justamente o contrário nas edições publicadas após sua morte, com a supressão de pontos importantes nas obras.
  • A psicografia original, onde os Espíritos diziam a Kardec para não suprimir nada nas novas edições, foi adulterada por Leymarrie em Obras Póstumas, retirando justamente esse conselho, para dar credibilidade à 5a edição de A Gênese. Isso se deu após a denúncia de Henry Sausse.
  • Os negacionistas dos fatos jurídicos e das evidências de adulteração chegam a usar depoimentos de pessoas ligadas a Leymarie para sustentar suas teses.
  • É importantíssimo ler a obra O Legado de Allan Kardec, que traz diversas evidências sobre os fatos acerca da adulteração de A Gênese.
  • Fala-se em registros contábeis da Sociedade, assinados pela esposa de Kardec, três anos após sua morte, onde estariam registrados os custos de impressão de O Céu e o Inferno a fevereiro de 1869. Faz sentido fazer contabilidade de algo passado à criação da Sociedade Anônima (empresa)? Faz sentido confiar em documentos da Sociedade Anônima, a mesma que deu o golpe post-mortem em Kardec? Como veremos a seguir, os documentos oficiais mostram que a obra não foi impressa naquela data.
  • Foi encontrada, nos registros legais da Biblioteca Nacional, a declaração de impressor n. 8.584 com pedido de autorização do tipógrafo Rouge registrado em 9/7/1869 para imprimir 2.000 exemplares da mesma quarta edição de O Céu e o Inferno, conforme a página 294 do documento F/18(II)/128, mais de três meses após a desencarnação de Allan Kardec.
  • Na Revista Espírita de junho de 1869, foi publicado, pela Sociedade Anônima, o artigo de título “À venda em 1° de junho de 1869”, tratando da edição que ficou pronta somente em 19 do mês seguinte. E o aviso ainda explica:

Quarta edição de O Céu e o Inferno ou a justiça divina segundo o Espiritismo, contendo numerosos exemplos sobre a situação dos Espíritos no mundo espiritual e na Terra; 1 vol. in-12, preço: 3 fr. 50.

Observação – A parte doutrinária desta nova edição, inteiramente revista e corrigida por Allan Kardec, passou por modificações significativas. Alguns capítulos em particular foram inteiramente reformulados e consideravelmente aumentados.

(SOCIEDADE ANÔNIMA, [RE] 1869, jul., p. 224)

  • Tudo indica que Amelie, com mais de 70 anos, em luto, foi enganada pela Sociedade Anônima, e confiou no que diziam ou apresentavam a ela. Berthe Froppo menciona que ela acreditava que a S.A. iria vender os livro de Kardec a preços populares (e fizeram o contrário). A doce Gabi, como a chamava Kardec, entregou tudo, crendo que o melhor seria feito, pois não tinha um espírito de liderança. Foi afastada de qualquer papel de decisão da S.A. Foi, em suma, ludibriada. Não se opôs às novas edições, pois sabia que seu marido trabalhava sobre elas. Escolheu entregar à S.A. toda a obra de Kardec, pois pensava, seguindo os propósitos de Kardec, que o Espiritismo deveria ser de todos, e não mais centralizado em ninguém. Era a promessa da Sociedade, finalmente não cumprida.
  • Existe uma falta de vontade (e aqui eu reitero: inclusive pelo CSI do Espiritismo e do dono do canal Mesa Girante) em fazer um estudo cuidadoso e aplicado, inclusive comparativo. Não: fica-se girando apenas na superfície das afirmações e das negações simplórias, numa sanha de negar o que vemos estar óbvio aos nossos olhos.
  • As teses de negação não respeitam o fato jurídico; não se importam com os planos de Kardec para o futuro do Espiritismo; não se importam com os vários golpes sofridos por Kardec e pelo Espiritismo; não se importam com o golpe à unidade de método e de organização, necessárias à continuidade doutrinária; não fazem análises doutrinárias sobre o conteúdo anterior e as alterações; não se importam com o fato de a Sociedade Anônima haver incendiado um grande número de manuscritos de Kardec, após sua morte; não falam do verdadeiro complô sendo formado ao redor de Kardec, por Roustaing e seus seguidores; não trazem à luz os incontáveis fatos e evidências dos interesses contrários ao bem, por pessoas ao redor de Kardec.

    Não, e nem podem, pois dar atenção ao fato dos descalabros sofridos por Kardec e pelo Espiritismo seria alimentar os argumentos da adulteração, o que não seria do interesse deles. Pelo contrário: esforçam-se por colocar dúvida injustificável sobre pessoas como Berthe Froppo, amiga íntima do casal Kardec, que fez algumas graves denúncias contra Leymarie e a sociedade anônima! Não, para eles o testemunho de Froppo não vale, mas valem as alegações do adulterador, Leymarie, e sua esposa, além dos demais envolvidos, por interesse, em seus negócios espíritas!

  • O prefácio de A Gênese e a introdução do capítulo 8º de O Céu e o Inferno (3a edição) tratam justamente do método do Espiritismo, que o protege de se transformar em um sistema pessoal, o que incomodava sobremaneira Roustaing e Pezzani, seu amigo pessoal, que tinham suas próprias concepções do que deveria ser o Espiritismo. Será acaso que tanto um como outro foram removidos nas novas edições?
  • Os trechos removidos na adulteração de A Gênese denunciam exatamente como pensam e agem os inimigos da verdadeira ideia.
  • Cada um dos 25 itens do capítulo VIII de O Céu e o Inferno tinham fundamentação no restante da obra. Na 4a edição, adulterada, muitos itens perderam essa correspondência, conforme se demonstra em O Céu e o Inferno, da editora FEAL (clique aqui para baixar gratuitamente).

Live com Lucas Sampaio sobre as Adulterações nas obras de Kardec

Vídeo do meu canal falando sobre o vídeo do canal Mesa Girante




O Espírito da Condessa Paula e as Moradas Aéreas

Muita gente usa o caso desse Espírito, da Condessa Paula, apresentado em O Céu e o Inferno, para dar base às suas teorias de “cidades astrais”.

O que são os vossos palácios e os vossos salões dourados ante as moradas aéreas, o vasto campo do espaço matizado de cores que fariam empalidecer o arco-íris? Que são os vossos passeios passo a passo nos parques, ante a viagens através da imensidão, mais rápidas do que o relâmpago? O que são os vossos horizontes limitados e carregados de nuvens, ante o grandioso espetáculo dos mundos a se moverem no universo sem limites, sob a poderosa mão do Altíssimo?

Como os vossos concertos mais melodiosos são tristes e ruidosos, ante esta harmonia que faz vibrar os fluidos do éter e todas as fibras da alma? Como as vossas grandes alegrias são tristes e insípidas ante a inefável sensação de felicidade que incessantemente satura o nosso ser à maneira de um eflúvio benfazejo, sem nenhuma mescla de inquietação, nenhuma preocupação, nenhum sofrimento! Aqui tudo respira amor e confiança e sinceridade. Por toda parte corações amantes, por toda parte vemos amigos, nada de invejosos e ciumentos. Esse é o mundo em que me encontro, meu amigo, e todos vós o atingireis infalivelmente seguindo o caminho certo.

Infelizmente, muitos param nas leituras dos pontos que lhes interessam. Quando o Espírito fala em “moradas aéreas”, pronto, isso já é suficiente para afirmarem que ela falava das cidades espirituais! A que ponto levam os vieses adotados com pressa…

Logo em seguida à citação de “moradas aéreas”, ele continua:

[…] o vasto campo do espaço matizado de cores que fariam empalidecer o arco-íris? Que são os vossos passeios passo a passo nos parques, ante a viagens através da imensidão, mais rápidas do que o relâmpago? O que são os vossos horizontes limitados e carregados de nuvens, ante o grandioso espetáculo dos mundos a se moverem no universo sem limites, sob a poderosa mão do Altíssimo?

Esse Espíritos está falando do Espaço! Não está falando de cidades astrais, mas do Espaço! “Moradas aéres” é uma linguagem figurada para dizer do Espaço, “acima” de nós!

Ela continua:

Entretanto uma felicidade uniforme logo aborreceria. Não penses que a nossa felicidade esteja livre de vicissitudes. Não se trata de um concerto perpétuo, nem de uma festa sem fim, nem de beatífica contemplação através da eternidade. Não. É o movimento, a vida, a atividade. As ocupações, embora isentas de fadigas, apresentam incessante variedade de aspectos e de emoções, pelos mil incidentes que as continham. Cada qual tem a sua missão a cumprir, seus protegidos a assistir, amigos da Terra a visitar, processos da Natureza a dirigir, almas sofredoras a consolar. Há um vaivém, não de uma rua para outra, mas de um mundo para outro. As criaturas se reúnem, se separam para novamente se juntarem; encontram-se aqui e ali, conversam sobre o que fazem, felicitam-se pelos sucessos obtidos; entendem-se, assistem-se mutuamente nos casos difíceis. Enfim, asseguro-te que ninguém dispõe de um segundo de tempo para se enfadar.

O que existe “do lado de lá”, para os Espíritos desapegados, é a atuação na criação divina! É o trânsito pelo Espaço infinito, onde se reúnem, aqui e ali, com outros Espíritos, para atuar nos processos da Natureza, no consolo às almas sofredoras, encarnadas e desencarnadas! É isso, e não uma vida limitada por paredes e falsas necessidades fisiológicas!

Confira uma abordagem mais completa no artigo Umbral e a base doutrinária.




Baixe PDF de O Céu e o Inferno Original, de Allan Kardec

A editora FEAL liberou, há pouco tempo, o PDF gratuito da obra O Céu e o Inferno, de Allan Kardec. A grande diferença para essa edição é que ela recupera a obra originalmente escrita por Allan Kardec, livre da absurda desfiguração que essa obra sofreu em sua 4⁠ª edição, adulterada após a morte de Kardec.

Adulteração? Sim, se você ainda não sabe, essa obra foi adulterada após a morte de Kardec e lançada com uma enorme diversidade de remoções de ideias originais, muito claras, e a adição de ideias exíguas à Doutrina Espírita, contrárias mesmas àquilo que Kardec frequentemente desmentia ou afirmava. Você pode entender um pouquinho melhor essa adulteração clicando aqui e também através da leitura de “Nem Céu Nem Inferno – As leis da alma segundo o Espiritismo“.

Clique no link abaixo para baixar o PDF gratuito de O Céu e o Inferno, de Allan Kardec, pela editora FEAL:

https://portalmundomaior.com.br/artigo/o-ceu-e-o-inferno-ou-a-justica-divina-segundo-o-espiritismo




Do princípio doutrinário da Expiação, por Allan Kardec

Um grupo espírita brasileiro, com inquestionável mérito por abordar o Espiritismo prático, através das evocações e do diálogo com os Espíritos, publicou recentemente um artigo onde, tendo evocado o Espírito de Allan Kardec, este, supostamente, teria comentado sobre as dez leis moisaicas – os Dez Mandamentos. Nessa evocação, ele fala algo sobre a expiação, que chamou nossa atenção.

Não duvidamos da possibilidade da comunicação desse Espírito. Na verdade, ele deve ter muita vontade de atuar nesse trabalho essencialmente espírita, onde quer que seja chamado. Contudo, lendo os comentários atribuídos a ele, encontramos o seguinte:

Que pune a iniquidade dos pais nos filhos que me odeiam até a terceira geração.

“Isso seria a negação da soberana justiça e da suprema bondade de Deus. Em verdade, eis o que foi dito: cada um será punido pelo seu pecado. Não está aí um desmentido dessas tristes palavras? O culpado expia as faltas, das quais não se arrepende, em uma sucessão de penosas encarnações.”

Grupo Revista Espírita. “Explicações dos dez mandamentos dadas pelos Espíritos”. Disponível em https://www.revistaespirita.net/pt-br/artigo/184/explicacoes-dos-dez-mandamentos-dadas-pelos-espiritos. Acesso em 01/12/2023. Grifos nossos.

A conclusão não está correta. Peço que me acompanhem amistosamente, pois não estou aqui para atirar pedras em ninguém.

“O culpado expia as faltas, das quais não se arrepende, em uma sucessão de penosas encarnações”. Isso remete à ideia de que a expiação seja um castigo dado por Deus aos Espíritos não arrependidos:

A palavra expiar significa purificar, pagar pelos pecados. Por meio da Expiação de Jesus Cristo, podemos nos purificar para nos reconciliarmos com o nosso Pai Celestial.

Disponível em https://www.churchofjesuschrist.org/study/manual/true-to-the-faith/atonement-of-jesus-christ?lang=por

Esse não pode ser o pensamento de Kardec. Consta, da terceira edição de O Céu e o Inferno, o seguinte, depois removido na adulteração dessa obra:

“8.º) A duração do castigo está subordinada ao aperfeiçoamento do espírito culpado. Nenhuma condenação por um tempo determinado é pronunciada contra ele. O que Deus exige para pôr fim aos sofrimentos é o arrependimento, a expiação e a reparação — em resumo: um aperfeiçoamento sério, efetivo, assim como um retorno sincero ao bem.

O espírito é, assim, sempre o árbitro de seu próprio destino; ele pode prolongar seus sofrimentos por seu endurecimento no mal, aliviá-los ou abreviá-los por seus esforços para fazer o bem.

Uma condenação por um tempo determinado qualquer teria o duplo inconveniente de ou continuar a atingir o espírito que se houvesse aperfeiçoado, ou cessar quando ele ainda estivesse no mal. Deus, que é justo, pune o mal enquanto este existe; e encerra a punição quando o mal não existe mais.

Assim se acha confirmada esta expressão: Eu não quero a morte do pecador, mas que ele viva, e eu o acusarei ATÉ QUE ELE SE ARREPENDA.”

Depois, num trecho removido na 5.ª edição de A Gênese, ele assevera:

“Longe de substituir um exclusivismo por outro, o Espiritismo se apresenta como campeão absoluto da liberdade de consciência. Combate o fanatismo sob todas as formas, cortando-o pela raiz, anunciando a salvação para todos os homens de bem, assim como a possibilidade, para os mais imperfeitos, de chegar, por seus esforços, pela expiação e reparação, à perfeição única, que leva à suprema felicidade. Em lugar de desencorajar o fraco, encoraja-o, mostrando-lhe o porto que pode chegar.”

É claro que a expiação é um resultado do arrependimento do Espírito. Antes disso ele sofre apenas o remorso, mas o arrependimento sincero o coloca no caminho consciente da reparação pela expiação, fruto de suas escolhas (remorso e arrependimento são coisas diferentes). Isso é o resultado de todos os longos anos de estudos e pesquisas de Kardec, estando constantemente evidenciado na Revista Espírita.

As evidências nítidas de adulteração, sobretudo em O Céu e o Inferno, desfiguraram a doutrina e mancharam a reputação de Kardec como um tolo que se contradiz ou alguém que perdeu a capacidade de juízo. Demonstramos que o item 10 da 4.ª edição dessa obra demonstra, sem dúvidas, que houve adulteração, e essa adulteração não permite que se conheça a realidade sobre as conclusões de Kardec.




Prece do estudante espírita

Sugiro os seguintes pensamentos, que me inspiraram, como uma prece para o bom estudante espírita. São pensamentos que julgo útil de serem refletidos antes das reuniões de estudos.

“Bons Espíritos, estou prestes a iniciar mais uma atividade de aprendizado em conjunto, com o grupo que me acolhe. Muito mais que um passatempo, entendo a profundidade desses conhecimentos, capazes de modificar, com o tempo, a mim mesmo e, de mim, a família humana ao meu redor.

Peço que meu Espírito protetor e os bons Espíritos que me guiam, que possam me inspirar, neste momento, os bons pensamentos. Espíritos de nossas mães, de nossos pais, avós, familiares ou amigos próximos; Espíritos de indivíduos que talvez eu nem me recorde, mas que talvez me sejam gratos por um mínimo bem que eu tenha lhes feito, ou solidários por minhas dificuldades e por minha vontade: que meu pensamento possa ser mais acessível às suas boas influências, afastando, assim, as influências daqueles que, infelizes, mesmo sem saberem, visam a malevolência ou a leviandade.

Neste momento, que eu possa voltar o olhar para dentro de mim, para não ser hipócrita comigo mesmo. Ajudem-me a notar minhas disposições internas, meus erros, meus maus hábitos e, quem sabe, minhas imperfeições. Que antes de dizer “mas ele”, eu me volte a mim mesmo e diga “e eu?”, de modo a ver primeiro a trave em meu olho, antes de ver o cisco no olho do outro. Que eu aprenda a não ver o mal no erro alheio, criando, assim, eu mesmo o mal, que se instala em mim mesmo. Que o “não julgueis” seja claro em minha mente, entendendo que ver o erro do outro não deve levar-me a julgá-lo por esse erro, do qual ele pode nem se dar conta e que, muitas vezes, comete tentando fazer o bem.

Ajudem-me, enfim, a não me enganar a mim mesmo. O aprendizado somente se constrói pelo esforço colaborativo, e a felicidade é não menos um esforço conjunto. Se meu propósito é aprender, para compartilhar e ajudar, que eu possa, ao aprender, aplicar primeiramente a mim mesmo as consequências do Espiritismo, fazendo o esforço que o verdadeiro espírita, aquele que entendeu a Doutrina no âmago do seu Ser, deve fazer. Assim, desejando ser boa ferramenta, que eu possa utilizar todo esse conhecimento para desenvolver melhores hábitos, substituindo os hábitos ruins; que possa aprender, dia após dia, a domar minhas emoções, contando, para isso, com a boa inspiração de vocês, Espíritos amigos, como também do grupo que me acolhe de braços abertos.

Que o orgulho e o egoísmo possam, progressivamente, deixar meu ser, sendo substituídos pela humildade e pela caridade verdadeiras. Que o personalismo não encontre lugar em minha alma. Que a vaidade não me instigue a julgar-me superior a ninguém, quando sou apenas mero aprendiz, buscando manter-me na curva do aprendizado da Lei de Deus, e que a leviandade, característica ainda de Espíritos como nós, não me leve ao descuido e à portar-me como os Espíritos pseudo-sábios, que julgam saber o que não sabem. Que os elogios não me instiguem a vaidade, que devo firmemente combater, e que as críticas não sejam tomadas senão como oportunidade de reflexão. Se eu tiver mediunidade, que eu não me julgue infalível, nem seja levado a acreditar cegamente nos Espíritos que possam se comunicar comigo ou me inspirar e que, quando eu possa ter chamada a atenção, o melindre e o orgulho passem longe de meus pensamentos.

Que os propósitos mais íntimos deste grupo ao qual me simpatizo sejam meus também, e que eu possa aprender a fazer a minha parte, carregando meus blocos para o esforço que, em conjunto, auxiliará a restaurar as bases e a reerguer o edifício da ciência espírita, para que, um dia, ela possa novamente voltar a iluminar toda a humanidade com seu facho de luz, hoje ofuscado pelo desprezo e pelo descuido.

Ajudem-me para que, saindo desta reunião, possa manter essas disposições no meu dia-a-dia, sabendo que a verdadeira prece é vivenciada todos os momentos, através da vontade, alicerçada pelo conhecimento. Intuam-me, por caridade, a lembrar-me de encontrar mais momentos para estudar essa Doutrina, substituindo o tempo ocioso pelo conhecimento do Bem, para que eu possa, afinal, tornar-me indivíduo mais útil para o grupo e para a humanidade.

Obrigado, etc…

Foto de capa por Andrea Piacquadio: https://www.pexels.com/pt-br/foto/aluna-com-dor-de-cabeca-na-biblioteca-3808057/




Os problemas da crença no nada (niilismo) e no castigo

A crença no castigo, mesmo dentro do Espiritismo (ou do Movimento Espírita) e a crença no nada levam o homem a duas situações muito complicadas. Vejamos:

Quando se crê no nada, o homem se concentra sobre o desfrute do presente, a qualquer custo. Isso é o que Kardec nos demonstra em O Céu e o Inferno (editora FEAL):

“Há algo mais desesperador do que a ideia da destruição absoluta? As afeições sagradas, a inteligência, o progresso, o conhecimento laboriosamente adquirido, tudo seria desfeito, tudo estaria perdido! Qual a necessidade do esforço para nos tornarmos melhores, para reprimirmos as paixões, para enriquecermos nosso espírito, se daí não devemos colher fruto algum, sobretudo ante a ideia de que amanhã, talvez, isso não nos servirá mais para nada? Se assim fosse, a sorte do homem seria cem vezes pior do que a do selvagem, que vive inteiramente no presente, na satisfação de seus apetites materiais, sem aspirações com relação ao futuro. Uma secreta intuição nos diz que isso não é possível.

Pela crença no nada, o homem inevitavelmente concentra seu pensamento na vida presente. Não haveria, com efeito, por que se preocupar com um futuro do qual nada se espera. Essa preocupação exclusiva com o presente o leva naturalmente a pensar em si antes de tudo; é, portanto, o mais poderoso estímulo ao egoísmo. O incrédulo é coerente quando chega à conclusão: “Desfrutemos enquanto aqui estamos, desfrutemos o máximo possível, pois, depois de nós, tudo estará acabado; gozemos depressa, porque não sabemos quanto tempo durará”, assim como a esta outra, bem mais grave aliás para a sociedade: “Desfrutemos, não importa à custa de quem; cada um por si; a felicidade, cá embaixo, é do mais astuto”. Se o escrúpulo religioso restringe a ação de alguns, que freio terão aqueles que em nada creem? Para estes, a lei humana somente alcança os tolos, e por isso dedicam seu talento a maneiras de dela se esquivarem. Se há uma doutrina nociva e antissocial, é certamente a do neantismo ((Doutrina do nada, niilismo)), porque rompe os verdadeiros laços de solidariedade e de fraternidade, alicerce das relações sociais.”

KARDEC, Allan. O Céu e o Inferno, Editora FEAL.

Algo diametralmente oposto ao pensamento niilista, glorificado em Nietzsche:

A descoberta da moral cristã é um acontecimento que não tem igual, uma verdadeira catástrofe. O pretexto sagrado de tornar melhor a humanidade surge como a astúcia para esgotar a própria vida, para a tornar anêmica. O conceito de além foi inventado para desvalorizar o único mundo que existe – para destituir a nossa realidade terrena de todo o fim, de toda a razão, de todo o propósito! O conceito de alma, de espírito, finalmente ainda de alma imortal, inventou-se para desprezar o corpo. Por fim – e é o mais terrível – no conceito de homem bom, toma-se o partido de tudo o que é fraco, doente, falhado, do que em si mesmo é passivo, de tudo o que deve perecer – a lei da seleção natural é contrariada, e faz-se um ideal a partir da oposição ao homem altivo e bem-sucedido, ao homem que diz sim, ao homem que garante e está certo do futuro – este torna-se agora o mau… E em tudo isto se acreditou como moral.

NIETZSCHE, 2008, p. 99-100

Por outro lado, quando o homem acredita na ideia da queda pelo pecado ou na vida humana como uma forma de “pagar dívidas”; em outras palavras: quando ele acredita na ideia do castigo divino, ele se torna inapto a lidar pró-ativamente com seus problemas. Uma mulher que, por exemplo, viva com um mau companheiro, que a agrida, física ou moralmente, pode crer (e muitos lhe afirmam isso) que está vivendo um “resgate” de vidas passadas. Deve, portanto, se submeter às condições desumanas, para, segundo dizem, “quitar seus débitos”.

Essa maneira de pensar é frequentemente ensinada desde os primeiros passos da criança, quando esta é submetida ao castigo, ao invés de ser instigada ao desenvolvimento pela sua própria autonomia racional. Já tratamos disso no artigo “O castigo irrita e impõe. Não educa pela razão.


O fanatismo da credulidade cria incrédulos, porque nada responde. Tira o indivíduo do controle sobre sua responsabilidade: se comete o mal, é culpa do diabo; se faz o bem, é graça divina.

O fanatismo da incredulidade, por outro lado, vai na mesma direção e produz a mesma coisa que o primeiro: o indivíduo, se faz o mal ou se faz o bem, é por conta do seu DNA.

Ambos transformam o ser em um autômato a quem resta, apenas, os prazeres mundanos, ante à perspectiva do nada ou da condenação eterna. A via intermediária, em sua excelência racional, é o Espiritualismo Racional e o Espiritismo (em sua origem). Veja esse estudo: https://www.youtube.com/watch?v=OCD2_iAQySw.


Recomendamos a todos o estudo seguinte:




Grupos de Estudos de Espiritismo pelo Mundo

Queremos criar uma rede de contatos com outros grupos, de todas as línguas, espalhados pelo mundo. Se você faz parte de um grupo de estudos do Espiritismo ou conhece algum grupo, nos ajude nessa iniciativa, cadastrando-o através de nosso formulário.

Ajude na formação dessa corrente tão importante!




Análise criteriosa das comunicações e psicografias mediúnicas

Kardec, no artigo “Exames das comunicações mediúnicas que nos enviam”, da Revista Espírita de maio de 1863, demonstra o cuidado e a seriedade que a Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas tinha com as comunicações mediúnicas que a ela eram enviadas. É uma verdadeira aula de seriedade frente à ciência espírita, por isso reproduzimo-la na íntegra:

“Muitas comunicações nos foram enviadas por diferentes grupos, já pedindo conselho e julgamento de suas tendências, já, como umas poucas, na esperança de publicação na Revista. Todas nos foram mandadas com a faculdade de dispormos das mesmas como melhor entendêssemos para o bem da causa. Fizemos o seu exame e classificação, e não fiquem admirados da impossibilidade de publicá-las todas, quando souberem que além das já publicadas, há mais de três mil e seiscentas que, por si sós, teriam absorvido cinco anos completos da Revista, sem contar um certo número de manuscritos mais ou menos volumosos dos quais falaremos adiante. A súmula desse exame nos fornecerá tema para algumas reflexões, que cada um poderá aproveitar.

Entre elas encontramos algumas notoriamente más, no fundo e na forma, evidente produto de Espíritos ignorantes, obsessores ou mistificadores e que juram pelos nomes mais ou menos pomposos com que as assinam. Publicá-las teria sido dar armas à crítica. Uma circunstância digna de nota é que a quase totalidade das comunicações dessa categoria emana de indivíduos isolados e não de grupos. Só a fascinação poderia levá-los a ser tomados a sério, e impedir se visse o lado ridículo. Como se sabe, o isolamento favorece a fascinação, ao passo que as reuniões encontram controle na pluralidade de opiniões.

Reconhecemos, contudo, com prazer, que as comunicações dessa natureza formam, na massa, uma pequena minoria. A maioria das outras encerra bons pensamentos e excelentes conselhos, mas não se negue que todas sejam boas para publicação, pelos motivos que vamos expor.

Os bons Espíritos ensinam mais ou menos a mesma coisa por toda parte, porque em toda parte há os mesmos vícios a reformar e as mesmas virtudes a pregar, e aí está um dos caracteres distintivos do Espiritismo, pois geralmente a diferença está apenas na maior ou menor correção e elegância de estilo.

Para apreciar as comunicações com vistas à publicidade, não se pode analisá-las de seu ponto de vista, mas do ponto de vista público. Compreendemos a satisfação que se experimenta ao obter algo de bom, sobretudo quando se começa, mas além de que certas pessoas podem ter ilusões relativamente ao mérito intrínseco, não se pensa que há centenas de outros lugares onde se obtêm coisas semelhantes, e o que é de poderoso interesse individual pode ser banalidade para a massa.

Além disto, é preciso considerar que de algum tempo para cá as comunicações adquiriram, sob todos os aspectos, proporções e qualidades que deixam muito para trás as que eram obtidas há alguns anos. Aquilo que então era admirado, parece pálido e mesquinho ao lado do que se obtém hoje. Na maioria dos centros realmente sérios, o ensino dos Espíritos cresceu com a compreensão do Espiritismo. Considerando-se que por toda parte são recebidas instruções mais ou menos idênticas, sua publicação poderá interessar apenas sob a condição de apresentar qualidades especiais, tanto na forma quanto no alcance instrutivo. Seria, pois, ilusão crer que toda mensagem deve encontrar leitores numerosos e entusiastas. Outrora, a menor conversa espírita era novidade e atraía a atenção. Hoje, que os espíritas e os médiuns são incontáveis, o que era uma raridade é um fato quase banal e habitual, e que foi distanciado pela amplidão e pelo alcance das comunicações atuais, assim como os deveres escolares o são pelo trabalho do adulto.

Temos sob nossas vistas a coleção de um jornal publicado no princípio das manifestações, sob o título de La Table Parlante, título característico da época. Diz-se que o jornal tinha de 1.500 a 1.800 assinantes, cifra enorme para aquela época. Ele continha uma porção de pequenas conversas familiares e fatos mediúnicos que então tinham o enorme atrativo da curiosidade. Aí procuramos inutilmente algo para reproduzir em nossa Revista. Tudo quanto tivéssemos escolhido, hoje seria pueril, sem interesse. Se esse jornal não tivesse desaparecido, por circunstâncias que não vêm ao caso, só poderia ter vivido com a condição de acompanhar o progresso da Ciência, e se reaparecesse agora nas mesmas condições, não teria cinquenta assinantes. Os espíritas são imensamente mais numerosos do que então, é verdade, mas são mais esclarecidos, e querem ensinamentos mais substanciais.

Se as comunicações emanassem de um único centro, sem dúvida os leitores multiplicar-se-iam em razão do número de adeptos, mas não se deve perder de vista que os focos que as produzem se contam por milhares, e que por toda parte onde são obtidas coisas superiores, não pode haver interesse pelo que é fraco e medíocre.

O que dizemos não é para desencorajar de fazer publicações. Longe disso. Mas para mostrar a necessidade de escolha rigorosa, condição sine qua non do sucesso. Elevando os seus ensinamentos, os Espíritos no-los tornaram mais difíceis e mesmo exigentes. As publicações locais podem ter uma imensa utilidade, sob um duplo aspecto, o de espalhar nas massas o ensino dado na intimidade, depois o de mostrar a concordância que existe nesse ensino sobre diversos pontos. Aplaudiremos isto sempre, e os encorajaremos todas as vezes que elas forem feitas em boas condições.

Para começar, convém descartar tudo quanto, sendo de interesse privado, só interessa a quem isso diz respeito, e depois, tudo quanto é vulgar no estilo e nas ideias, ou pueril pelo assunto.

Uma coisa pode ser excelente em si mesma e muito boa para servir de instrução pessoal, mas o que deve ser entregue ao público exige condições especiais. Infelizmente o homem é inclinado a supor que tudo o que lhe agrada deve agradar aos outros. O mais hábil pode enganar-se. O essencial é enganar-se o menos possível. Há Espíritos que se comprazem em alimentar essa ilusão em certos médiuns, por isso nunca seria demais recomendar a eles que não confiem em seu próprio julgamento. É nisto que os grupos são úteis, pela multiplicidade de opiniões que podem ser colhidas. Aquele que, neste caso, recusasse a opinião da maioria, julgando-se mais esclarecido que todos, provaria sobejamente a má influência sob a qual se acha.

Aplicando estes princípios de ecletismo às comunicações que nos enviaram, diremos que em 3.600, há mais de 3.000 que são de uma moralidade irreprochável, e excelentes como fundo, mas que desse número não há 300 para publicidade, e apenas cem de um mérito inconteste. Considerando-se que essas comunicações vieram de muitos pontos diferentes, inferimos que a proporção deve ser mais ou menos geral. Por aí pode-se julgar da necessidade de não publicar inconsideradamente tudo quanto vem dos Espíritos, se quisermos atingir o objetivo a que nos propomos, tanto do ponto de vista material quanto do efeito moral e da opinião que os indiferentes possam fazer do Espiritismo.

Resta-nos dizer algumas palavras sobre os manuscritos ou trabalhos de fôlego que nos mandaram, entre os quais, de trinta, encontramos cinco ou seis de real valor.

No mundo invisível, como na Terra, não faltam escritores, mas os bons são raros. Tal Espírito é apto a ditar uma boa comunicação isolada; a dar excelente conselho particular, mas é incapaz de um trabalho de conjunto completo, que suporte um exame, sejam quais forem suas pretensões. Por outro lado, o nome com o qual ele se compraz em disfarçar-se, não é uma garantia. Quanto mais alto o nome, mais obriga. Ora, é mais fácil tomar um nome do que justificá-lo. Eis por que, ao lado de alguns bons pensamentos, encontram-se, por vezes, ideias excêntricas e os traços menos equívocos da mais profunda ignorância. É nestas espécies de trabalhos mediúnicos que temos notado mais sinais de obsessão, dos quais um dos mais frequentes é a injunção da parte do Espírito de fazê-los imprimir, e mais de um pensa equivocadamente que tal recomendação basta para encontrar um editor interessado no negócio.

É sobretudo em semelhante caso que um exame escrupuloso se torna necessário, se não nos quisermos expor a aprender às nossas custas. Além do mais, é o melhor meio de afastar os Espíritos presunçosos e pseudossábios, que invariavelmente se retiram, quando não encontram instrumentos dóceis a quem façam aceitar suas palavras como artigos de fé. A intromissão desses Espíritos nas comunicações é ─ e isto é um fato conhecido ─ o maior escolho do Espiritismo. Todas as precauções são poucas para evitar as publicações lamentáveis. Em tais casos, mais vale pecar por excesso de prudência, no interesse da causa.

Em resumo, publicando comunicações dignas de interesse, faz-se uma coisa útil. Publicando as que são fracas, insignificantes ou más, faz-se mais mal do que bem.

Uma consideração não menos importante é a da oportunidade. Umas há cuja publicação é intempestiva, e por isso prejudicial. Cada coisa deve vir a seu tempo. Várias delas que nos são dirigidas estão neste caso e, posto que muito boas, devem ser adiadas. Quanto às outras, acharão seu lugar conforme as circunstâncias e o seu objetivo.”




Caridade e Espiritismo:

Quando se quer fazer o bem, a ação, sem dúvidas, é indispensável, sem esquecer que o que conta é realmente a intenção. Não porque Deus esteja anotando as intenções, mas porque é ela que conta para o aprendizado ou para o apego do indivíduo. Mas não podemos esquecer que o ideal é saber o que se faz, para não fazer errado. Vamos falar sobre Caridade e Espiritismo.

Falando em Movimento Espírita, temos, infelizmente, a prática de alguns que se colocam a julgar. De um lado, alguns que se limitam ao acúmulo do saber para si mesmos, criticam aqueles que se concentram na prática. De outro lado, alguns, que se limitam à ação, sem vontade de buscar o conhecimento, colocam-se a julgar aqueles que buscam o conhecimento, como se o saber não fosse útil. Estou aqui para mostra que ambos os extremos estão errados.

O inferno está cheio de boas intenções

Há um ditado popular que diz: “o inferno está cheio de boas intenções”. Isso significa: querendo fazer o bem, mas não sabendo o que se faz, pode-se produzir o mal. Evidente, é claro, que não há condenação senão pela própria consciência e que o indivíduo que erra querendo fazer o bem sentirá sofrimento moral muito menor do que aquele que erra querendo fazer o mal. Mas o fato que destaco é que, para fazer o bem, o ideal é que se saiba o que se faz, e é por isso que o entendimento do Espiritismo é tão importante para a compreensão real do que seja a caridade.

Há algum tempo, um grupo de jovens se reuniu para satisfazer o sonho de um amigo: pular de bungee jump, que consiste em se prender a cordas e pular de um lugar alto. Conseguiram as cordas, amarraram o amigo que, então, saltou de um precipício, para se estatelar no chão e morrer. O problema? Eles não conheciam a ciência do que estavam fazendo e não calcularam bem o tamanho da corda. Penso na culpa que cada um deles deve carregar ainda hoje.

Acumular saber sem nada fazer

Existem também os indivíduos que se concentram em acumular conhecimentos. Mas esses conhecimentos eles não aplicam nem a si mesmos, nem ao bem dos demais: eles apenas os guardam para si, de modo que, sempre que possível, possam provar que sabem mais que os outros. É o cúmulo do orgulho e do egoísmo, mas, um dia, esse conhecimento lhe será útil para agir, quando se arrepender de seus desvios.

Relato: idosa, pobre e com oito crianças para cuidar

Como relato pessoal, posso contar de um centro espírita que frequentei por muitos anos. Desde que me lembro, a prática ali é voltada ao bem, mas conforme as ideias que moldam o movimento espírita atual, como se fosse uma religião: frequentar a reunião da “casa espírita” semanalmente, ouvir a palestra, tomar um passe e ir embora. Uma vez por mês há uma reunião mediúnica para assistência de Espíritos sofredores. Fora dali, não se fala em Espiritismo e muito menos se o pratica. O Centro está esvaziado, porque não há maior interesse. Com muito esforço e superando enormes dificuldades, os participantes da casa promovem mensalmente um ato de entrega de cestas básicas para famílias necessitadas. E é isso. Essas famílias não participam de atividades da casa e não conhecem a real beleza do Espiritismo. Saindo dali, elas vão em outras instituições e igrejas buscar mais itens necessários.

Certa vez, quando por acaso eu estava presente nesse dia de entrega de cestas-básicas, notamos uma senhora que já comparecia ali há mais de dois anos. Ela estava extremamente triste. Sua situação: com quase 70 anos, perdeu dois de seus filhos em acidentes diferentes. Esses filhos a deixaram com um total de oito crianças, que ela buscava sustentar catando lixo e contando com alguma ajuda que obtinha daqui e dali.

Revoltada com Deus

Nesse dia, essa senhora estava desesperada e revoltada com Deus. Não conseguia aceitar essa situação. Se perguntava: “que Deus é esse que permite tais coisas?”. Notando isso, minha mãe e eu começamos a conversar especialmente com ela. Conseguimos fazê-la compreender que essas coisas acontecem, como parte das provas. Que talvez tenha sido algo escolhido previamente ou não, mas que, de qualquer maneira, ela estava tendo um papel tão importante na vida dessas crianças, ensinando-as o exemplo do amor, da dedicação e, sobretudo, lhes dando valores morais tão importantes. Eu lhe disse: “esses Espíritos agradecerão demais o seu empenho”, o que lhe fez brotar um novo brilho no olhar.

Além disso, organizamo-nos de diversas maneiras e conseguimos doações diversas, inclusive colchões, pois as crianças dormiam no chão.

Desse dia em diante, vimos uma nova energia dominar seu Espírito. Uma nova determinação para enfrentar essas dificuldades lhe dominou o ser. Ela deixou de lado a revolta, porque algo claro e simples lhe atendeu ao raciocínio.

A face real do Espiritismo

Esse “algo”, claro e simples, é o Espiritismo em sua essência. Não esse “espiritismo” com “e” minúsculo, afastado dos estudos científicos de Kardec e preso aos mais diversos erros nascidos da aceitação cega das opiniões dos Espíritos, quase sempre em romances mediúnicos. Não: o Espiritismo, doutrina filosófica, desenvolvida pelo método científico. “O Espiritismo não é obra que marche na sombra. Ele é conhecido; seus princípios são formulados com clareza, precisão e sem ambiguidades” (Revista Espírita, Março de 1863).

Outros poderiam erradamente dizer que essa senhora estaria “quitando” débitos de vidas passadas, o que é falso ((Ainda que ela possa ter tido ligações passadas com esses Espíritos e que, sentindo-se em débito por algo, tenha escolhido ajudá-los nesta vida, não se trata de “quitar” algo, mas sim de aprender auxiliando.)) ou, ainda, que essas crianças nasceram naquele meio para quitar suas dívidas. Esquecem-se ou desconhecem que o Espírito também escolhe tais situações para aprendizado, e não apenas para expiações (sendo as escolhas dos Espíritos que buscam se desapegar de uma imperfeição adquirida). Além disso, não refletem no que tais palavras podem fazer com uma mente já perturbada.

A questão aqui não é dizer que um faz mais que outro ou que um seja melhor que o outro. O ponto é: o Movimento Espírita, sem o conhecimento do Espiritismo, se tornou manco, incompleto, incapaz de dar a verdadeira face do Consolador Prometido. Sem o conhecimento, a caridade se torna mero assistencialismo. Quem sabe, se naquela oportunidade dada por Deus, não tivéssemos dado atenção àquela senhora ou não tivéssemos condição de dizer algo melhor, ela poderia ter continuado revoltada ou se amargurado mais ainda, para, quem sabe, tomar atitudes lastimáveis, abalada por nossas palavras?

Fora da Caridade não há salvação

Quando Kardec estipulou esse estandarte do Espiritismo, “fora da caridade não há salvação”, ela fazia um contrapeso à frase da Igreja Católica, que dizia que “fora da Igreja não há salvação”. Mas não apenas isso: ele definia exatamente o princípio de caridade pelo Espiritismo, como meio de salvação, sendo o esforço próprio em fazer o bem ou voltar para ele.

O que é a caridade para o Espiritismo? É o dever moral. É a ação pelo bem, que não espera recompensas. E fazer o bem é desejar ser útil ao próximo, auxiliando e sendo auxiliando, aprendendo e ensinando. Ora, como ser realmente útil, sem saber o que se faz? Poderíamos, desejando ser úteis, amarrar cordas nas pernas do outros, para empurrá-la de um barranco, sem medir o tamanho dessa corda.

Sempre tenho destacado, porque eu mesmo passei por isso, como aquela senhora também passou e como muitos outros também passaram: nos momentos mais difíceis de nossa vida, nos mais avassaladores, nossa consciência busca respostas racionais para o que passamos. E a fé, como bem dizia Kardec, quando não pode encarar a razão, esmorece. Muitos se afastam da religião e de qualquer espiritualidade quando isso acontece.

Repito o que disse Kardec sobre o Espiritismo: “seus princípios são formulados com clareza, precisão e sem ambiguidades“. Foi o conhecimento desses princípios, adquiridos apenas após trinta e três anos vivendo no Movimento Espírita, que me permitiram dar palavras claras, simples e racionais àquela senhora. Foi esse conhecimento que me permitiu sair de uma depressão, por um trabalho longo e ininterrupto de estudo.

Conclusão

O que pretendo demonstrar, enfim, é que o Espiritismo é uma doutrina científica que nos dá o conhecimento para errar muito menos, fazendo o bem com mais assertividade e transmitindo menos ideias erradas. Hoje, olho para trás e vejo incontáveis exemplos de pessoas que se afastaram do Movimento Espírita por conta das falsas ideias que dominam esse meio, que se tornou uma religião como todas as outras.

Aquecer um ser que passa frio; dar-lhe alimento para não sucumbir pela fome; água para matar-lhe a sede: todas são ações de caridade necessárias e inadiáveis. Mas e sobre auxiliá-lo a mudar suas disposições interiores pelo entendimento, coisa que o Espiritismo consegue com clareza inigualável? E sobre acolhê-lo, ouvindo suas queixas, suas dores, para então dar-lhe uma ideia de uma filosofia que permite ver a vida de outra maneira, clara e racional, além de simples? Afinal, a muitos que estão nessas condições, falta a vontade, muitas vezes justamente por crerem que estão assim por castigo.

A ideia original do Espiritismo é muito mais clara, racional e clemente. Ela reflete a bondade da justiça divina. A caridade, segundo o Espiritismo, é algo simples e profundo: consiste fazer o bem sem esperar retorno. Afastarmo-nos desse conhecimento tem nos tornado pouco úteis ou até mesmo danosos em nossas falas e em nossas ações, mesmo quando aspiramos fazer o bem.




Kardecismo: um termo impróprio

Muitos adeptos do movimento espírita utilizam o termo “kardecismo” ou “kardecista” para se referirem à sua “religião” ou “crença”. Em apenas uma frase, já temos três erros, com os quais podemos começar.

Espiritismo é ciência

Em primeiro lugar, é importante destacar que o Espiritismo é uma ciência. Como tal, é uno. Poderia ter ramificações de áreas de estudos, como a Física tem a Física Quântica, a Mecânica, a Ótica, etc. Mas a Física é uma só, como o Espiritismo é um só. Falar em “kardecismo” seria como deixar de falar em Física para falar em newtonismo ou einsteinismo, o que seria um erro, já que Newton e Einstein foram pesquisadores que, com método científico, estudaram a Física e geraram suas teorias científicas. Allan Kardec fez o mesmo.

Dizer “kardecismo” é dar uma personalidade à ciência espírita, reduzindo-a à expressão das ideias de Kardec, o que é falso. Kardec foi o pesquisador responsável por centralizar os estudos, sim, e são suas obras que formam a Doutrina Espírita como é conhecida. Mas é necessário lembrar que suas obras são fruto de um trabalho coletivo e colaborativo. Kardec nunca se deu o direito de dominar a verdade.

Os outros erros seriam tratar o Espiritismo como religião, o que não procede, ou como crença, o que seria rebaixá-lo do nível de ciência e transformá-lo em mera crendice. É necessário distinguir aquilo que nasce da crença cega naquilo que alguém diz, da “crença” nascida do raciocínio científico. São coisas diferentes.

Movimento Espírita se tornou religião

Infelizmente, importa destacar que aquilo que se tornou o Movimento Espírita se tornou crendice e religião. Para grande parte dos espíritas modernos, Kardec tem o mesmo peso que Jesus nas religiões presas ao Velho Testamento: fala-se em seu nome, para dar credibilidade, mas conhece-se apenas a superfície, preferindo-se ficar com as distorções.

Conclusão

Ao ser questionado sobre minha religião, não diga ser espírita, kardecista, etc. Se você tem uma religião, diga sua religião e diga que, além disso, estuda o Espiritismo. Se você não tem religião e estuda a ciência espírita, diga: “não tenho religião: estudo a ciência espirita”.