Os banquetes magnéticos

No artigo em questão, conforme apresentado na Revista Espírita de junho de 1858, Kardec fala a respeito de um banquete anual, em Paris, em comemoração ao aniversário de nascimento de Mesmer.

Nesse banquete haviam dois tipos de “partidários”: aqueles que zombavam do Espiritismo, se esquecendo que a própria ciência que eles abraçavam – e destaco a palavra porque, de fato, era uma ciência estabelecida e reconhecida na época – havia, por sua vez, enfrentado o mesmo tipo de escolho que, naquela época, o Espiritismo também enfrentava e, de outro lado, aqueles que, mesmo que não professassem o Espiritismo, eram da opinião que deveria ser respeitado como uma ciência de sua importância.

O texto, em si, não vai muito além disso, em profundidade. Aproveitamo-lo apenas para destacar alguns pontos importantes:

 – O Magnetismo era uma ciência várias vezes citada por Kardec mas nunca aprofundada, pois, em seu contexto, estava plenamente estabelecida e compreendida. Jamais poderia ele imagina que ela viria a ser colocada no esquecimento, por um forte movimento materialista futuro.  

– Mesmer foi um cientista controverso por muito tempo. Por muitos, foi pintado como louco ou enganador. Atualmente, porém, está sendo resgatada sua verdadeira face: a de um sábio, bastante culto, que formulou a primeira teoria sobre o Fluido Cósmico Universal e sua influência na saúde humana.  

– “Através” de Mesmer, inúmeros pacientes se curaram das mais diversas moléstias, apenas pela vontade, num momento em que a medicina fazia sangrias e cirurgias a sangue-frio, procedimentos dos quais poucos sobreviviam.

– O Magnetismo e o Espiritismo são ciências irmãs. Uma sem a outra fica incompleta, manca.  

– Sugerimos a todos a leitura, apenas iniciada por nós, do livro “Mesmer: a ciência negada do magnetismo animal”, por Paulo Henrique de Figueiredo.




O Suicida da Samaritana

Nesse artigo, Kardec faz a evocação de um Espírito que havia cometido o suicídio do corpo apenas 6 dias antes. Conforme se pode verificar no texto original, esse homem não foi reconhecido por ninguém, tendo sido enterrado como indigente. É possível levantar várias considerações sobre esse artigo.

“O telefone só toca de lá pra cá”

A primeira dessas considerações, colocaríamos, é a respeito da própria evocação: numa época em que reina o mote “o telefone só toca de lá pra cá”, que tem um fundo de razão, mas que é repetido de forma irrefletida por tantos, nos deparamos com a base doutrinária do Espiritismo, erigida em grande parte sob evocações – ou seja, o telefone também toca daqui pra lá. Apenas que, como num telefone, quem vai atender e se vai atender é o problema da questão, sempre abordado por Kardec.

O sofrimento do suicida

É importante entender que o Espírito do suicida não sofrerá castigos divinos por um pecado cometido – não dessa forma. Qualquer Espírito sempre terá o perdão e novas chances, pois tudo parte da ignorância relativa a Espíritos em evolução.

Existem infinitas variantes entre cada caso, do que resulta que existem infinitos efeitos relacionados a cada caso, porque, essencialmente, tais efeitos estarão ligados à mentalidade geral do Espírito que comete o suicídio. Enquanto alguns se jogarão num verdadeiro inferno, por acreditarem terem cometido pecado, outros poderão até se verem aliviados, num primeiro momento – porque depois, quando realmente entender tudo, muito provavelmente lastimará a vida desperdiçada.

De qualquer forma, conforme atesta São Luis, compreendemos que o primeiro efeito para todo suicida – ou, pelo menos, para a maioria deles – haverá uma grande dificuldade para se desligar do corpo, dada a violência do ato, seu estado mental e o fato de o corpo ainda estar saturado de vitalidade. Isso, contudo, é apenas o que podemos afirmar de momento, com base no que entendemos do artigo, pois, realmente, é um assunto que requer desenvolvimento e maiores investigações.

Também é importante destacar que o Espírito não sofre nenhum tipo de dor física. É sempre sua moral, sua consciência, que externaliza e coloca em fatores externos a dor que está, na verdade, dentro de si mesmo. O suicida (como outros Espíritos), portanto, poderá afirmar sofrer de frio ou sede, quando, na verdade, ele está sofrendo moralmente, e não fisicamente. Na verdade, nós mesmos fazemos isso, com a diferença que, através dos processos psicossomáticos, podemos desenvolver danos ou doenças reais no corpo físico.

É por isso que, quando entramos em contato com qualquer Espírito em sofrimento, podemos e devemos travar conversação natural e sadia com ele, esclarecendo sobre tais pontos. É de enorme ajuda para eles entenderem que o sofrimento é moral, interno, e não externo e imposto.

O vale dos suicidas

De forma curta e grossa: não existe “o” vale dos suicidas, assim como não existe “o” inferno. É importante que o Espírita aprenda a tirar de seu imaginário esse tipo de conceito e, sobretudo, de espalhá-los para outro, pois bem sabemos que, como Espírito não muito esclarecido, nós buscamos ambientes e outros Espíritos que estejam de acordo com a nossa mentalidade que, aliás, plasmam em conjunto esses ambientes de sofrimento. Portanto, quando um Espírito sofredor fala que está “no” inferno, age como um encarnado que, numa situação muito difícil para ele, se expressa da mesma forma, com a diferença que o Espírito plasma, sozinho ou em conjunto, o seu próprio inferno.

Uma vez mais, é muito importante buscar esclarecer tais Espíritos, quando em contato com ele.

Sobretudo, é importante lembrar que não existe tão conexão fatídica entre um suicídio e o exílio do Espírito em um “vale”, como uma penalidade.

Os efeitos do suicídio sobre a encarnação seguinte

Há algo muito errado no meio espírita em geral, atualmente, e que não é doutrinário – na verdade, é algo antidoutrinário, nascido da falta de estudo da Doutrina: é fazer as deprimentes afirmações de que tal indivíduo nasceu sob tais provas ou deformações porque na vida anterior fez isto ou aquilo.

No caso em particular, sobre o suicídio, há uma terrível afirmação feita por aí: a de que o indivíduo que hoje tem problemas físicos assim o é porque estaria “resgatando” um suicídio cometido na vida anterior. Irmãos, essa afirmação é criminosa, porque:

  1. Afasta as pessoas que, sofrendo na pele ou tendo uma pessoa querida nessas situações, se sentem (com razão) ultrajadas por esse tipo de afirmação.
  2. É falaciosa, porque não se baseia na realidade: nós sabemos, sim, que para todo efeito existe uma causa, mas não nos cabe sondar as provas de cada um, tanto por imposição da caridade, que devemos praticar, quanto porque um Espírito pode escolher um corpo deformado não só como prova, a fim de tentar se livrar de uma imperfeição, mas também como missão frente a outros Espíritos ou também como oportunidade de aprendizado de outras virtudes que ainda sinta necessidade de exercitar. De qualquer forma, é sempre uma escolha consciente do Espírito, não o efeito de uma mecânica divina de pecado e castigo. Notemos, aliás, que em todas as comunicações espirituais estudadas até agora, eles sempre asseveram, mesmo para o caso do louco monomaníaco, que a prova é o resultado de uma escolha prévia e pessoal.

O suicídio não se combate pelo medo

Lembramos, enfim, que o suicídio jamais será combatido pela imposição do medo de um sofrimento, mas, sim, através do esclarecimento. Apresentemos a tais indivíduos a essência do Espiritismo. Tentemos levá-los ao seguinte raciocínio:

Dores e alegrias são passageiras, relativas à vida encarnada. A felicidade, que é o que realmente buscamos, somente será atingida após deixarmos para trás nossas imperfeições – já que, por exemplo, alguém muito preocupado, ou muito ansioso, ou muito raivoso, ou muito ciumento, ou muito orgulhoso, ou muito sensual, etc, não consegue ser realmente feliz. Para tanto, no plano espiritual, ao ficarmos cientes de nossas imperfeições, planejamos vidas com oportunidades e com dificuldades, às vezes bastante pesadas, que, ao nosso julgamento, poderão nos ajudar a vencer tais imperfeições. Portanto, desistir de uma vida, com a extinção da própria vida corpórea, não resultará em nenhum avanço, pois, não havendo aproveitado justamente a prova difícil para o aprendizado, não teremos nos aperfeiçoado e, portanto, precisaremos – por nossas próprias vontade e constatação – reiniciar uma nova vida, carregando um fardo talvez ainda maior, pela sensação de culpa causada pela desistência e, quem sabe, pelos efeitos funestos que tal ato pode causar nos Espíritos encarnados que nos cercam.

Ninguém está dizendo que é fácil. Cada um sabe onde o calo aperta e, quando aperta, dói bastante. Mas precisamos aprender a separar dores físicas de dores morais, nos colocando, ante a nós mesmos e ante ao Criador, desnudos de qualquer máscara de egoísmo ou vaidade e de todas as imperfeições que destas nascem. Precisamos buscar, em cada dura prova, como também nas fartas oportunidades que nos são apresentadas, as necessidades profundas que temos de aprendizado e, não esquecendo que jamais estamos sozinhos, confiar nos bons Espíritos, que não nos abandonam, para atravessar tais momentos difíceis.

Aqui, aliás, surge um último pensamento, sustentado pelo Espiritismo: Deus não nos dá um fardo maior do que aquele que podemos carregar. Na maioria das vezes, a vida nos apresenta oportunidades que nos permitiriam aprender de forma muito mais “leve”, mas nós, quase sempre, movidos pelo orgulho, tentamos vestir uma máscara nos nos confunda de nós mesmos e, assim, escolhemos deixar de lado o caminho reto, a fim de nos enveredarmos pelos caminhos sinuosos e tortuosos das paixões (não falando aqui em amor, mas no sentimento profundo provocado pelas sensações). É assim, por exemplo, que muitos escolhem deixar de lado o estudo do Espiritismo, que tanto pode alavancar nossa evolução, para viver a vida na preguiça.

Portanto, aproveitemos as oportunidades que a vida nos oferece para nossos aprendizado e evolução. Algumas vezes, elas são espinhosas, escolhidas por nós mesmos; de outras, são campos de relva suave e macia, cheia de ensinamentos dados pelo amor. Cabe a nós reconhecê-los.

NOTA: Esta evocação está no livro O Céu e Inferno de Allan Kardec, primeiro relato do capítulo V – Suicidas , da Segunda Parte. Vale a leitura do capítulo V inteiro com vários relatos de evocações de suicidas com muitas considerações do autor.




O caminho é sinuoso, longo, pedregoso e cheio de espinhos, mas temos que trilhá-lo

Prezados amigos, irmãos que a esta iniciativa se afeiçoam,

Convidamos uma vez mais a cada um de vocês à participação ativa em nosso grupo e à disseminação das ideias essenciais do Espiritismo que, aos poucos, começam a ser redescobertas e entendidas. É do interesse e da responsabilidade de todos nós a restauração, pacífica e paciente, mas persistente e firme, das verdades originais desta Doutrina nascida da observação racional dos ensinamentos espíritas dados por toda a parte e por todos os tempos! Não mais um Espiritismo adulterado, após a morte de Kardec, a fim de dar espaço às ideias retardantes de pecado, queda e castigo, de carma, de resgates, mas a Doutrina em sua essência, baseada na constatação do livre-arbítrio, da escolha das provas e das expiações, enfim, a Doutrina que nos evidencia que nosso passo se dá em direção sempre do aprendizado e do progresso espiritual, fazendo parte dessa jornada os erros e tropeços de cada um, a mesma Doutrina que nos mostrou, em sua essência, não uma alma criada pura e que se desviou pelo pecado, um Espírito criado simples e ignorante e que, conforme vai avançando em suas experiências, através de erros e acertos, de alegrias e de sofrimentos, vai se depurando de suas imperfeições e de sua materialidade em direção à felicidade verdadeira dos Espíritos superiores, já desgarrados dessas mesmas imperfeições e materialidade através da aquisição de melhores hábitos e valores morais.

Natural, contudo, que tais ideias libertadoras e renovadoras encontrem resistência tanto na ignorância orgulhosa, fechada à reforma das ideias, quanto no conhecimento interessado em manter sob suas rédeas a classe de fiéis às velhas doutrinas. Mesmo dentro do Espiritismo as tais ideias de queda, pecado e resgate estão profundamente enraizadas, já que as adulterações vêm desde poucos meses ou anos após a morte do digno professor Rivail.

Não será à base de guerras e disputas, contudo, que desvendaremos esse caminho cheio de sarças e espinhos, mas à base da compreensão lúcida e da palavra firme mas amistosa. Guardemo-nos de perder tempo com esses que compõem as classes acima destacadas, porque uns e outros não tem o menor interesse em modificar suas ideias frente à verdade irrefutável. Para esses, apenas o tempo surtirá efeito. Invistamos nosso tempo, contudo, na classe de todos aqueles aos quais essas ideias não apenas agradem, mas aos quais sejam substanciais: os que já não veem gosto na vida, os que pensam em dela desistir, os que não compreendem um Deus vingativo, os que, enfim, não entendem os motivos das dificuldades do dia-a-dia, ou ainda àqueles que, de boa vontade, desejam estudar o Espiritismo em sua essência, a fim de transmitir, a todos que puderem, as ideias reformadoras e consoladoras dessa Doutrina em sua originalidade.

Levantemos as mangas, portanto, queridos irmãos. A inação não faz bem a ninguém. Façamos a nossa parte. Eu, autor deste texto, estou aqui, hoje, por um Espírito muito amado que me estendeu a mão no momento mais difícil da minha vida e por outro, encarnado, que insistiu em, diariamente e sem agradecimentos quaisquer, divulgar uma reflexão espírita em um grupo de WhatsApp que estava e ainda está esquecido do motivo de terem formado uma família no centro espírita que, por conta da pandemia, agora se encontra fechado.

Basta um gesto, muitas vezes, para mudar uma vida, uma opinião, e, daí em diante, iniciar um movimento. Avante, prezados, e que Deus nos ilumine a todos para que, nesse processo, não nos deixemos contaminar jamais pelo personalismo, pela vaidade, pelo egoísmo e pelo orgulho.

O caminho é sinuoso, longo, pedregoso e cheio de espinhos, mas temos que trilhá-lo e limpá-lo para as próximas gerações, das quais provavelmente voltaremos a fazer parte.




ANOMALIAS E DEFORMIDADES SOB A ÓTICA ESPÍRITA

Anomalias e deformidades diversas. Cretinismo, deficiências mentais, físicas, intelectuais. Ao questionar o porque de tais complicações físicas, no meio espírita, quantas vezes já não ouvimos: “é porque fulano está resgatando uma dívida passada”. E por quanto tempo nos confortamos com essa maldosa e caluniosa afirmação, feita de forma genérica?! Mas hoje não mais.

Após a constatação irrefutável das alterações das duas obras finais – e fundamentais – de Allan Kardec, O Céu e o Inferno e A Gênese[1], pudemos verificar que tais conceitos nunca fizeram parte da Doutrina dos Espíritos, sendo ela originalmente e essencialmente baseada no livre-arbítrio, ou seja, na capacidade de escolha de cada um. Contudo, tais ideias ainda enfrentam grande resistências, pois muitos são aqueles que vem de uma criação, inclusive espírita, que afirma os conceitos de queda, pecado, castigo, resgate, carma, etc.

O artigo de mesmo título, apresentado no Blog Letra Espírita, acerta em muitos pontos, mas traz também esse tipo de conceito (da dívida e do resgate), em certo ponto, quando se utiliza de uma afirmação de Suely C. Schubert (“O Espírito enfermo, endividado“) e também quando se utiliza de um texto de O Céu e o Inferno, baseado na 4a edição, adulterada.

Ação e Reação – o que é isso?

Uma coisa é identificar, como Kardec constatou na lei das reencarnações sucessivas, que todo efeito tem uma causa, e que, quase sempre, essa causa se encontra nas vidas anteriores. Outra coisa, muito distinta, é afirmar que toda ação moralmente negativa terá uma reação com a finalidade de castigar a ação original a fim de reparar um suposto pecado. Isso, no âmbito da Doutrina Espírita, é uma falácia. Ação e reação é uma lei material, da física, e não uma lei moral. Tanto é que não existe tal lei dentre aquelas apresentadas em O Livro dos Espíritos.

Resgate?

Infelizmente, muitos espíritas e espiritualistas modernos insistem em pregar na cabeça das pessoas que suas dores, dificuldades e tragédias atuais são “resgates” de dívidas passadas, esquecendo-se de que, se por um lado o Espírito pode se impor um sofrimento com a finalidade de vencer as imperfeições que o fizeram cair anteriormente, por outro também podem se impor duras provas que não tem nada a ver com erros passados, mas apenas como oportunidades riquíssimas para aprendizado de virtudes e para vencer aspectos relacionados a imperfeições que nada tem a ver, diretamente, com o gênero de provas escolhidas. Assim, um Espírito pode escolher a cegueira apenas para poder lidar com a necessidade de depender do auxílio de outros, e não porque tenha cegado alguém em vidas anteriores. Aliás, os porquês NÃO NOS CABE SONDAR: cabe-nos apenas sermos caridosos e auxiliar no caminho de todos.

Dívidas?

Precisamos compreender que o Espírito “endividado” não está endividado com Deus nem com qualquer lei, mas, sim, perante a si mesmo, e por acreditar-se assim (isso é muito importante). Por conta de todos termos as Leis divinas em nossas consciências – fato que nos faz Espíritos portadores do livre-arbítrio – desque não estejamos em negação, nossa própria consciência nos acusa dos erros cometidos, sobre os quais nos culpamos, bem como nos indica as imperfeições que nos causam dor moral. É assim que um Espírito que, na encarnação anterior, tenha animado um homem rico e egoísta, muitas vezes escolhe a pobreza na próxima encarnação, a fim de não se enveredar pelo caminho difícil e tão cheio de responsabilidades que as riquezas terrenas trazem.

Eu disse “acreditar-se assim” (endividado) pois, quando o Espírito realmente entende que o que houve foi um erro, natural de sua ignorância e de suas imperfeições, e que essas imperfeições e ignorância o fazem sofrer, deixa de se acreditar pecador e merecedor de castigo para se entender Espírito em evolução, buscando, então, novas provas e expiações que lhe deem oportunidade de aprender e se livrar de suas imperfeições, desenvolvendo melhores virtudes. Outrossim, também entende que todos são passíveis de erros e, então, para de se colocar na condição de cobrador e vingador. Isso é substancial, e é para isso que, essencialmente, o Espiritismo veio.

Não estamos dizendo, com isso, que não existem consequências físicas que o Espírito perturbado faça aparecerem sobre seu corpo, já que sabemos das relações psicossomáticas que guardamos com nosso corpo. Mas estamos afirmando, com base no estudo do Espiritismo em sua originalidade, que NÃO PODEMOS olhar para um indivíduo com deficiências quaisquer e afirmar que isso se dá por que ele é um Espírito “endividado”, tanto quanto NÃO PODEMOS (porque seria um erro tanto factual quanto moral) dizer a uma mãe que perdeu seu filho queimado num incêndio que “isso aconteceu porque seu filho deve ter sido um soldado no tempo de X que queimava pessoas”. Isso é terrível, causa revolta e afasta as pessoas do Espiritismo, fato sobre o qual responderemos – frente à nossa própria consciência.

Baseando-se em um erro, produz-se outro erro

Por fim, quero destacar que o artigo em questão comete o erro – provavelmente involuntário, por ausência de informação – de basear-se na versão adulterada de O Céu e o Inferno, posto que já está devidamente e inegavelmente provado que a 4a edição da obra, trazendo profundas mudanças no pensamento original, não foi encomendada senão após a morte de Kardec, sem falar que o estudo comparativo cuidadoso dessas mudanças indicam que o conteúdo foi modificado justamente de inserir os conceitos de pecado e castigo que nunca estiveram na Doutrina dos Espíritos e que, embora Kardec possa ter apresentado algum pensamento anterior no sentido dessa crença, na obra original, da primeira à terceira edição (que são as mesmas) concluia justamente no sentido oposto.

Veja, nesse sentido, as diferenças entre o original e o que consta na 4a edição:

[ORIGINAL]
“Os deficientes mentais são seres punidos na Terra pelo mau uso que fizeram de faculdades poderosas. Eles têm a alma encarcerada num corpo cujos órgãos são incapazes de expressar seus pensamentos. Esse mutismo intelectual e físico é uma das mais cruéis punições na Terra. Muitas vezes ela é escolhida pelos espíritos arrependidos que querem EXPIAR suas faltas”

[4a Edição]
“Os cretinos são seres punidos na terra pelo mau uso que fizeram de poderosas faculdades; sua alma está aprisionada num corpo cujos órgãos impotentes não podem expressar seus pensamentos; esse mutismo moral e físico é uma das mais cruéis punições terrestres; frequentemente ela é escolhida pelos Espíritos arrependidos que querem RESGATAR suas faltas”

Notem que o sentido muda totalmente quando se fala em “resgatar” e quando se fala em “expiar”. Como diz Paulo Henrique de Figueiredo,

“Para explicar as leis da alma segundo o Espiritismo, enquanto cristianismo redivivo, restaurando a verdadeira mensagem da autonomia, como o fez Jesus, Allan Kardec vai ressignificar termos como punição, arrependimento, expiação, reparação, eternidade das penas. A diferença entre punição e expiação é o ponto primordial para se compreender a teoria moral do Espiritismo. Pois, enquanto a punição é uma resposta natural a qualquer pensamento ou ato que vai de encontro à lei moral presente na consciência, a expiação se dá por um esforço consciente, voluntário e eficaz para superar a própria imperfeição, por meio da escolha das provas. As religiões ancestrais invertem o significado desses fenômenos, confundindo dogmaticamente castigo com expiação, como se fossem uma só coisa. Além disso, consideram que a punição é uma escolha deliberada de Deus e não uma consequência natural.”

Figueiredo. Nem céu nem inferno: As leis da alma segundo o Espiritismo

Também há algo muito, mas MUITO importante em praticamente TODAS as comunicações desse tipo, por parte dos Espíritos: a palavra ESCOLHA. Sim, existem provas, existem expiações e existem punições, até das mais severas, mas são sempre ESCOLHAS do Espírito. Veja que, mais à frente, na mesma mensagem, o Espírito repete:

“[…] Alguns revoltam-se contra seu suplício voluntário, lamentando tê-lo escolhido e sentindo um desejo furioso de voltar a uma outra vida, desejo que os faz esquecer a resignação com a vida presente e o remorso da vida passada que guardam na consciência”. (O Céu e o Inferno, 3a Edição)


[1] Consultar as obras O Legado de Allan Kardec, de Simoni Privato, e Nem céu nem inferno: As leis da alma segundo o Espiritismo, por Lucas Sampaio e Paulo Henrique de Figueiredo




“Tenho como saber quem eu fui em outras vidas? Como posso saber o que vim resgatar nessa minha jornada?”

Não é necessário.

O véu do esquecimento tem sua razão de ser e, muitas vezes, saber da outra vida traz mais atrapalhação do que solução. É algo que jamais uma pessoa séria fará, mas, infelizmente, existem os indivíduos mais interessados em ganhos e que, de forma irresponsável, se lançam a esse tipo de “trabalho”.

Ao observar a si próprio com um olhar bastante crítico e honesto, verificando nossas próprias imperfeições, podemos facilmente identificar aquilo que nos coloca em dificuldades frente às situações da vida, entendendo, então, que essas situações difíceis são justamente oportunidades, muitas vezes planejadas por nós mesmos, a fim de vencermos essas imperfeições e avançarmos em direção à felicidade verdadeira.

Por fim, destaco que, segundo a Doutrina Espírita, não existe “resgate”, não existe pagamento de dívidas, não existe, nesse sentido, o “carma”: o Espírito, consciente e livre, escolhe provas e expiações (e oportunidades) com a finalidade exposta acima – vencer imperfeições e adquirir virtudes – não sendo nunca, jamais, as dificuldades da vida o resultado de uma mecânica divina, conceito este ligado ao dogma da queda pelo pecado. O único Espírito que não escolhe suas provas é o Espírito em estado de negação, que ainda assim reencarna, mas que apenas vive uma vida que, por si só, frente aos conteúdos desse indivíduo, trará dificuldades e dores morais, que um dia o farão sair da negação e voltar a buscar enfrentar essas imperfeições através das escolhas conscientes.

Portanto, ao enfrentar uma prova difícil, não pense “estou pagando por algo ou resgatando algo do passado”, mas sim “é uma difícil mas importante oportunidade de aprendizado. Vou tirar dela o máximo possível”. E, para tanto, entender o Espiritismo a fundo é substancial!




Espiritismo e karma (ou carma), castigo, pecado e punição

Convidamos ao leitor a assistir com muita atenção a esse estudo em grupo, com a participação de Paulo Henrique de Figueiredo. É uma grande modificação na nossa forma de pensar, ainda tão arraigada nos velhos conceitos da heteronomia (a culpa é do outro). Karma (ou carma), ação e reação, resgate de débitos, todos são temas que jamais fizeram parte do Espiritismo. Está na hora de entendermos isso!




Evocação de Espíritos na Abissínia

O Império Etíope, também conhecido como Abissínia, foi um império que ocupou os presentes territórios da Etiópia e da Eritreia, existindo desde aproximadamente o ano de 1270 (início da dinastia salomónica) até 1974, quando a monarquia foi deposta por um golpe de estado. Portanto, ainda existia na época de Allan Kardec.

Kardec abre o artigo citando uma narração de James Bruce (1730 – 1794), um explorador e escritor escocês, em sua obra Voyage aux sources du Nil, em que diz estar estarrecido com as práticas de bruxaria e evocação do diabo praticadas pelo rei de Gingiro, pequeno reinado na parte meridional de Abissínia.

Kardec assinala que, tivesse Bruce conhecido o Espiritismo, veria que não havia ali nada de absurdo (no que tange às evocações). Além disso, seria um povo que, com certeza, guardou grande número de tradições judaicas e algumas ideias rudimentares do Cristianismo em que, por falta de conhecimento, sorveram a ideia do diabo, não entendendo que eram para Espíritos inferiores que faziam seus sacrifícios.

Dois embaixadores que Socínios, ao rei da Abissínia, enviou ao papa, por volta de 1625, e que tiveram de atravessar o Gingiro. Foi, então, necessário que fosse pedido ao rei uma audiência para que a caravana atravessasse seu território. Aconteceu de o rei estar em cerimonial e determinou que o embaixador e seu acompanhante esperassem oito dias para a audiência com ele. Findo o prazo, a comitiva foi recebida.

A área central em laranja corresponde ao território abissiniano.

O que Kardec cogita é que a tão pouca distância ainda havia degradação e ignorância em se fazer tudo mediante consultas a Espíritos estando tão perto dos principais centros intelectuais. Mescla essa ideia com a temperatura local que, sendo quente, poderia ser potencializada em climas frios. Compara os etíopes, que abrangem quase toda a Abissínia, com os gingiranos que nem adoram o diabo, nem pretendem ter com ele qualquer comunicação; bem como não sacrificam homens em seus altares; enfim, entre eles nenhum traço se encontrava dessa revoltante atrocidade.

Nosso codificador continua a censura ao afirmar que o rei de Gingiro sacrificava ao diabo, naquela época de comércio escravo, os pobres coitados que teriam o destino de serem degredados, dado à proximidade daquele reino com o mar, pois, afastados da costa, sua segurança era garantida.

Como vimos, o Sr. Bruce é o narrador da história e, se ele tivesse visto aquilo que hoje testemunhamos, nada de assombroso acharia na prática das evocações usadas em Gingiro. Ele só viu nelas uma crença supersticiosa, enquanto nós encontramos a sua causa no fato de manifestações falsamente interpretadas, que puderam produzir-se lá como em outros lugares documentados.

Para terminar o artigo, ao sacrificar seres humanos, Kardec conclui, com total confiança à luz do Espiritismo, que não podiam atrair ao seu meio Espíritos superiores. Atribui-se à credulidade o fato de os povos bárbaros cultuarem a um poder maléfico os fenômenos que não podiam explicar, pois tratava-se de um povo bastante atrasado moral e espiritualmente.




Sobre “o caso A Gênese”

Este artigo foi inspirado pelo artigo “O caso A Gênese“, apresentado no Portal Luz Espírita. Nesse artigo, bastante extenso, são apresentados diversos detalhes, passo a passo, que levam afinal o autor, Ery Lopes, e os colaboradores — Adair Ribeiro, Adriano Calsone, Carlos Luiz, Carlos Seth Bastos, Jorge Hessen e Wanderlei dos Santos — a assumir que, não, a Gênese não foi adulterada e que podemos fiar confiança total de que a 5.ª edição, segundo eles editada e impressa em 1869, foi sim uma versão impressa por Allan Kardec.

Devo reconhecer que o artigo tem o mérito de ter tentado se manter imparcial, apresentando inclusive os trabalhos de Simoni Privato, em O Legado de Allan Kardec, onde apresenta uma enorme coleção de provas e de evidências das adulterações.

Em que ponto, então, o artigo passa a assumir que tais adulterações não existem e que todas as evidências estão erradas? Principalmente a partir do item 37 — “As pistas do Catálogo Racional — o qual reproduzo abaixo:

Nesse quadro, apresentam-se algumas pistas, obtidas através da análise da obra Catálogo Racional, que teria tido sua primeira edição distribuída em 1 de abril de 1869, um dia após a morte de Allan Kardec:

  1. Há uma citação à obra La clef de la vie (A chave da vida), de Michel de Figagnères, sobre a qual Kardec teria feito um comentário reportando-se aos itens 4 a 7 do capítulo VIII de A Gênese. O item 7, porém, A Alma da Terra, apenas passou a existir a partir da 5ª edição dessa obra.
  2. Logo a seguir, apresenta-se a evidência de que a obra Os quatro evangelhos, de Roustaing, já teria sido citada pelo próprio professor Rivail nessa primeira edição do Catálogo, diferentemente do que algumas pessoas teriam dito, supondo que tal citação apenas teria se dado por adulteração. 

Há, porém, uma informação muitíssimo importante que se deixou de fora neste ponto: a referência de Kardec aos itens 64 a 68 do capítulo XV de A Gênese. Acontece que o item 68 apenas existiu até a 4.ª edição dessa obra, transformado em item 67 a partir da 5.ª edição, quando o item 67 original foi retirado. Esse item era muito importante, por tratar da questão de que a desaparição do corpo de Jesus, até então, seria assunto não solucionável, pela ausência, até então, da sanção do duplo controle da confirmação pela lógica rigorosa e pelo ensinamento geral dos Espíritos, e sua retirada parece muito estratégica, se considerarmos que as ideias contrárias, vindas de Roustaing, não tinham como se sustentar, pela ausência desse duplo controle.

Ora, por que essa contradição nas referências de Kardec? Por que teria ele, simultaneamente, se referido, em um ponto, a um item que ainda seria inserido em A Gênese, na 5a edição, enquanto que, em outro, se referia a um item que dela seria retirado, na mesma edição?

A lógica me leva pelo seguinte caminho:

  • Kardec já havia preparado a impressão do Catálogo Racional, mas ainda estava em vias de finalizar a impressão de A Gênese, que ainda estava, ao que tudo indica, nos estágios finais de reimpressão para correções e edições.
  • No Catálogo, Kardec faz referência a um item que ainda não existia em A Gênese (Cap. VIII, item 7) e outro que, a partir da 5a edição conhecida, deixou de existir (item 68). Isso pode demonstrar que Kardec, no Catálogo, faria referência a um item da nova edição de A Gênese, e que manteria a referência ao item 68, citado acima. Um provável adulterador, determinado a retirar o importantíssimo princípio da sanção do duplo controle, não notou o problema.
  • O Catálogo já havia sido encomendado e impresso com o conhecimento de Kardec, mas isso não significa que ele seria prontamente distribuído. Muito provavelmente, pela lógica dos fatos, ele esperaria a impressão da nova versão de A Gênese.

Suponho, também, pela lógica dos fatos, que a 5ª edição de A Gênese, por nós conhecida, foi baseada em alterações sobre os nos clichês do próprio Allan Kardec, visto que, nessa edição, o item 7 do capítulo VIII apresenta conteúdo em conformidade com o estilo e com o pensamento do próprio (a meu ver). Assim, as alterações que conhecemos, suponho, não são todas adulterações, mas a hipótese de adulteração fica muito evidente por todas as provas e evidências já apresentadas, até hoje, e pela simples análise de alguns pontos alterados ou suprimidos, que destoam do pensamento, do estilo e dos propósitos de Kardec e, sobretudo, do ensinamento dos Espíritos durante toda a primeira fase do Espiritismo.

Adiciono que não vejo nenhum motivo para Kardec não ter citado a obra de Roustaing em seu Catálogo, visto que ele próprio sugere, logo abaixo à recomendação, que o leitor busque melhores esclarecimentos em A Gênese, nos itens mencionados. Aliás, na 5.ª edição de A Gênese, há uma referência à Revista Espírita de setembro de 1868, pág. 261, que se refere ao mesmo tema contido no item 7 da primeira obra: A Alma do Mundo.

Mais uma evidência que mostra que as alterações na 5.ª edição de A Gênese não são totalmente resultados de adulterações, embora, inclusive sobre esse item, eu não possa afirmar se teria sido, além de introduzido, também adulterado, visto que o trecho que na 5.ª edição de A Gênese finaliza o item 7 do cap. VIII, continua, na Revista Espírita, de uma forma muito importante: “O Espiritismo seria, com razão, ridicularizado por seus adversários, se se fizesse o editor responsável por utopias que não resistem a um exame. Se o ridículo não o matou, é porque só mata o que é ridículo.

Sobre a afirmação muito comum de que algumas cartas confirmam a impressão da 5.ª edição da obra pelas mãos do próprio Kardec, já abordei o caso no artigo “As adulterações nas obras de Kardec e o “CSI do Espiritismo” (clique aqui para ler).

O que quero afirmar com tudo isso é que, sim, é um assunto bastante profundo e complexo, com muitas informações cruzadas a serem analisadas sob uma metodologia muito racional, lógica e verdadeiramente imparcial. Infelizmente, parece que muitas pessoas tentam se agarrar desesperadamente a qualquer evidência de que as adulterações não ocorreram e, ao agirem assim, deixam de analisar os fatos com todo o cuidado que o assunto merece.

Sempre repito: o conteúdo apresentado nas obras “O Legado de Allan Kardec” e “Nem céu, nem inferno” é completo e profundo demais para ser tomado como se fosse apenas um erro qualquer, baseado em informações incompletas ou falsas. Ainda assim, se há espaço para dúvidas, que as demais informações sejam analisadas com o máximo de critério científico, como o próprio Kardec nos ensinou e, enquanto não possam ser sanadas, fiquemos na segurança das obras indubitavelmente impressas de seus próprios punho e bolso.

Quero, por fim, destacar o seguinte: uma das provas mais utilizadas para afirmar que a 5a edição foi de autoria integral do próprio Kardec, a tal 5a edição de 1869, apresenta em sua capa, como endereço de impressão, o novo endereço da sede da Sociedade Espírita Parisiense: “Librairie Spirite et des Sciences Psychologiques”, em “7, rue de Lille”.

Sabemos que Kardec morreu antes do estabelecimento da Sociedade no novo endereço, o que comprova que tal edição somente foi impressa após sua morte. Leia mais clicando aqui.




Autonomia, a moral do novo mundo

Vivemos em um mundo até agora dominado pelos conceitos de heteronomia. Para bem entender esse conceito, precisamos analisar a etimologia da palavra: heteronomia é formada do radical grego “hetero” que significa “diferente”, e “nomos” que significa “lei”, portanto, é a aceitação de normas que não são nossas, mas que reconhecemos como válidas para orientar a nossa consciência que vai discernir o valor moral de nossos atos. Esse entendimento é fundamental.

O mundo heterônomo

No mundo heterônomo, nós atribuímos tudo a algo externo: a culpa está no diabo ou no obsessor, o efeito está na ira divina e a reparação está na imposição carmática. Tudo, absolutamente tudo no mundo heterônomo, vem como imposição externa, através de leis que respeitamos por obrigação, e não por entendimento. E na ausência dela ou de seus atores, nos vemos sem limites e sequer sem amor-próprio.

A heteronomia é algo inerente e talvez mesmo necessário a uma condição de pouco avanço espiritual, quando, sem o entendimento mais profundo dos mecanismos da vida e da evolução, somos forçados a atender, por medo, às imposições de leis divinas, humanizadas, ou mesmo das leis humanas, divinizadas. Infelizmente, como já sabemos, também é algo extensamente utilizado pelas religiões para manter o controle sobre seus fieis. Mas isso é algo que, conforme podemos constatar, vai se modificando conforme o avanço do Espírito humano, tanto em ciência quanto em moralidade.

Um grande problema do conceito da heteronomia, ou, antes, da crença nele, é que ele entrava por certo tempo a evolução do Espírito: ora, se o indivíduo acredita que suas dificuldades na vida são um castigo imposto por Deus, ele apenas aceita seus efeitos, de forma submissa (o que, sim, é importante), mas sem fazer nada para se modificar. Aguarda apenas o fim de suas provações. Nem mesmo a caridade pode ser realmente entendida e praticada em um contexto heterônomo, pois o indivíduo pratica a caridade esperando um retorno, sem entender que ela é uma obrigação moral e natural do ser pensante.

Outro ponto muito problemático é que quando o indivíduo acredita no castigo divino — e, pior ainda, no castigo eterno — é muito comum que perca qualquer limite após cometer um erro. Com certeza o leitor já ouviu inúmeras vezes a afirmação: “já vou para o inferno mesmo, então, um pecado a mais, tanto faz”.

Mas nos enganamos se pensamos que o conceito heterônomo se encontra apenas nas religiões. Infelizmente, mesmo no meio espírita, tal conceito também se infiltrou, sobretudo com a adulteração das obras O Céu e o Inferno e A Gênese, de Allan Kardec. Se hoje ouvimos constantemente, da boca de espíritas, as palavras “carma”, “lei de ação e reação”, “resgate”, isso se dá em grande parte por essas adulterações, passadas de geração em geração e que hoje fazem muitos de nós, espíritas, ainda acreditarmos que o “carma” faz eu renascer nessa vida para “resgatar” um erro passado.

Vejamos bem: é justamente uma das mais sérias adulterações em O Céu e o Inferno que incutiu esse pensamento heterônomo, que atrasa o avanço do Espírito, no seio de uma Doutrina que era totalmente voltada à autonomia do ser. No capítulo VII, item 9 da obra citada, vamos ler: “Toda falta cometida, todo mal realizado é uma divida contraída que deverá ser paga; se não for em uma existência, será na seguinte ou seguintes”. Esse item não existia até a morte de Kardec, sendo que só apareceu em novas edições feitas mais de dois anos após a morte do Professor.

Não — insisto em dizer: no Espiritismo não existe carma, nem “lei de ação e reação” e, muito menos, “resgate”. São conceitos que, no fundo, tem o mesmo efeito da crença no castigo divino.

A Autonomia

Oposta ao conceito da heteronomia, a autonomia (auto — de si mesmo) coloca o indivíduo como peça central em sua evolução. Depende de sua vontade, única e exclusivamente, tanto suas ações, quanto seus pensamentos e os Espíritos atraídos ou repelidos por estes.

No conceito da autonomia, que não nasceu com o Espiritismo, mas que foi por essa Doutrina ampliado — e demonstrado — o Espírito é senhor de si mesmo e de suas escolhas desde o momento em que desenvolve a consciência e, com isso, passa a ter o livre-arbítrio. Escolhe, assim, entre bem e mau, ou melhor, escolhe sobre formas de agir frente às situações e se felicita ou não com seus efeitos. Contudo, quando o efeito é negativo, não significa que está sendo efetivamente castigado por um Deus punitivo, mas sim que está sofrendo as consequências morais de suas ações. E essas consequências morais só existem para o Espírito que já tem consciência de sua existência, razão pela qual os animais, por exemplo, não as tem.

É assim que, avaliando as consequências de nossos atos e, quando mais conscientes, as imperfeições morais que nos levam a cometer erros, nos impomos, a nós mesmos, vidas cheias de provas e de expiações, com o fim de tentar nos livrarmos dessas imperfeições, a partir do aprendizado:

“Uns, portanto, impõem a si mesmos uma vida de misérias e privações, objetivando suportá-las com coragem”, quando desejam conquistar paciência, resignação ou saber agir com poucos recursos. Outros desejam testar se já superaram as paixões inferiores e então “preferem experimentar as tentações da riqueza e do poder, muito mais perigosas, pelos abusos e má aplicação a que podem dar lugar”. Aqueles que lutam contra os abusos que cometeram, “decidem a experimentar suas forças nas lutas que terão de sustentar em contato com o vício” (O Livro dos Espíritos, p.220).

É claro: ao praticar o mal contra Espíritos Inferiores, teremos uma hipótese quase garantida de recebermos, em troca, a vingança; mas essa vingança, se houver, é efeito da escolha do outro Espírito, e não de uma reação “carmática” de uma suposta “lei de ação e reação” — que, aliás, é uma lei da Física Newtoniana, e não divina. Ao praticar a vingança, o outro Espírito também erra, pois dá margem ao hábito de suas imperfeições e, por isso, pode entrar em um círculo de erro e vingança com o outro que pode durar séculos. Quando isso não ocorre — e esse é o ponto-chave — o efeito é apenas o Espírito que erra permanecer por mais tempo afastado da felicidade dos bons Espíritos, por conta de suas próprias imperfeições.

Não existe “lei de ação e reação” no Espiritismo

Muitas pessoas, apegadas a velhos conceitos do passado, se sentem perplexas com tal afirmação, mas qualquer um que se tenha colocado dedicadamente a estudar o Espiritismo consegue perceber que a moral autônoma, em tudo, é colocada bastante clara aos nossos olhos, através da concordância universal dos ensinamentos dos Espíritos. O que ganhamos ao fazer o bem? Avançaremos mais rápido. E o que sofreremos ao praticar o mal? Ficaremos mais tempo retidos à inferioridade espiritual e à roda das sucessivas encarnações em mundos inferiores.

O Espiritismo nos demonstra que, ao entrarmos no círculo da consciência, passamos a versar sobre nossos próprios destinos, sendo que as provas e as expiações que enfrentamos na atual encarnação se devem às nossas próprias escolhas, realizadas antes de encarnarmos, ainda que muito difíceis, posto que, em estado de Espírito errante (libertos do corpo), avaliamos de forma muito mais clara nossas imperfeições e, assim, escolhemos oportunidades, ainda que sofridas, para aprendermos e nos elevarmos. O Espiritismo, aliás, quando bem compreendido, favorece muito a que tomemos melhores escolhas, pois paramos apenas de desejar a expiação de erros passados, numa mecânica de pecado e castigo, e passamos a escolher oportunidades que nos levem mais a fundo a aprender e a desenvolver melhores hábitos, abafando as imperfeições que tenhamos transformado em hábitos.

Já abordamos um caso bem típico, extraído da Revista Espírita, que trata da questão das escolhas do Espírito quanto às suas provas, tratado por Kardec na evocação do assassino Lemaire, na edição de março de 1858.

Outro caso bastante interessante é o de Antônio B, que, tendo emparedado viva sua esposa na vida anterior, não sabendo lidar com essa culpa, planejou uma encarnação onde terminou enterrado vivo, após ser pensado morto. Acordou no caixão e lá dentro padeceu horrivelmente até sua morte, como se tivesse “pagado” aquela dívida com sua própria consciência. O que realmente interessa nesse caso é que, efetivamente, em vida, foi um homem probo e bom, e não precisaria desse fim trágico para “quitar” qualquer coisa.

Uma prova racional de que não existe tal “lei”: se um Espírito inferior praticar o mal contra um Espírito superior, o que ele receberá em troca? Nada além de compreensão e amor. O próprio exemplo do assassino Lemaire nos demonstra isso. Onde estaria então o retorno? Num outro Espírito que Deus designaria para sua “vingança”, para “cobrar uma dívida”, tornando-o, assim então, também um Espírito em débito para com a Lei?

Não, prezado irmão: não existe retorno senão na constatação, cedo ou tarde, por parte do próprio Espírito, de que ele não é feliz enquanto for imperfeito. Claro, precisamos também lembrar: o Espírito se encontra no meio em que se apraz, e atrai para si os Espíritos de mesma vibração. Portanto, poderá até se sentir alegre, mas jamais será feliz o Espírito que, por suas predisposições, só atrai para si Espíritos inferiores. Nisso também consiste uma espécie de castigo.

A razão explica, conduz e conforta

A maior característica do Espiritismo é ser uma Doutrina científica racional, cuja teoria nasceu da observação lógica dos fatos e dos ensinamentos dos Espíritos. Ora, em se tratando de Deus, qual seria a razão de ele nos punir com castigos, sendo que ele nos criou e sabe que nossos erros nascem de nossas imperfeições? Não há racionalidade nisso. É como se puníssemos nossas crianças por errarem contas de matemática ou por colocarem o dedo na tomada: em ambos os casos, a dor ou a sensação de ficar para trás é a punição em si mesma e, ao adicionarmos a isso uma punição adicional, estamos apenas condicionando o ser a não pensar e apenas a ter medo de errar — e, portanto, a ter o medo de tentar.

Falávamos da razão: pois é por ela, principalmente, que o Espiritismo nos conduz a melhores escolhas evolutivas. Ao entender profundamente a Doutrina, deixamos de fazer escolhas por conta de imposições ou expectativas externas, seja porque “Deus quer”, porque “Jesus espera”, ou porque “o diabo assombra”. Passamos a fazer melhores escolhas, com uma vontade mais ativa, quando entendemos que, quanto mais tempo dermos margem às nossas imperfeições ou à nossa materialidade, mais tempo demoraremos para sair dessa “roda de encarnações” dolorosas e embrutecidas.

Também esse entendimento é um grande remédio contra o suicídio: não mais o vemos com as concepções de pecado e castigo — que ainda são divulgados e defendidos até no meio espírita — mas, sim, com o entendimento racional: se sou Espírito inferior, cheio de imperfeições, significa que a vida é rica oportunidade de aprendizado. Encurtá-la por minha escolha, além de ser uma enorme oportunidade perdida, será apenas perda de tempo, pois me verei, em Espírito, imperfeito como sou, talvez de forma ainda mais escancarada, e terei que voltar e recomeçar uma nova existência para poder aprender e me livrar das imperfeições que me impossibilitam de me tornar mais feliz.

A expiação explicada à luz da Doutrina Espírita

Define assim Kardec, em Instruções práticas sobre as manifestações espíritas, de 1858:

EXPIAÇÃO — pena que sofrem os Espíritos em punição de faltas cometidas durante a vida corpórea. Como sofrimento moral, a expiação se verifica no estado errante; como sofrimento físico, no estado de encarnado. As vicissitudes e os tormentos da vida corpórea são, ao mesmo tempo, provas para o futuro e expiação para o passado.

Parece, por esse texto, que Kardec então defendia que, sim, pagamos na vida atual pelos erros passados? Não exatamente. Não podemos esquecer que, para a Doutrina Espírita, a autonomia, ou o Espírito como ator central de tudo, é a peça-chave de tudo. Portanto, mesmo no caso da expiação, é algo que consiste na escolha do próprio Espírito, com o intuito de buscar superar uma imperfeição adquirida:

A duração do castigo está subordinada ao aperfeiçoamento do espírito culpado. Nenhuma condenação por um tempo determinado é pronunciada contra ele. O que Deus exige para pôr fim aos sofrimentos é o arrependimento, a expiação e a reparação – em resumo: um aperfeiçoamento sério, efetivo, assim como um retorno sincero ao bem.

KARDEC, Allan. O Céu e o Inferno. Tradução por Emanuel G. Dutra, Paulo Henrique de Figueiredo e Lucas Sampaio. Editora FEAL, 2021.

E, para bem entender o uso dos termos castigo e punição, por Allan Kardec, é necessário entender o contexto filosófico do Espiritualismo Racional, no qual ele estava inserido. Já falamos sobre isso no artigo “Punição e recompensa: você precisa estudar Paul Janet para entender Allan Kardec“.

Contudo, bem sabemos que “os tempos são chegados” e que o planeta Terra deixará, lentamente, de ser um planeta de provas e expiações para ser um mundo de regeneração, onde deverá haver encarnações um pouco mais felizes do que as atuais. Usemos, um momento, a razão para avaliar tudo isso que temos exposto até aqui:

Se a Doutrina Espírita, nos ensinando a moral autônoma, nos traça melhores rumos e melhores escolhas, pensemos: o que ensina mais ao indivíduo? Um sofrimento de mesmo gênero e mesmo grau, como no caso de Antônio B, acima, ou, entendendo as imperfeições que nos levaram a praticar o mal, em primeiro lugar, uma vida cheia de oportunidades, muitas vezes bastante desafiadores e trabalhosas, de exercitarmos o aprendizado e a prática do bem?

Entende onde estamos chegando? Tudo, absolutamente tudo, depende de nossas escolhas frente à nossa capacidade de entendimento consciente de nós mesmos, e, nisso, o estudo do Espiritismo nos alavanca em vários degraus.

É por isso que o mundo vai deixar de ser um mundo de provas e expiações: porque os Espíritos que aqui encarnam passarão a escolher melhor suas encarnações, deixando de aplicar a si mesmos a lei de talião (olho por olho, dente por dente) para, então, cuidarem de desenvolver hábitos morais mais saudáveis. Até nisso contatamos que tudo parte do indivíduo para fora, e não o contrário.

Conclusão

Portanto, irmãos, avante: estudemos o Espiritismo de forma aprofundada e, hoje sabendo das adulterações em O Céu e o Inferno e A Gênese, estudemos as versões originais (já disponibilizadas pela FEAL) de modo a não mais perdermos tempo com conceitos heterônomos e, sobretudo, de modo a não mais repetirmos, no meio Espírita, as lastimáveis afirmações como aquelas que dizem que “fulano nasceu com problemas mentais porque está pagando por um erro na vida passada”. Isso, além de ser um erro absurdo, afasta as pessoas do Espiritismo.

Veja um exemplo:

Pasmemos: essa frase não é de Kardec. Nem parece ser sua, nem pode ser encontrada em NENHUMA de suas obras. Essa é uma prova a mais do quanto o Espiritismo foi invadido por falsas ideias, quase sempre antidoutrinárias.

Nossas provas são ricas oportunidades, quase sempre escolhidas por nós mesmos, sendo impostas apenas nos casos em que não temos condições conscienciais para tais escolhas e, mesmo assim, se dão por ação de benevolência de Espíritos superiores, e não como castigo divino.

A alma ou Espírito sofre na vida espiritual as consequências de todas as imperfeições que não conseguiu corrigir na vida corporal. O seu estado, feliz ou desgraçado, é inerente ao seu grau de pureza ou impureza. (O céu e o inferno).

O maior castigo que há está em continuarmos por eras incontáveis nos arrastando na lama de nossas imperfeições. Isso já é o bastante.


Nota: o nome do artigo vem do texto de mesmo título, que serviu de inspiração a este, do livro Autonomia: a história jamais contada do Espiritismo, de Paulo Henrique de Figueiredo.

Sugestões de estudos

Sugerimos ao leitor os seguintes conteúdos complementares:




O Período Psicológico

Kardec traz à reflexão o fato de que o Espiritismo entrava, passados os momentos iniciais de manifestações puramente materiais, no Período Psicológico.

Discorda, todavia, que a Ciência humana estaria encerrada: muito longe disso, ainda teria muito a se desenvolver, no futuro.  

Para melhor entender o artigo, precisamos entender o significado de Psicologia no contexto de Allan Kardec e no contexto atual.

A Psicologia atual

A Psicologia, nos dias atuais, de característica terapêutica materialista, tem 3 vertentes:

Behaviorismo
Tem como objeto de estudo o comportamento. Essa teoria psicológica defende que a psicologia humana ou animal pode ser objetivamente estudada por meio de observação de suas ações, ou seja, observando o comportamento.  Os Behavioristas acreditam que todos os comportamentos são resultados de experiência e condicionamentos.

Psicologia da forma (Gestalt)
É uma doutrina da psicologia baseada na ideia da compreensão da totalidade para que haja a percepção das partes.  A proposta deste modelo é associar praticas cognitivas com as emoções e sentimentos do paciente, para que ele possa enxergar novos meios de encarar as situações difíceis da vida.

Psicologia analítica (Psicanálise)
Psicologia analítica, também conhecida como psicologia junguiana ou psicologia complexa, é um ramo de conhecimento e prática da Psicologia, iniciado por Carl Gustav Jung. Ela enfatiza a importância da psique, do inconsciente, dos arquétipos e do processo de individuação.

A Psicologia no contexto de Kardec

No contexto de Kardec, a Psicologia não tinha a característica terapêutica materialista de hoje: ela era uma ciência moral, espiritualista, inserida no contexto do Espiritualismo Racional, e seu principal objetivo era investigar e analisar as leis naturais que regem a natureza humana, inclusive de forma experimental.

Nesse contexto, a Psicologia compreendia o ser humano como um ser constituído de corpo e de alma. A alma, que sobreviveria ao corpo, era a causa primária da psique, não sendo esta um efeito apenas material de química e estímulos.

Antes de Allan Kardec, ou antes do Espiritualismo Racional, a filosofia tradicional tratou da alma de forma especulativa, por meio de sistemas criados por pensadores como Platão, Aristóteles, Leibniz e Kant. O advento da psicologia experimental abriu novo caminho: o das ciências filosóficas, que o Espiritismo vem complementar. Nas palavras de Allan Kardec:

O Espiritismo, a seu turno, vem dar a sua teoria. Ele se apoia na psicologia experimental; ele estuda a alma, não só durante a vida, mas após a morte; ele a observa em estado de isolamento; ele a vê agir em liberdade, ao passo que a filosofia ordinária só a vê em união com o corpo, submetida aos entraves da matéria, razão pela qual muitas vezes confunde causa e efeito

 Allan Kardec – R.E. – Maio de 1864

A psicologia é a ciência que estuda os processos mentais (sentimentos, pensamentos, razão) e o comportamento humano. Deriva-se das palavras gregas: psiquê, que significa “alma” e logia, que significa “estudo de”.

E de que forma o Espiritismo estuda a alma? Através dos fenômenos espíritas que, contudo, não são mais estudados apenas pelo entretenimento ou pela curiosidade, mas, justamente, com o fim de investigar as leis naturais que regem a natureza humana!

E por que tudo isso acabou?

O fim do período psicológico, ou, antes, o crepúsculo das Ciências Filosóficas, segundo Paulo Henrique de Figueiredo, se deu por conta da união do poder da Igreja com o Estado Ditatorial, que eram hostis ao esclarecimento da sociedade e contra a doutrina liberal defendida pelo Espiritualismo Racional.

Importa dizer: o liberalismo nesse contexto não diz respeito a uma liberdade desenfreada, fruto do egoísmo, mas sim a uma liberdade conduzida pela razão e iluminada pela consciência.

Aliado a isso, um forte movimento materialista começa a se levantar na Alemanha, por volta de 1860, e acaba por invadir a França, onde destitui as Ciências Morais da cátedra oficial.

E no Brasil? O Espiritualismo Racional, que formou a primeira escola filosófica estabelecida no país e que chegou a ser implantado na estrutura curricular de ensino, também se deparou com

 […] condições adversas que os primeiros indivíduos conscientes da teoria original enfrentaram quando pretenderam criar um movimento espírita brasileiro. Uma Igreja combativa, lutando para manter seus privilégios e o poder que se esvaía desde o Segundo Império. E uma corrente científica materialista, embalada pelos pensamentos retrógrados de Comte e dos fisiologistas alemães, como Vogt, Moleschott, Virchow e Büchner. A corrente espiritualista racional, bravamente defendida pela liderança de Gonçalves de Magalhães e Porto-Alegre, que se tornaram divulgadores do magnetismo animal e depois do Espiritismo, apesar de contagiar professores e estudantes de seu tempo, logo foi silenciada e esquecida. Em realidade, não foi possível estabelecer em nossas terras o cenário favorável que Kardec encontrou na França

Paulo Henrique de Figueiredo – Autonomia: a história jamais contada do Espiritismo

O resultado disso tudo é o que vemos hoje: uma sociedade totalmente materialista, voltada aos prazeres da carne e esquecida da espiritualidade, amedrontada ante a vida e desesperada ante o túmulo!

O que esperar para o futuro?

Apenas o melhor, porque, da mesma forma que o Espiritualismo Racional nasceu em oposição ao materialismo da época, vivemos agora um fervilhar de iniciativas como a nossa e ainda melhores, que, com certeza, produzirão, em alguns anos, frutos importantíssimos para esta época de mudanças que atravessamos!

Lembra Kardec, com o que encerramos o artigo:

Esses excessos, entretanto, têm a sua utilidade, a sua razão de ser. Eles assustam a sociedade, e o bem sai sempre do mal; é preciso o excesso do mal para fazer sentir a necessidade do melhor, sem isto o homem não sairia de sua inércia

(KARDEC, [RE] 1868, p. 201)