E essa resistência, como anda?

E então, meu amigo, como anda essa resistência? Sim, essa mesma, de mergulhar sobre Kardec. Não mentiremos: não é fácil. Mas quem disse que aprender é fácil? Leva tempo e esforço, sim. Ah, falta tempo? Será que falta, mesmo? E esse tempo que você deve estar gastando vendo vídeos no Facebook ou no Instagram? Não, de forma alguma dizemos que relaxar de mente “vazia” não seja importante, sobretudo após um longo dia de trabalho… Mas será que não daria para encaixar uma leitura antes de dormir? Meia horinha, que seja, já ajuda muito. Ah, você aprende melhor ouvindo? Resolvido: hoje, os aplicativos como Google Books e Amazon Alexa fazem leitura instantânea, em voz, para você.

Não, de forma alguma nos colocamos na condição do aluno exemplar. Longe disso. Tem gente que está muito mais à frente, muito mais envolvida, muito mais dedicada. Mas cada um faz o que pode. A questão é que o “não posso”, muitas vezes, simplesmente dá lugar à ocupação inútil do tempo… E você já conhece aquele ditado: “mente vazia é oficina do diabo”. Não do diabo, propriamente, mas vai saber o tipo de companhia que nos rodeia quando nossa mente está apenas mergulhada nessa materialidade do dia-a-dia…

Será que, no fundo, o que existe não é uma resistência? Analise-se — não precisa contar para ninguém. Será que o que existe não é uma acomodação, porque é mais fácil acreditar no pouco que se sabe — nas próprias luzes, diria Kardec — ou naquilo que te dizem? Bom, aqui temos uma má notícia: a Criação é fundamentada na autonomia, e só existe um ser no espaço universal capaz de te fazer progredir — e não é Deus: é você mesmo. O progresso, porém, é feito de dois componentes: inteligência e moral. Para o Espírito progredir em moral, é necessário haver inteligência — não essa inteligência de um Einstein, mas a inteligência que raciocina, baseada em conhecimentos. E eis que a Doutrina Espírita, formada pelo estudo científico de Kardec (sim, científico) nos trouxe um conhecimento incrivelmente profundo e transformador.

Sim, eu sei: ler romances e histórias sobre lugares fantásticos é muito gostoso e ativa a imaginação. Mas será que a ausência dos estudos de Kardec, preferindo os romances, não se deve também a uma resistência de sua parte, ligada, quem sabe, a uma pontinha de orgulho em imaginar que detém a verdade — sobretudo quando se estudou essa “verdade” por décadas a fio?

Sim, eu também sei: é uma droga estar errado. Ninguém gosta de se constatar em erro. Mas, ei!, é assim mesmo: a evolução é baseada em tentativa e erro, ou em acerto. “Errar é humano”. O problema é se apegar ao erro. E, outra má notícia: ao estudar Kardec, sim, veremos que estamos, muitas vezes, apegados a uma série de erros flagrantes. Sim, é chato verificar que gastamos longas décadas aprendendo Espiritismo do jeito errado, mas, bem, quem não erra? Além disso, muito dificilmente teremos errado por vontade. Muitas vezes, a própria força das circunstâncias nos leva a isso: crescemos no meio, que aprendeu também da forma errada. O que tínhamos ao nosso alcance era o produto dessa cultura. Ok, acontece.

Não, a finalidade do Espiritismo não é a mediunidade, sobretudo essa mediunidade que só serve como telefone à espera de um chamado, bem como não é analisar a vida alheia para identificar se fulano está passando por tal dificuldade por ter, como muitos supõem, “chutado cachorro” na vida passado. Não.

Então, chegando a esse ponto, eu novamente pergunto: e essa resistência? Por que essa resistência? Os próprios Espíritos superiores — sim, também sinto dizer, mas a gente está bem lá no fim da fila, bem no primeiro degrau da escala evolutiva consciente — eles próprios dedicam um esforço muito grande, por caridade desinteressada, por dever moral, para nos ajudar a compreender. E a codificação está aí para isso. Mas — caramba, outra má notícia! — não basta ler O Livro dos Espíritos como código sagrado, nem abrir O Evangelho Segundo o Espiritismo aleatoriamente, seguindo as comunicações dos Espíritos como tábua da salvação, sem raciocinar. Não, sinto dizer. Espiritismo é ciência e, como ciência, é progressiva.

– Quer dizer que os Espíritos não deram algo pronto para seguirmos?

Não, de forma alguma, nunca. E isso está muito bem demonstrado naquela tal publicação que você certamente já ouviu falar, mas continua resistente em estudar: a Revista Espírita. Pois é. Essa publicação mensal, de 1858 a 1869, foi elaborada por Kardec com uma finalidade muito sábia: após O Livro dos Espíritos, ele precisava de uma forma de disseminar o conhecimento, ao mesmo tempo em que pudesse firmar correspondência com gente de toda parte, recebendo, assim, de toda parte, as confirmações ou as negações das comunicações dadas isoladamente pelos Espíritos. A Revista Espírita era o laboratório de Kardec, onde podemos compreender muito bem a formação da Doutrina Espírita, culminando, enfim, nas suas duas obras finais — O Céu e o Inferno e A Gênese.

Então, novamente, por que a resistência em estudá-la? Sim, já disse: eu sei que não é fácil, sobretudo se for sozinho, mas hoje temos a facilidade da comunicação instantânea pela Internet. Será que é mesmo assim tão impossível encontrar uma horinha da semana para um estudo em grupo? Reflita. Mas já adianto: não existe professor de Espiritismo. Cada um tem a liberdade de tomar conclusões racionais sobre o que conhece, sem dar, contudo, palavras finais sobre o que não está estabelecido. Isso não passaria de opinião, e opinião não é ciência, nem constrói nada além de erros religiosos, no sentido aqui abordado.

Mas será que essa resistência é medo? Medo de se ver em erro? Medo de perceber que já falou coisas erradas para outras pessoas? Medo, talvez, de notar que agiu errado e afastou pessoas da Doutrina, por expressar coisas erradas? Talvez? Bem, medo de se flagrar em erro é apego, e é uma capa protetora para algo muito mais profundo: o orgulho. Já dissemos: todo mundo erra. De nossa parte, você não faz ideia de quanto já erramos! Mas, de nossa parte, podemos dizer: como é bom perceber o erro em tempo, reconhecê-lo e, quem sabe, retomar contato com essas pessoas, dizendo: “eu estava errado, e tudo ou quase tudo o que eu te disse sobre o Espiritismo era falso. Veja, esta é a realidade.”.

No caminho da evolução, sempre haverá tempo. Nunca será tarde. Mas o apego nos faz viver por mais tempo afastados da felicidade. Fomos ensinados que estamos aqui pagar dívidas, como se a encarnação fosse um castigo? Bom, se o Espiritismo não apenas diz, mas demonstra o contrário, que ótimo! Fomos ensinados sobre uma vida plenamente material no mundo dos Espíritos, mas o Espiritismo demonstra ser isso uma ilusão do Espírito apegado? Bom, então não quero desenvolver esse apego! Fomos ensinados que não podemos evocar, mas apenas aguardar a comunicação dos Espíritos, às quais tomamos pela verdade, mas o Espiritismo demonstra que não é assim que funciona? Bom, então vamos corrigir e nos colocar no caminho novamente. Fomos ensinados que só se pratica Espiritismo no centro, mas Kardec demonstra uma realidade totalmente oposta — resguardada a necessidade de seriedade, conhecimento e propósito para isso? Bom, vamos perseguir essa realidade.

Podemos dizer, de nós: não temos medo de atestar nossa ignorância. Na verdade, o que tem se desacortinado à nossa frente sobre o Espiritismo, a nós, que mal podemos nos dizer estudantes aplicados, é maravilhoso, é empolgante, afasta o sobrenatural, derruba o misticismo e mostra que o Espiritismo tem uma profundidade nunca antes compreendida.

Vamos estudar? Estamos aqui para ajudar com o que pudermos! Quer dicas? Quer estudar conosco? Quer criar um canal de dúvidas e debate sobre aquilo que cada grupo estuda? Quer sugestões de como e por onde começar? Estamos aqui. Estamos longe de possuirmos o modelo ideal que se aplique a qualquer situação, mas já passamos por algum aprendizado, nesses quase dois anos de estudos. Conte conosco.

O estudo da Revista Espírita, logo no primeiro ano, desconstrói muitos erros inseridos no meio espíritas, sendo o mais sério e presente deles o hábito de nos guiar cegamente pelas opiniões de Espíritos isolados, mas também nos mostra muitas verdades antes desconhecidas, além de nos deixar com muitas dúvidas sobre outras coisas, dúvidas essas que somente serão respondidas com o estudo continuado dessa obra. Por isso a recomendação de que ninguém se coloque na posição de ter a palavra final, nem de tomar conclusões precipitadas. Conjecturar, com base em conhecimentos prévios, não é proibido. Chegar a conclusões distintas, também não é proibido. O que importa é buscar a construção conjunta do entendimento, em cooperação, e não em disputa. O importante é que o único meio de conhecer o Espiritismo é esse: estudando Kardec, de preferência de posse do conhecimento do contexto científico no qual a Doutrina Espírita se desenvolveu (vide Obras Recomendadas).

Você já parou para refletir sobre as oportunidades perdidas? No dia-a-dia, tendemos a esquecer que não estamos esquecidos, e que existe um bom Espírito frequentemente nos inspirando. Quantas vezes será que ele já não te levou ao contato de estudos importantes, e quantas vezes será que você já não deixou de lado essa oportunidade? Dizemos isso de nossa própria parte.

Então, chega de resistência, chega de culpar o que é externo, e vamos estudar?


Ps: não custa dizer que, na ilustração da capa, o diabinho é nosso próprio apego, que nos conduz ao mal, e não uma figura externa qualquer. Da mesma forma que escolhemos, por nossa própria vontade, não ouvir os bons conselhos dos Espíritos superiores, escolhemos ouvir ou não ouvir os maus conselhos dos Espíritos imperfeitos que afeiçoam a nós pelos nossos apegos.