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Ao iniciante espírita, disse assim uma colega:
– Comece pelas obras do Kardec. Depois Chico Xavier com André Luiz! Os livros do Luiz Sérgio também possuem grandes informações do mundo espiritual.
Ao que respondo:
– Se o “comece por Kardec” for realizado com um estudo sério, por anos a fio, passando inclusive pela Revista Espírita, ótimo, pois assim o indivíduo poderá entender e identificar os erros trazidos nas comunicações isoladas, a ponto de, por exemplo, compreender que Vale dos Suicidas, umbral e a Nosso Lar não passam de uma ilusão ou de uma criação de Espíritos em perturbação. Também poderá verificar que, apesar de muitos acertos, a obra de André Luiz tem erros, e que o livro Brasil, Coração do Mundo foi ditado por um ou mais Espíritos com a clara intenção de causar dano à Doutrina.
Como é muito difícil que o neófito espírita tome esse caminho compenetrado de estudos, eu, hoje, me abstenho totalmente de indicar qualquer coisa fora da “codificação”, preferindo recomendar que NÃO sejam lidas, senão depois do processo mencionado.
A Doutrina tem sofrido muito pela falta de empenho e de cuidado daqueles que dizem professa-la, de forma que, hoje, algo que antes era uma ciência, fácil de ser compreendida por aquele de boa vontade, tornou-se uma joia recoberta de inúmeras camadas de carvão e rochas, representadas pelo misticismo e pelos erros de opiniões, que precisam ser removidas para uma mera aceitação de se dedicar a estudá-la.
Desculpe, mas é isso. Tínhamos uma joia dilapidada, mas, por falta de cuidado e empenho, escolhemos recobri-la novamente, a ponto de quase não se enxergar mais seu brilho.
A prezada colega replica:
– Entendo sua opinião, mas tenho estudado muito essas obras e o que vejo é que uma obra prova a veracidade de outras! Mas sei que tem uma legião de espíritos inferiores influenciando e tentando acabar com a religião! Quando digo, Kardec, falo no Pentateuco!
Ao que respondo:
– Cuidado, pois a concordância dos Espíritos não é o único fator para construir a Doutrina. Muitos Espíritos podem passar a partilhar de uma mesma ideia errada, quando estão ainda na faixa de apego à matéria. Além disso, temos o problema das ideias fixadas paulatinamente no meio espírita e nos médiuns, que passam a traduzir as ideias do Espírito conforme as suas próprias.
Também não estamos falando de religião, mas de ciência espírita. Por isso a necessidade de cuidado, que não parte de uma opinião minha, mas dos fatos exaustivamente demonstrados por Kardec.
Revista Espírita, prezada amiga: lá está a compreensão da formação da Doutrina, dos passos tomados por Kardec, de suas observações sobre a psicologia dos Espíritos… Inclusive, lá ele conta que recebia milhares de comunicações espirituais, das quais, analisadas frente ao Espiritismo, poucas dezenas ou centenas eram aproveitáveis.
Essa ciência é seríssima, pois detém a chave para o avanço moral da humanidade. Atualmente, essa chave está bem enferrujada, por descuido.
E eu te provo esse ponto, em Kardec. Hoje a noite estudaremos a evocação do Espírito de Humboldt, apresentada na RE de junho de 1859. Em certa altura, temos o seguinte:
39. ─ A Geologia achará um dia os traços materiais da existência do homem na Terra antes do período adâmico?
─ A Geologia, não; o bom-senso, sim.
Esse Espírito, que foi um explorador, um cientista, não tinha informações ainda de que existiam os fósseis humanos datados de milhões de anos. Isso porque o Espírito não ganha sabedoria e conhecimento não adquiridos previamente, simplesmente por desencarnar. Assim, se suas palavras fossem levadas como regra, estaríamos, hoje, negando a existência desses fósseis.
E esse Espírito era até que bem esclarecido, humilde e em paz consigo mesmo. Imagine se ele estivesse em estado de perturbação, apegado a certas imperfeições e atavismos. Imagine o tipo de ideia e de ilusão ele poderia dizer. Imagine, enfim, pelo meio de que palavras o faria.
Espiritismo não se constrói sem metodologia racional de investigação. Esse é o problema que sempre temos alertado, relembrando o que Kardec demonstrou na prática.
Kardec não imaginou, não supôs, não pressupôs, não buscou opiniões sobre a forma como agiam os Espíritos e os cuidados que seriam necessários na comunicação com eles. Não: ele aprendeu na prática, e deixou esse aprendizado registrado para todos que queiram aprender, na Revista Espírita, de 1858 a 1869.
Kardec nem sequer supunha a existência de Espíritos após a morte do corpo. Foi a investigação dos fatos, que ele relutou em fazer, que o levou a essa constatação. Como, então, sondar algo que não se pode ver nem ouvir diretamente? Através da metodologia. Foi através da investigação cuidadosa que Kardec verificou que a reencarnação, cuja ideia ele relutou em aceitar, era um princípio fundamental, e foi através da mesma investigação que ele constatou que o Espírito que deixa a matéria não ganha sabedoria e conhecimento que não possuía. Repito: constatou.
Constatou, da mesma forma, que os Espíritos podem mentir, podem falar do que acham que sabem, sem realmente saberem, podem falar de suas ilusões que os perturbam, podem falar do que realmente sabem, por mais limitado que seja, e podem falar, quando são realmente superiores, de uma sabedoria superior, o que se atesta pela concordância, pela lógica e pela razão.
O Movimento Espírita está ruindo e, nesse processo, causando grande entrave na propagação do Espiritismo, justamente por não observar esse ponto mais que fundamental da psicologia espírita! É todo um prédio construído sobre pilares apoiados na argila, que, enquanto racha e afunda, compromete o solo abaixo.
Cada um tem a liberdade, garantida por Deus, de acreditar e concluir conforme a razão lhe convenha, ou mesmo conforme os apegos que escolhe cultivar. Contudo, ao dar compartilhar informações erradas sobre algo tão sério, torna-se responsável pelo efeito de suas ações, sobretudo quando o não conhecer deve-se a uma resistência em estudar e se flagrar errado.
É passada a hora de mudar essa mentalidade estagnada, mesquinha e egoísta. Queremos fazer o bem? Então, se temos, ao nosso alcance, a oportunidade de conhecer, conheçamos, porque, se podemos nos desculpar, ante nossa própria consciência, por produzir o mal por impossibilidade de acesso ao conhecimento, já não podemos fazer o mesmo quando esse conhecimento é constantemente apresentado em nosso caminho e, muitas vezes por vaidade e orgulho, escolhemos não conhecer, para continuar falando com base em nossas próprias opiniões.
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